Título: Competência em xeque
Autor: Tavares, Mônica; Weber, Demétrio
Fonte: O Globo, 14/08/2008, Economia, p. 21

PSDB consegue barrar indicação do governo à Anatel. Tucano cita escolhas políticas.

O Palácio do Planalto sofreu duro revés ontem ao ver questionada, na Comissão de Infra-estrutura do Senado, a indicação da administradora e assessora legislativa Emília Ribeiro para a vaga aberta desde novembro de 2007 na Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). Desmobilizado - parlamentares importantes da base aliada não foram à sessão -, o governo assistiu ao relator da nomeação, Sergio Guerra (PSDB-PE), afirmar que sua avaliação preliminar é que Emília não tem competência técnica para ser diretora do órgão regulador. O tucano acusou o Executivo de agir com descaso, fazer escolhas políticas e desmerecer a opinião do Congresso.

- Em que pesem as boas referências que temos a respeito da indicada, temos de considerar, entretanto, que o currículo ora apresentado não se mostra convincente para atestar, de forma inquestionável, sua capacitação para o cargo - afirmou Guerra, ao lado de Emília.

No entanto, o senador salientou que não iria prejulgar Emília, abrindo mão de recomendar ou não sua aprovação aos colegas. Ele deixou a tarefa para a comissão, que vai sabatiná-la. Para dar tempo de ser costurada uma estratégia, o senador Demóstenes Torres (DEM-GO) - que, apesar de ser da oposição, apóia a indicação oficial - pediu vista, fazendo com que a sabatina, que seria ontem, fosse adiada.

Relator atribuiu pressa à supertele

O PT tinha a convicção de que o nome seria aprovado sem problemas. A expectativa é que o senador Marconi Perillo (PSDB-GO) coloque o tema na pauta da comissão na reunião do próximo dia 20.

Guerra explicou que demorou a apresentar o parecer porque gostaria de "ver, ouvir e não prejulgar" a indicada e que acha ser obrigação do Senado deixar clara sua postura em relação ao governo - e não apenas "aprovar todas as indicações que o governo faz para as agências reguladoras". Ele afirmou ainda que as nomeações deixaram de ter caráter técnico para serem políticas. Exemplo disso foi o que chamou de "desastre" da primeira diretoria da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac), formada totalmente pelo governo Lula.

O relator atribuiu a pressa do governo em aprovar o nome de Emília ao apoio à formação da supertele, a compra da Brasil Telecom (BrT) pela Oi:

- A pressa que cerca o exame da matéria tem, por certo, origem na necessidade de compor o conselho diretor da Anatel para uma proposta de suas mais importantes decisões em toda sua história. Trata-se da proposta atualmente em estudo naquela autarquia, que altera o Plano Geral de Outorgas aprovado pelo decreto de abril de 1998. O motivo da alteração é de todos conhecido e está associado à fusão das operadoras Telemar/Oi e Brasil Telecom.

Emília teve sua indicação patrocinada pelos senadores José Sarney (PMDB-AP) e Renan Calheiros (PMDB-AL), que criticou Guerra:

- É importante que tenhamos uma sabatina qualificada, só não quero que reproduzamos a indicação de Victor Martins para a Agência Nacional do Petróleo (ANP), que demorou dois anos, porque foi partidarizada.

- Não quero proteger ninguém nem punir ninguém. As agências reguladoras não são do PT, não são do PMDB, são do Estado brasileiro - rebateu o tucano.

Emília não se abalou:

- Eu não vi críticas, só vi elogios do início ao fim e uma vontade do Senado em acertar nas escolhas. O relatório do senador é consistente, maduro. Ele colocou como ele pensa e está correto. O meu papel é demonstrar a ele que eu tenho condições (de assumir a vaga).

Apesar da tranqüilidade, Emília terá trabalho para provar que está apta a assumir as credenciais da diretoria, na qual receberia um salário de R$10.211,01 mensais. Ela já passou por assessorias técnicas da Câmara e do Senado e por vários órgãos públicos, como a Presidência e o Ministério da Educação - onde conheceu seu marido, Luiz Curi, reitor de uma universidade de Brasília cujo dono é o primeiro suplente da senadora Roseana Sarney (PMDB-MA). Mas seus conhecimentos de telecomunicações são rudimentares.

Apesar de ser integrante do conselho consultivo da agência - conhecido por "chá das cinco", devido a sua função acessória no órgão - desde 2005, ela não é conhecedora dos meandros técnicos das telecomunicações. Emília foi indicada para substituir José Leite Passos, considerado um craque do setor.

Ex-chefe de Emília, quando ela foi assessora parlamentar da Educação, o ex-ministro Paulo Renato Souza, hoje deputado (PSDB-SP), esquivou-se da polêmica. Perguntado se ela teria capacidade para a vaga, respondeu:

- Eu não sei o que ela andou fazendo nos últimos seis anos.