Título: Caos na Receita
Autor: Batista, Henrique Gomes ; Almeida, Cassia
Fonte: O Globo, 08/08/2008, Economia, p. 25

Nova secretária diz que atendimento a contribuinte está caótico com saída em massa de servidores

Henrique Gomes Batista e Cassia Almeida

A nova secretária da Receita Federal, Lina Vieira, considera caótico o atendimento do Fisco ao consumidor. A avaliação foi feita ontem durante evento interno do órgão, ao qual jornalistas assistiam sem que ela soubesse. Lina atribuiu as dificuldades à fusão das estruturas de arrecadação tributária e previdenciária na Super-Receita, ocorrida no ano passado. Parte do problema é decorrente da debandada de servidores, que estão optando por voltar à Previdência em vez de ficar no Fisco, onde ganham menos e fazem trabalhos mais burocráticos.

- Estamos correndo atrás do prejuízo em relação ao caos que estamos vivendo na ponta (final do atendimento ao contribuinte) - afirmou a secretária, que assumiu o cargo na semana passada.

Ela afirmou ainda que está elaborando uma minuta de proposta de criação de carreira para a solução deste problema. Segundo a Associação Nacional dos Servidores da Receita Previdenciária (Unaslaf), dos 5.032 servidores que haviam migrado automaticamente para a Super-Receita, 2.584 já escolheram voltar à Previdência.

Além de não se enquadrarem nas carreiras de auditor ou de analista fiscal - ganhando menos do que os demais funcionários da Receita -, eles afirmam que se tornaram meros "batedores de carimbo", enquanto antes atuavam de forma efetiva na arrecadação previdenciária.

- Temos passado por muitas dificuldades, principalmente no atendimento. Sabemos de algumas alterações e vivências constrangedoras para quem trabalha atendendo ao cidadão, causadas pela fusão da Receita - disse Lina, em alusão às discrepâncias na nova estrutura.

Ela, contudo, prometeu uma solução para os problemas:

- Estamos lutando para que saia logo a tal carreira fazendária para que eles (originários da Receita Previdenciária) possam enxergar alguma luz nessa organização que os acolheu.

Para Valdete Rolim, vice-presidente da Unaslaf, a solução poderá ser rápida se a carreira fazendária for criada:

- Tenho certeza de que os 5.032 vão querer se incorporar à Receita se forem reconhecidos e ganharem o equivalente às outras carreiras - disse, lembrando que o salário médio de sua categoria é de R$3,5 mil mensais, enquanto os analistas recebem por mês cerca de R$6 mil.

Para entidade, concurso é solução

Estes funcionários têm até junho de 2009 para optar em qual cargo ficarão. Os que já decidiram retornar à Previdência poderão desistir desta opção até o fim do prazo e voltar ao Fisco.

Para o presidente do SindiReceita, sindicato dos analistas, Paulo Antenor de Oliveira, a solução só virá quando o Fisco abrir concurso público para suprir a falta de pessoal:

- Reconheço a coragem da nova secretária em assumir o problema, mas agora é preciso buscar soluções.

Segundo fontes da Receita, a secretária ficou aborrecida com a participação de jornalistas no evento, fechado para 40 pessoas. Ela recomendou cuidado redobrado para evitar que opiniões e projetos sejam revelados antes do tempo desejado pelo órgão.

O caos reconhecido pela secretária está infernizando a vida de Claudio Siqueira Lima desde fevereiro. Ele comprou pela internet uma placa para computador, mas não chegou a receber a peça, que veio dos Estados Unidos. Segundo os Correios, a Receita mandou devolver ao remetente.

- Minha primeira providência foi procurar uma agência da Receita. Cheguei a ficar feliz quando vi que não tinha fila. Mas logo descobri o motivo: os atendentes nem esperaram que eu contasse meu problema, mandaram logo reclamar pelo site. Foi o que fiz. E, na resposta ao e-mail, a Receita mandava procurar uma agência.

Segundo Lima, ele passou a mandar os e-mails mais explicativos, pelo menos 30. E agora eles dizem que o problema foi com os Correios que voltam a jogar a culpa na Receita.

- Já dei por perdido meus US$70 da placa do computador.

A situação de Lima - à espera da resposta da Receita - multiplica-se na seção "Defesa do Consumidor" do GLOBO. Este ano, das 19 cartas, apenas uma mereceu a atenção do órgão público. Duas estão no prazo para ter seu problema respondido e os 16 leitores restantes ficaram a ver navios até agora. No ano passado, a mesma atitude com as demandas dos contribuintes. Foram 39 reclamações, sendo que 23 não receberam satisfação.

http://oglobo.com.br/blogs/fisco/