Título: Salvo-conduto na Vila Cruzeiro
Autor: Otavio, Chico; Coelho, Camilo
Fonte: O Globo, 28/07/2008, O País, p. 3

Crivella tem apoio de líderes comunitários na zona de guerra onde tráfico rendeu repórteres

Chico Otavio e Camilo Coelho*

Ao tomar a direção da Vila Cruzeiro, na caminhada que fazia pela Penha na manhã de sábado, o senador Marcelo Crivella, candidato do PRB a prefeito do Rio, sabia que não encontraria pela frente um território hostil. Ele conta com o apoio da maioria dos líderes comunitários locais. Na visita à favela, durante a qual traficantes renderam seis jornalistas e os obrigaram a apagar os seus arquivos fotográficos, Crivella foi acompanhado por um deles, o presidente da Associação de Moradores da Merendiba, Luiz Cláudio dos Santos, o Claudinho da Merendiba, candidato a vereador pelo Partido Social Democrata Cristão (PSDC) - um dos que integram a coligação do senador.

No fim da caminhada, informado sobre a agressão aos jornalistas, Crivella chamou o episódio de truculento, defendeu o direito de ir e vir e disse que continuaria entrando em lugares perigosos sem combinação prévia. Não era o caso da Vila Cruzeiro. Entre a maioria dos dirigentes das 11 associações de moradores do complexo que o apóiam, está a maior delas, a Associação de Moradores do Parque Proletário. Eles estão fechados com a dobradinha Crivella e Claudinho da Merendiba, líder de uma das comunidades locais mais atingidas pela violência produzida pelo conflito entre polícia e traficantes.

- Não presenciei nada. Quando fiquei sabendo o que tinha acontecido, fui até lá para falar com ele e tentar resolver. Queria ajudar de alguma forma - disse Claudinho, sobre o constrangimento imposto aos jornalistas.

Claudinho deu apoio a vítimas de balas perdidas

O candidato a vereador foi figura destacada durante os meses de conflito na favela. Ele dava apoio a vítimas de balas perdidas numa sala cedida pela direção do Hospital Getúlio Vargas. Claudinho também cobrou a reparação de transformadores de luz danificados por tiros e reclamou da ausência de profissionais da saúde no combate à dengue.

Durante a ocupação da favela por soldados do Batalhão de Operações Especiais (Bope), Claudinho foi um dos organizadores de um ato ecumênico com contornos de protesto. Na época, alegou que não era contra a operação da polícia, queria apenas que os moradores retomassem suas vidas.

Na caminhada de sábado, Claudinho tentou convencer Crivella a visitar a Merendiba, que fica na parte mais alta do morro, na subida da Igreja da Penha. O candidato garantiu que a visita à Vila Cruzeiro não fora combinada:

- O pessoal da coordenação do Crivella não comentou comigo que ele vinha aqui. Até liguei para o pessoal do partido para perguntar por que não tinha sido avisado. Seria muito bom para a campanha caminhar ao lado do senador. Não tive nem tempo de preparar a minha comunidade, fazer faixa, panfleto. O pessoal do meu grupo até reclamou.

Embora reconheça que a sua candidatura está sendo alavancada pelo apoio maciço das lideranças locais, Claudinho garante que o acesso à Vila Cruzeiro não está vetado a outros candidatos.

- A minha candidatura está muito boa. O pessoal está aderindo bem à idéia de ter um representante da comunidade como vereador. Dentro da comunidade, também há apoio a outros candidatos, como João Cabral, Jonas Santana e Jorginho da SOS.

Polícia vai investigar ameaças a repórteres

A Polícia Civil abrirá ainda hoje um procedimento para apurar a ameaça feita por traficantes de drogas a jornalistas na Vila Cruzeiro, na Penha. O trabalho de investigação ficará a cargo da 22ª DP(Penha), que vai tentar identificar os três jovens que foram fotografados e, posteriormente, ameaçaram os repórteres e fotógrafos.

- Será instaurado procedimento para descobrir quem são os jovens e o que aconteceu na Vila Cruzeiro durante a campanha do senador. Vamos solicitar as fotos tiradas pelos três profissionais para anexá-las ao inquérito. Eles podem até vir a responder por formação de quadrilha armada e porte ilegal de arma - explicou o delegado Sérgio Caldas, diretor do Departamento de Polícia da Capital.

Os jovens foram fotografados quando o senador caminhava pela Estrada José Rucas. Um deles, armado de fuzil, abordou os repórteres e ordenou que as fotos fossem apagadas. Ele só saiu quando os três fotógrafos mostraram que as fotos tinham sido apagadas. Depois, foram recuperadas com auxílio de um programa de computador.

(*) Do Extra