Título: Com poucos homens ao mar
Autor: Paul, Gustavo
Fonte: O Globo, 04/08/2008, Economia, p. 17

APAGÃO MARÍTIMO

Estudo indica que em 2013 faltarão 1.400 oficiais para comandar embarcações

Gustavo Paul

Depois do apagão aéreo e da escassez de engenheiros, na carona da retomada da construção civil, o Brasil está à beira do apagão marítimo. Um estudo da Escola Politécnica da USP, encomendado pelo Sindicato Nacional dos Armadores (Syndarma), prevê um déficit crônico de Oficiais de Marinha Mercante (OMM) nos próximos anos. Com base na expectativa de lançamento ao mar de novos navios de bandeira brasileira, a pesquisa concluiu que, sem medidas emergenciais, em 2013 faltarão 1.400 oficiais para comandar as embarcações, particularmente as da Petrobras, que participarão da exploração do petróleo no pré-sal.

- A situação é séria, já existe escassez de mão-de-obra, mas pode se tornar ainda mais dramática, colocando em risco a operação dos navios brasileiros - alerta Roberto Galli, vice-presidente-executivo do Syndarma, que conversou semana passada com Paulo Bernardo, ministro do Planejamento, sobre o problema.

Para os pesquisadores, o número de embarcações de bandeira brasileira passará de 291 em 2007 para 428 em 2013. Este salto de 137 embarcações de transporte e apoio marítimo fará com que a demanda de oficiais passe dos atuais 2.724 para 4.465 em cinco anos. Pelas condições atuais, só estarão disponíveis no mercado 3.046 oficiais - um déficit de 1.419 marítimos graduados no país.

Os Oficiais de Marinha Mercante são os responsáveis pelo comando e funcionamento dos navios. Em geral, cada barco tem de sete a oito desses profissionais, desde os mais graduados - comandante, oficial de máquinas e oficial de convés - até os de menor graduação, como segundo-oficiais e oficiais de quarto, que fazem atividades administrativas do barco.

Setor poderá contratar profissionais estrangeiros

O estudo identificou uma evasão impressionante desses profissionais, que se transferem da atividade-fim (trabalho dentro dos navios) para expediente em terra. A evasão média chega a 66%, mas chegou a 75% em 2007. Dos 156 formados das duas escolas de preparação de oficiais de 1991, 43 estão na ativa. Em 2001, formaram-se 152 oficiais, mas só 56 estão a bordo e dos 391 de 2006, 85 estão embarcados.

Segundo Rui Botter, um dos responsáveis pela pesquisa, as causas da evasão devem ser mais bem estudadas, mas sugere algumas. O mercado de marinha mercante está aquecido e atrai esses profissionais para funções mais bem remuneradas por companhias de navegação em terra.

Os salários médios de R$8 mil a R$9 mil para oficiais graduados e de até R$5 mil para os menos graduados não são suficientes para manter uma parcela expressiva em jornadas estressantes, que podem ser de nove meses em viagens para três meses em casa. Um piloto de avião comercial ganha de R$10 mil a R$14 mil em rotas nacionais. As internacionais pagam mais.

- Essa evasão significa que o oficial opta por trabalhar em áreas correlatas, como terminais de contêineres e escritórios das companhias - diz Botter.

Segundo Galli, atualmente o déficit está em 6%: faltam 156 oficiais para suprir a demanda nacional. A escassez tem sido contornada com pagamento dobrado, horas extras e até corte de folgas. Com o tempo, isso não será mais viável.

Alarmado, o Syndarma sugere incentivos à criação de cursos, além dos dois existentes - em Belém e Rio. Outra sugestão é a possibilidade de contratação de estrangeiros. Para Guilherme Lobo, também autor do levantamento, é possível atrair oficiais de Índia, Ucrânia, Tailândia e China. Pelo estudo, serão precisos 180 marítimos estrangeiros em 2009 e 230 em 2011:

- Seria uma contratação temporária, para atender à demanda nos próximos três anos, até que o Brasil consiga formar mais oficiais.