Título: Dez anos de namoro
Autor: Pires, Luciano
Fonte: Correio Braziliense, 20/05/2009, Economia, p. 14

Memória

O anúncio feito ontem por Perdigão e Sadia encerra uma novela iniciada em 1999. Há exatos 10 anos, os presidentes das duas empresas sentaram-se à mesa pela primeira vez para acertar detalhes de uma associação operacional que previa ganhos de escala, lucros de longo prazo e o nascimento da Brazilian Foods. A crise cambial que abalou a economia brasileira à época abortou os planos, adiando por tempo indeterminado o sonho de fusão.

Em 2002, graças a uma reaproximação incentivada pelo governo, as companhias voltaram a conversar sobre uma possível parceria. Naquele ano, o Cade chegou a aprovar a criação de uma trading que carregava as marcas Sadia e Perdigão. Essa companhia deveria atuar exclusivamente na exportação de produtos e ajudaria a consolidar as duas marcas em regiões específicas do mundo. O acordo parecia ideal para ambos os lados, mas detalhes sobre a atuação da nova empresa e a participação dos antigos gestores no negócio acabaram, outra vez, impedindo o acerto.

A terceira tentativa de fundir as duas companhias mais conhecidas de alimentos industrializados do país ocorreu em 2005. As negociações iniciadas naquele período tiveram como ponto de partida pré-acordos rascunhados no passado, que acabaram se materizaliando em uma oferta hostil oficializada pela Sadia para a aquisição da Perdigão em julho de 2006. O movimento, considerado arrojado por investidores de outros setores da economia, inaugurou uma nova fase do ¿namoro¿.

Capitalizada e com grande apetite para avançar no mercado internacional, a Sadia fez a proposta de compra do controle acionário da rival por R$ 3,7 bilhões e dava como certa a aceitação por parte da concorrente. Com anúncios em jornais e propaganda na televisão, o acordo era apresentado como um marco para o setor de alimentos no Brasil, uma oportunidade que ambas as empresas não poderiam deixar escapar. Porém, por considerar o valor baixo demais, a Perdigão rechaçou a proposta.

Com o estouro da bolha imobiliária nos Estados Unidos e o agravamento da crise econômica mundial, os ventos se inverteram. De potencial compradora, a Sadia passou a ¿pechincha da vez¿. Resultado de operações financeira desastrosas, a empresa perdeu R$ 760 milhões com aplicações no mercado financeiro envolvendo contratos futuros, opções de câmbio e derivativos de crédito. A especulação malsucedida abalou a empresa, abriu uma crise corporativa e contribuiu fortemente para o prejuízo recorde acumulado em 2008. Fragilizada, a Sadia virou alvo fácil para a Perdigão. (LP)