Título: Soja é a cultura que mais sofrerá com aquecimento global, diz Embrapa
Autor:
Fonte: O Globo, 11/08/2008, Economia, p. 17

Perdas devem chegar a R$7,4 bi em 2020 e alcançar R$14 bi em 2070

Ana Lucia Azevedo

Dos problemas trazidos pelo aquecimento global, o mal-estar causado pelo calor excessivo será o menor para o Brasil. À medida que o termômetro subir, baixará a produção agrícola. Das nove principais culturas, só duas escaparão sem danos das mudanças climáticas. O maior estudo já realizado no país sobre o impacto do aquecimento global sobre a agricultura prevê perdas severas, a partir de 2020. Os cientistas estão certos de que a produção de alimentos será afetada. As perdas estimadas começam com R$7,4 bilhões em 2020 e podem chegar a R$14 bilhões, em 2070.

- A soja será a cultura que mais sofrerá e, com ela, o nosso PIB - diz Eduardo Delgado Assad, da Embrapa Informática Agropecuária, e um dos coordenadores do estudo "Aquecimento Global e Cenários Futuros da Agricultura Brasileira", que será apresentado hoje, no VII Congresso Brasileiro de Agribusiness, realizado pela Associação Brasileira de Agribusiness (ABAG), em São Paulo.

Cientistas da Embrapa e do Centro de Pesquisas Meteorológicas e Climáticas Aplicadas à Agricultura (Cepagri) da Unicamp analisaram os efeitos das mudanças climáticas sobre algodão, arroz, café, cana-de-açúcar, feijão, girassol, mandioca, milho e soja, além de pastagens e gado de corte. As culturas escolhidas representam 86,17% da área cultivada no Brasil.

- A agricultura perde muito com o aquecimento global. As três culturas mais sensíveis são soja, café e milho, nessa ordem. O milho nem tanto pela vulnerabilidade ao aumento da temperatura e pela redução de água, mas sim pelo tamanho da área plantada - explica Assad, que coordenou o estudo com Hilton Silveira Pinto, do Cepagri/Unicamp.

Os pesquisadores trabalharam com cenários de elevação de temperatura traçados pelo último relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC, na sigla em inglês), apresentado em 2007. Na previsão mais otimista, o aumento da temperatura média global seria de 1,4 grau Celsius. Na mais pessimista, de 5,4 graus. Com modelos computacionais, eles elaboraram cenários para 2020, 2050 e 2070. Os modelos usados oferecem uma resolução de 40 quilômetros, o que equivale a dizer que estimaram os efeitos nos principais municípios produtores do país.

- A elevação de temperatura não será linear. Ela subirá mais no Norte e no Nordeste. Também será maior no interior do que no litoral. Hoje, poucos cientistas duvidam de aumento inferior a 2 graus Celsius e isso já é muito. E é o limite para tentarmos fazer alguma coisa - diz Assad.

Temperatura maior favorecerá a mandioca

A análise mostra que o aquecimento será péssimo para a produção de alimentos. Mas excelente para a de etanol, a partir da cana-de-açúcar.

- O impacto será muito maior sobre os alimentos. Já o álcool combustível sai ganhando. No fim das contas, perde o Brasil - frisa Assad.

Além da cana, a mandioca será beneficiada pelas mudanças climáticas e sua área de plantio poderá ser ampliada. O problema é que ela será afetada na região onde é mais necessária, o Nordeste.

A soja é a cultura mais sensível por ter pouca resistência à falta de água, diz Assad:

- Vai acontecer no restante do Brasil o que hoje já acontece no Rio Grande do Sul. A soja não resiste aos veranicos (períodos de calor extremo). Se nada for feito, a área de plantio encolherá, em 2020, entre 21,62% e 23,59%. Em 2070, a redução poderá chegar a 40%.