Título: Bird critica seu próprio informe
Autor: Passos, José Meirelles
Fonte: O Globo, 04/08/2008, Economia, p. 24

MEA-CULPA

Investigação interna aponta falhas no estudo anual "Doing Business"

José Meirelles Passos

WASHINGTON. O que Butão, Uganda, Zâmbia, Iêmen, Nepal, Etiópia, Palau, Vanuatu, Mongólia, Namíbia e o obscuro Kiribati têm em comum, além de serem países pobres e praticamente alijados do processo de globalização? Todos são tidos, pelo Banco Mundial, como lugares melhores do que o Brasil para se fazer negócios.

Na classificação mais recente de 178 países a Namíbia, por exemplo, aparece em 53º lugar, o Kiribati no 73º e o Brasil no 122º - ficando, na América Latina, à frente apenas da Bolívia, do Suriname e da Venezuela.

- Trata-se de uma clara anomalia, não? - perguntou, já sugerindo a resposta, Victoria Elliott, que à frente do Grupo de Avaliação Independente (IEG, na sigla em inglês), do próprio Bird, finalmente descobriu que havia algo - ou muito - de errado no informe que o banco vem publicando anualmente desde 2004, sob o título "Doing Business" (Fazendo Negócios).

A investigação interna, que acaba de ser concluída e deve motivar alterações no estudo do Bird, foi motivada por perguntas óbvias. Uma delas: por que, estando tão baixo na tabela, o Brasil continua recebendo mais investimentos estrangeiros diretos do que todos os demais países da América Latina? Não foi difícil descobrir os motivos, segundo Victoria:

- Eles devem dar mais importância à realidade...

"O Bird pode estar enviando, de forma inadvertida, sinais de que valoriza mais o peso de um índice menor de regulações do que outras metas de desenvolvimento", diz um trecho do relatório. Outro detalhe significativo: "O banco não tem uma forma comparativa de celebrar as melhorias em importantes resultados do desenvolvimento".

O grupo investigativo do Bird descobriu várias mazelas da avaliação feita por ele e que, em princípio, serviria como um guia - ou tabela de precauções - para os investidores estrangeiros. Talvez a principal delas seja a forma como são colhidos os dados para os dez indicadores, a espinha dorsal do informe.

- Não se trata de uma pesquisa ampla, abrangente. O Bird depende de informantes que se dispõem a preencher os formulários. A maioria deles é de advogados, e quase todos trabalham para multinacionais. No caso específico do Brasil são apenas dois. E ambos em São Paulo. Quer dizer: é impossível ter um perfil correto do país quando se medem índices apenas através de São Paulo - constatou Victoria.

Tais informantes são voluntários. Não recebem pagamento por isso. O que os leva a participar?

- Prestígio - respondeu Victória, explicando que o nome deles aparece nas últimas páginas do informe oficial do Bird, e isso aparentemente dá mais peso ao currículo deles.