Título: Mais novo município do país vao às urnas
Autor: Franco, Bernardo Mello
Fonte: O Globo, 11/08/2008, O País, p. 3

Nazária, cidade do Piauí, vai escolher pela primeira vez este ano o prefeito e nove vereadores

ruas¿, diz a aposentada, que sustenta as famílias dos filhos

Efrém Ribeiro

NAZÁRIA (PI). Com 13.700 habitantes e 8.671 eleitores, o município mais novo do país vai escolher pela primeira vez este ano o prefeito e nove vereadores. Quando os votos estiverem contados, com prefeito e vereadores eleitos, Nazária estará emancipada de Teresina, a capital, que fica a 18 quilômetros, distância que parece muito maior por causa dos buracos na estrada.

Nazária já nasce como município-sanduíche: em 1991, algumas comunidades votaram contra a emancipação e ainda hoje continuam sendo território de Teresina. Com isso, depois da área de Nazária existe um outro pedaço de Teresina. Em 2004, o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) decidiu pela emancipação.

Se a descontinuidade territorial dá um nó na cabeça dos forasteiros, os moradores de Nazária têm outras preocupações, como a falta de empregos, a migração dos jovens em busca de trabalho na Amazônia e a falta de água, de esgotos e da qualidade da energia elétrica.

A aposentada Maria de Jesus Alves da Silva, de 76 anos, conta que ganha R$415 mensais da Previdência Social, mas o dinheiro é suficiente apenas para a comida. Falta dinheiro para os remédios. Com a aposentadoria do marido ela sustenta as famílias de três filhos, que moram em casas de taipa vizinhas à sua.

¿ Tenho oito bisnetos e muitos netos. Temos que cuidar deles, porque o pai deixou a mulher e foi para Rondônia ¿ diz ela.

Maria de Jesus conta que este ano vai votar no candidato que lhe ofereça o pagamento dos remédios de que precisa:

¿ Os políticos sempre prometem e não dão nada para a gente. Também não oferecem serviços e não asfaltam as ruas.

Nas ruas amarelas de chão batido de Nazária aparecem placas da prefeitura de Teresina, informando sobre recursos públicos para a construção de banheiros, fossas, casas e eletrificação rural. Mas as placas acabam servindo para escorar as cercas das casas. Uma delas, anunciando convênio para eletrificação rural, escora a casa de palha do agricultor José Sampaio de Oliveira, de 63 anos. Ele planta milho e feijão no período de chuvas e durante mais da metade do ano sobrevive com diárias de R$15, de limpeza de chácaras.

¿ Planto todos os anos, mas os grãos são suficientes apenas para mim e minha filha. No meio do ano os alimentos acabam ¿ conta José Sampaio, que sonha em se aposentar em dois anos.

A irregularidade das chuvas está fazendo os moradores abandonarem a agricultura, uma das principais atividades do município.

¿ A agricultura não rende mais, nem dá para comer o ano todo ¿ diz o agricultor aposentado João Joveniano Feitosa, de 71 anos.

Francinaldo Ferreira Alves, de 18 anos, ganha de R$50 a R$100 por mês com a limpeza de chácaras mantidas em Nazária por moradores de Teresina. Francinaldo estudou até a 4ª série do ensino fundamental. Quando sorri, é possível perceber que seus grandes dentes são cariados.

¿ Se conseguíssemos emprego seria bom demais, mas aqui não tem ruas, as casas são ruins e só se consegue bico ¿ diz.

Se a população é cética em relação à melhoria de vida com a primeira eleição, os políticos estão animados. Carros e motocicletas atravessam caminhos estreitos na mata para fazer propaganda eleitoral. São 99 candidatos concorrendo a nove vagas na Câmara dos Vereadores que, como a prefeitura, ainda não foi construída.

O novo município tem quadra de esportes, posto de saúde e três escolas, uma de ensino médio e duas de ensino fundamental. Quem cursa o ensino médio normalmente vai todos os dias para Teresina. Tem uma Igreja Católica, uma Batista e uma da Assembléia de Deus.

¿ Nazária não tem mercado, ambulância, hospital, trabalho e o povo é carente em saúde, educação e em diversas outras áreas. Espera uma vida digna ¿ diz o padre Carlos Alberto Holanda, um cearense que divide a paróquia com dois padres irlandeses.

Além da agricultura, há postos de trabalho em cinco cerâmicas, que empregam 600 homens.

¿ Trabalho aqui, só para homens. As mulheres não conseguem nada ¿ conta Joselina Calixta da Silva, que abandonou os estudos na quinta série, quando descobriu aos 14 anos que estava grávida.

Ela tem três filhos que sustenta com R$122 mensais do Bolsa Família. Desse dinheiro, usa R$21 por mês para pagar a mensalidade da casa construída pelo governo do estado.

¿ Não temos muitas esperanças nas eleições. Não sobra nada para a gente, só para os políticos, que desconhecem a gente quando ganham.