Título: Quando a política desafia o coração
Autor: Damé, Luiza
Fonte: O Globo, 10/08/2008, O País, p. 4

Relações familiares e amorosas se cruzam na eleição em Porto Alegre

Luiza Damé

BRASÍLIA. A eleição municipal de Porto Alegre está dividindo corações. Dois expoentes do PT - o ministro da Justiça, Tarso Genro, e o secretário-geral do partido, José Eduardo Cardozo - por razões partidárias estão politicamente impedidos de participar da campanha das candidatas Luciana Genro (PSOL), filha do primeiro, e Manuela D"Ávila (PCdoB), namorada do segundo. Luciana e Manuela disputam a prefeitura da capital gaúcha com outra mulher, a petista Maria do Rosário.

Conhecida pela fama de brigona e pelas ácidas críticas ao governo Lula, Luciana se transforma e abre um sorriso quando fala do pai, de quem diz ter "muito orgulho". Conta que a atuação política de Tarso a inspirou a entrar no movimento estudantil, na década de 80, no Colégio Estadual Júlio de Castilho, em Porto Alegre. Embora constantemente os dois estejam em campos opostos, fotos do ministro ilustram o site oficial de sua campanha.

Na biografia de Luciana, a primeira foto é dela, ainda bebê, brincando com o pai numa praia, durante o exílio de Tarso no Uruguai. A mais recente imagem dos dois juntos é da sexta-feira retrasada, quando participaram do ato de apoio à Lei Seca, na Fundação Thiago Gonzaga (adolescente morto em Porto Alegre num acidente de trânsito). Ao saudar os presentes, Tarso não citou a filha, mas, no meio do discurso, parou e explicou:

- Não falei da minha filha e agora ela está me olhando de cara feia. É que fiquei com medo de fazer propaganda eleitoral irregular.

Naquela noite, o ministro participou do lançamento oficial da campanha de Maria do Rosário. E foi fotografado com ela de mãos unidas e braços levantados. A foto está no site de Rosário.

- Sou um homem de partido. Luciana é uma mulher de partido. E nossa relação familiar não é prejudicada pela nossa militância política - diz o ministro.

Tarso não foi ao jantar de apoio à candidatura de Luciana, promovido por parentes e amigos, há 15 dias, mas pediu que o neto Fernando Genro, filho de Luciana, o representasse. Estavam presentes a mãe de Luciana, Sandra Krebs Genro; o marido dela, Sérgio Bueno; e sua irmã, Vanessa. Luciana encara com naturalidade a situação, mas entrega:

- No escurinho da urna, ele vai votar em mim.

O casal Zé Eduardo e Manuela tem mais facilidade para driblar a situação. Não há previsão de ele participar da campanha em Porto Alegre, seja no palanque da petista ou no de Manuela. No início do namoro, há cinco meses, Cardozo adotou uma resposta padrão para perguntas sobre as eleições na capital gaúcha:

- Não comento sobre a situação de Porto Alegre. Minha vida pessoal é minha vida pessoal. Minha vida política é minha vida política.

Segundo pesquisas eleitorais, Manuela disputa com Rosário o segundo lugar, atrás do prefeito José Fogaça (PMDB), candidato à reeleição. Para Manuela, o namoro não causa constrangimento:

- Ele nunca fez política em Porto Alegre. Por que teria de fazer agora? É um deputado eleito por São Paulo.

Para Luciana, o fato de ser filha de um político influente tanto dá como tira votos. Conta que eleitores dizem que votam nela porque "para defender suas idéias, ela tem a coragem de brigar com o pai". Outros vêem nisso um problema: "ela briga até com o pai". Mas admite que, em Porto Alegre, onde Tarso foi prefeito duas vezes, os laços familiares ajudam:

- Meu pai tem muito prestígio em Porto Alegre. É evidente que, se tivesse sido um prefeito impopular, me prejudicaria.