Título: Morales é impedido de entrar em 4 províncias
Autor: Aggege, Soraya
Fonte: O Globo, 08/08/2008, O Mundo, p. 34

Presidente da Bolívia diz que opositores do referendo de domingo estão armando um golpe civil contra seu governo

Soraya Aggege

LA PAZ. Impedido de entrar em quatro departamentos do país, que representam a maior parte do território nacional, o presidente Evo Morales encerrou ontem sua campanha para ser aprovado no referendo nacional de domingo cercado de militares e acusando a oposição de armar um "golpe civil" no país. Ontem, mais aeroportos foram ocupados para barrar a chegada de ministros. Funcionários do governo de Pando, ajudados por professores em greve, colocaram máquinas pesadas na pista do Aeroporto Capitán Aníbal Arab, na cidade de Codija. Em Riberalta, os oposicionistas cercaram a pista armados de paus e facas.

Anteontem, o presidente já havia sido impedido de descer em aeroportos nos departamentos de Santa Cruz e Beni. O governo de Tarija decretou uma "greve oficial" de 24 horas e cinco governadores continuam em greve de fome.

Maioria dos governadores está em greve de fome

Morales encerrou sua campanha em dois de seus antigos redutos: El Alto e Cochabamba, onde o governo também é de oposição. O presidente participou de uma grande marcha militar, que pela primeira vez teve a participação de milhares de indígenas, apoiadores do presidente. Em seu discurso, pediu que a população impeça possíveis boicotes ao referendo. A maioria dos governadores não está em campanha para se manter nos cargos, e continua em greve de fome. Morales foi direto.

- Existem pessoas a quem falta o respeito à democracia. Aplicam uma espécie de ditadura civil, atentando contra a democracia - disse. - As ditaduras dos anos 60 e 70 estão sendo substituídas por alguns grupos que tomam aeroportos, cortes eleitorais departamentais e que atiram em carros de ministros - disse.

Morales disse ainda que pretende atender a todas as reivindicações sociais do país, mas que no momento sua preocupação maior tem sido a de manter a unidade nacional. Segundo afirmou, as reivindicações e os possíveis acordos com grevistas, como os mineiros e os professores que estão parados, serão feitos apenas depois do referendo. Um dos grupos que faziam protestos, o de deficientes físicos, que chegou a enfrentar a polícia, recuou ontem. Os organizadores anunciaram que se manterão mobilizados mas só irão às ruas após o referendo.

Os apoiadores de Morales continuam avaliando que depois da votação a crise política será minimizada, ao contrário do que dizem os opositores. O clima é de tensão em todo o país, que celebrou os 183 anos de sua independência com a parada militar e indígena em Cochabamba. Nestes menos de dois séculos de república, a Bolívia teve nada menos que 190 golpes de Estado. Somente nos últimos cinco anos teve seis presidentes, incluindo Morales. Nesta semana anterior ao referendo, dois manifestantes mineiros (antigos apoiadores de Morales) morreram durante confrontos com a polícia e dezenas ficaram feridos.

O ministro da Presidência, Juan Quintana, afirmou ontem que o país está à beira de um golpe civil contra a ordem constitucional. Morales, segundo as últimas pesquisas, tem quase 60% da aprovação popular. No entanto, nos departamentos (províncias) rebelados, onde está a minoria da população e a maior parte das riquezas, como o gás e o petróleo, as lideranças políticas querem autonomia para gerir os recursos e barrar a nacionalização da economia promovida pelo presidente.

A Central dos Trabalhadores Bolivianos (COB) convocou novas mobilizações para a próxima segunda-feira, depois do referendo nacional. Os protestos poderão se espalhar entre várias categorias de trabalhadores pelo país. Algumas categorias decidiram ontem que farão campanha contra Evo Morales no referendo de domingo.

Diante da tensão crescente, a Igreja Católica também fez um apelo para que os políticos respeitem os resultados do referendo e não incentivem a violência no país.

Ontem começaram a chegar à Bolívia observadores de vários países. Os senadores brasileiros João Pedro (PT-AM), José Nery (PSol-PA) e Inácio Arruda (PCdoB-CE) vão participar como observadores no referendo boliviano.