Título: Rebelião de estados põe em risco piso de professor
Autor: Weber, Demétrio
Fonte: O Globo, 05/08/2008, O País, p. 3

Governadores ameaçam ir ao STF contra lei que aumenta o gasto com educação

Demétrio Weber

Antes mesmo de entrar em vigor, o novo piso salarial nacional dos professores do ensino básico, de R$950 mensais, está ameaçado. Sob pressão de governadores de estado e prefeitos, o Ministério da Educação vai pedir à Casa Civil e à Advocacia-Geral da União que analisem a constitucionalidade da lei, sancionada pelo presidente Lula no último dia 16 de julho. Em ano eleitoral, governadores e prefeitos ainda não decidiram o que fazer. Uma das possibilidades é entrar com uma ação direta de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal. Outra seria votar um novo projeto de lei no Congresso.

A ofensiva contra o piso teve início na sexta-feira. Reunido em Porto Alegre, o Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed) divulgou estimativa preliminar de que a nova lei representará um gasto adicional de mais de R$10 bilhões ao ano nas redes estaduais, a partir de 2010. O estudo indica a necessidade de contratar mais cerca de 50 mil docentes.

A reação de estados e municípios irritou o governo. A sanção da lei do piso foi celebrada com euforia no Palácio do Planalto. O piso era uma reivindicação antiga do magistério. Em 1994, a categoria costurou um acordo com o então governo Itamar Franco, mas a promessa não saiu do papel. Os valores da época serviram de base para a aprovação da lei este ano.

O ministro Fernando Haddad lamentou que as críticas tenham surgido agora e não durante a votação do projeto na Câmara e no Senado. "Infelizmente, governadores e prefeitos estão trazendo agora contas e argumentos que não foram trazidos ao longo dos 14 meses de tramitação", disse ele, em nota.

A principal queixa do Consed é contra a exigência de que 33% da jornada de trabalho dos professores sejam reservadas a atividades extraclasse, como a preparação de aulas e a correção de provas. Hoje esse percentual oscila entre 20% e 25%. As contratações serviriam justamente para garantir a ampliação da jornada extraclasse. O Consed estima que a cada quatro professores seria preciso contratar um novo. A estimativa do Consed é parcial, pois considerou dados de apenas 14 estados. O levantamento completo será concluído em breve. Os secretários pretendem apresentar os dados a Haddad na semana que vem.

A secretária de Educação do Estado de São Paulo, Maria Helena Guimarães de Castro, disse ontem que a rede paulista teria que contratar 70 mil professores para fazer frente à nova exigência legal. O impacto na folha de pagamento atingiria R$1,4 bilhão ao ano. Maria Helena afirmou que é favorável ao piso, mas lembrou que o governo paulista já destina 30% de sua receita ao ensino público. Segundo ela, a ampliação da jornada extraclasse foi incluída por emenda de parlamentares no Congresso e não estava prevista no projeto original do governo:

- As emendas acabaram criando coisas que significam uma ingerência indevida na autonomia dos estados e municípios. Não cabe a uma lei federal estabelecer as regras de carreira dos estados e municípios.

Pagamento do piso começará em 2010

O piso deverá ser pago gradativamente a partir de janeiro de 2009. O valor completo, no entanto, só a partir de 2010. O Consed entende que aí há outro problema: a lei determina que, já em 2010, estados e municípios paguem o piso sem incluir no cálculo benefícios e gratificações. Para o Consed, é inconstitucional que uma lei federal interferira na composição da remuneração do magistério.

O presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Educação (CNTE), Roberto Franklin de Leão, criticou o Consed:

- O Consed está indo contra a educação pública de qualidade, que começa por ter um professor valorizado. A posição do Consed é arrogante e desqualifica o debate feito no Congresso por mais de um ano. O problema é que vão ter que gastar mais com educação e não querem isso.

Segundo o presidente da CNTE, o debate sobre a constitucionalidade da lei foi feito na Comissão de Constituição de Justiça da Câmara:

- A AGU deu parecer pela constitucionalidade - afirmou Leão.

O piso de R$950 vale para professores com diploma de nível médio que trabalhem 40 horas semanais. Profissionais que cumprirem jornadas menores devem receber valor proporcionalmente menor. Da mesma forma, docentes com diploma de nível superior terão direito a salários maiores, conforme o plano de carreira de cada estado e município.