Título: No Rio, um ancoradouro de projetos que não acontecem
Autor: Duarte, Alessandra
Fonte: O Globo, 01/08/2008, O País, p. 9

Para urbanistas, cidade não planeja parcerias para área

Alessandra Duarte

Uma zona portuária descolada do planejamento do Centro do Rio é o principal problema enfrentado pela área hoje. E não é por falta de projeto que a mais que falada revitalização do porto não sai, segundo especialistas em urbanismo da cidade: projetos técnicos de melhoria existem há mais de cinco anos ¿ o que falta é o governo municipal do Rio levá-los em conta e realizar parcerias com a União, proprietária de boa parte dos terrenos e das construções do local.

O arquiteto e urbanista Sydnei Menezes, conselheiro do Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB) e da diretoria do Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia do Rio (Crea-RJ), afirma que o porto, atualmente, não faz parte do planejamento da cidade, além de não ter projetos com continuidade.

¿ A zona portuária está absolutamente degradada, largada, descolada do Rio. As intervenções lá não são continuadas. São feitas por heróis anônimos com suas iniciativas, uma festa aqui, outra ali, não pelo poder público.

Problema fundiário agrava falta de planejamento

À ausência de planejamento municipal, junta-se o problema fundiário da área.

¿ Aquilo é um somatório de terrenos e lotes da União, do estado, do município, de particulares, de igreja... É um grande emaranhado fundiário ¿ diz Menezes, acrescentando que ¿o que não falta é projeto para o porto¿. ¿ O Instituto Pereira Passos faz estudos sobre a região há mais de cinco anos, mostrando formas de revitalização com ações culturais, comunitárias e habitação social.

Segundo Menezes, a revitalização da zona portuária não pode ser feita apenas por meio de empreendimentos de lazer e cultura, como tem ocorrido:

¿ O porto tem a vantagem de ser uma área já estruturada, já tem prédio, água e luz. Só não tem gente. Não adianta fazer só projetos de lazer esparsos, sem que haja ocupação do espaço com habitação. Da mesma maneira que só um projeto de habitação não revitaliza uma área, é necessário o movimento nos fins de semana que o lazer traz ¿ completa o urbanista do IAB, destacando que uma política de habitação para a área resolveria outra questão, a falta de segurança. ¿ Do ponto de vista do urbanismo, segurança não se resolve com policiamento, e sim fazendo a população ocupar o espaço público.

Além de incluir propostas como essas no planejamento da cidade, outra função que a prefeitura deveria exercer em relação ao porto, de acordo com Menezes, é a de impulsionadora das parcerias com a União e com outros proprietários de terrenos lá. É por meio dessas parcerias que as propostas de revitalização poderiam se viabilizar:

¿ Alguém acha que a Docas está priorizando a revitalização do porto do Rio? Não está. Quem tem que estar preocupado com isso é o prefeito da cidade. O município é que tem que puxar as parcerias. Novamente, é uma decisão política o que falta.

A falta de diálogo entre prefeitura e governo federal é o grande nó do porto, na opinião de Sérgio Magalhães, professor de pós-graduação em urbanismo da Universidade Federal do Rio de Janeiro e secretário municipal de Habitação de 1993 a 2000.

¿ Tínhamos um projeto de uso da área para habitação social e comércio. Já tinha até financiamento da Caixa Econômica Federal, que se perdeu porque não houve acordo com a União para uso do espaço ¿ afirma Magalhães. ¿ O problema mais grave é o abandono de edifícios de propriedade da União no local e essa falta de conversa da prefeitura com ela. Só que, para essa conversa acontecer, o município precisa primeiro se planejar. Precisa resolver o que quer fazer.