Título: A megaempresa do setor de alimentos
Autor: Pires, Luciano
Fonte: Correio Braziliense, 20/05/2009, Economia, p. 13

Perdigão e Sadia formam a Brasil Foods, maior exportadora de carne de frango do mundo

Depois de quase um ano de negociações, Perdigão e Sadia formalizaram ontem um acordo que prevê a fusão operacional e administrativa das duas companhias em uma terceira, a Brasil Foods (BRF). A nova empresa nasce como uma das maiores processadoras de alimentos do mundo, receita líquida de R$ 22 bilhões, 42 fábricas, quase 120 mil funcionários e presença em 110 países. A caçula entre as multinacionais genuinamente brasileiras prevê ganhos de escala e sinergia para avançar sobre três grandes mercados prioritários: Estados Unidos, China e Oriente Médio.

Pelo acordo, 68% da BRF ficarão nas mãos da Perdigão e os outros 32%, nas da Sadia. A gigante do ramo de alimentos deterá fatias importantes das vendas domésticas de congelados e resfriados de bovinos, suínos e aves, além de massas, pizzas, margarinas, lácteos, vegetais congelados, óleos e fast food. A união desafia as autoridades nacionais e internacionais de defesa da concorrência (leia na página14), embora os controladores afirmem que respeitarão todas as regras e que não haverá dificuldades em aprovar o projeto. O ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, avaliou ontem como positiva a fusão e disse que a operação era ¿necessária¿. ¿A união não chega a ser algo ruim, pois precisamos de companhias fortes¿, afirmou.

O modelo de governança indica que a supercompanhia terá duplo comando. As copresidências serão ocupadas por Nildemar Secches, presidente do Conselho de Administração da Perdigão, e por Luiz Fernando Furlan, presidente do Conselho de Administração da Sadia, com mandatos de dois anos. Pela tradição e valor comercial, as duas marcas continuarão a existir. O banco Concórdia, que pertence à Sadia e foi o grande entrave para a concretização do negócio ao longo dos últimos meses, foi excluído do processo. A instituição financeira continuará sendo controlada pelas famílias fundadoras da Sadia, que,depois de uma complexa troca de ações e distribuição de dividendos, deverão diluir a operação.

Da parceria entre as duas empresas de alimentos processados brotará um passivo financeiro astronômico. Por causa da crise econômica mundial, Sadia amargou perdas de R$ 2,5 bilhões em 2008, enquanto que a Perdigão registrou em seu balanço um pequeno lucro no ano passado. Neste primeiro trimestre de 2009, no entanto, a performance das duas empresas é negativa e os prejuízos alcançam a casa de R$ 200 milhões. Os resultados somados apontam para um endividamento global de R$ 10,4 bilhões, sendo R$ 6,8 bilhões só da Sadia (veja quadro na página 14).

Como forma de amenizar os efeitos colaterais da fusão, a BRF fará uma oferta pública de ações para captar até R$ 4 bilhões no mercado. De acordo com Secches e Furlan, isso deverá acontecer no fim de julho. Ainda conforme os dois representantes da Brasil Foods, o Banco de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) não contribuiu com nenhum tipo de financiamento para a fusão, mas nada impede que o banco oficial de fomento vá às compras durante a oferta pública, uma vez que já teria manifestado interesse em participar. Ontem, as ações da Perdigão e da Sadia registraram quedas acentuadas tão logo a fusão foi anunciada e fecharam o dia em baixa na Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa). O movimento é comum em situações desse tipo e indica claramente a realização de lucros dos investidores que aguardavam o desfecho do acordo.

Estratégias Em termos de preço e competitividade, as duas empresas ¿ mesmo unidas ¿ pretendem adotar estratégias diferenciadas. ¿Teremos o bom senso não só de conservar nossos consumidores como de expandir a qualidade e melhorar o preço¿, explicou Furlan. ¿Os consumidores não vão sentir nenhuma diferença. Todos os nossos produtos continuarão na gôndola¿, reforçou Secches. No plano internacional, Perdigão, Sadia e, no futuro, a BRF pretendem intensificar a presença em mercados inexplorados ou pouco acessíveis. Segundo Furlan, países do Oriente Médio, a China e os Estados Unidos encabeçam a lista. ¿São mercados prioritários¿, resumiu o executivo.

Na apresentação oficial da empresa, feita ontem em São Paulo, Furlan recebeu das mãos de Secches uma camisa do Corinthians estampada com a marca BRF. Conforme os copresidentes, a utilização da publicidade no uniforme do time paulista depende de avaliações dos departamentos de marketing da empresa e do clube, mas a ação é vista com simpatia pelo grande apelo popular e poder de penetração entre públicos de variadas classes sociais.

A BRF espera ainda ser reconhecida como uma grife da comida e pretende apresentar-se da forma mais didática possível. O primeiro passo para alcançar esse objetivo será dado hoje com uma maciça campanha explicativa na televisão. A atriz Marieta Severo ¿ a D. Nenê, da série A Grande Família, da TV Globo ¿ aparecerá em comerciais voltados à dona de casa e ao consumidor comum para garantir que a qualidade, o preço e a variedade dos produtos Perdigão e Sadia não sofrerão qualquer mudança por causa da fusão.