Título: A descoberta de que as praças não são do povo
Autor: Duarte, Alessandra ; Vasconcellos, Fábio
Fonte: O Globo, 15/08/2008, O País, p. 5

Moradores de Vila da Penha acusam aliados de candidatos de fechar espaço e cobrar por uso de campo de futebol

Alessandra Duarte, Fábio Vasconcellos e Sergio Duran

A candidata à prefeitura do Rio Jandira Feghali (PCdoB) denunciou ontem que um "comandinho paralelo" tomou conta dos espaços públicos da cidade. Em visita à Vila da Penha, ela encontrou mais uma praça fechada com cadeado. Para usar o campo de futebol, os freqüentadores têm que pagar até R$120. Três moradores acusaram aliados políticos da vereadora e candidata à reeleição pelo DEM, Rosa Fernandes, de administrar a Praça Paulo Setúbal e de cobrar pelo uso do espaço. Em várias casas próximas ao local há placas e galhardetes com o nome da vereadora.

Na semana passada, o candidato do PT, Alessandro Molon, já havia denunciado problema parecido na Praça Andrade Neves, no Jardim América. Moradores informaram ao candidato que a praça é aberta somente para atender a grupos ligados a Rosa. O caso foi encaminhado para o Ministério Público estadual.

- Alguém articulado com o poder público vem aqui e coloca os seus para cobrar. Há uma privatização do espaço público. E quem privatizou tem a permissão do poder público para fazer, e não há fiscalização. Há um comandinho paralelo em regiões do Rio, em função dos loteamentos de determinados candidatos - criticou Jandira.

Rosa Fernandes negou as denúncias. Ela disse que grupos que usam quadras e campos de futebol passaram a cobrar pelo uso das quadras em vários bairros e que tentou impedir isso quando foi secretária de Meio Ambiente. Ao ser informado pela vereadora, o subprefeito de Irajá e Vila da Penha, Marcelo Martins, disse que vai retirar o cadeado da Paulo Setúbal.

Chico compara uso da máquina a currais do crime

Jandira disse que a coordenação de campanha do PCdoB está apurando denúncias do uso eleitoral de recursos públicos para apresentar à Justiça Federal. Segundo ela, um dos locais identificados fica no Bairro do Piraquê, em Pedra de Guaratiba, onde há uma obra de asfaltamento feita às pressas e que é vinculada ao candidato a vereador Eider Dantas (DEM). Ela cobrou mais rigor na fiscalização do TRE.

O candidato do PSOL à prefeitura, Chico Alencar, também criticou o uso eleitoral da máquina pública, comparando-o aos currais eleitorais do tráfico e da milícia. Em entrevista à Rádio CBN, ele chamou de abominável a apreensão de material de campanha do ex-secretário de Obras e candidato a vereador Eider Dantas (DEM) junto a uma obra de asfaltamento da prefeitura, anteontem, em Campo Grande. Segundo Chico, as visitas que a candidata Solange Amaral, do mesmo partido de Eider e do prefeito Cesar Maia, vem fazendo a órgãos públicos também podem ser consideradas uso da máquina.

- O grande problema dessas eleições não deriva apenas dos currais controlados por milícias e das eventuais imposições de traficantes. O uso da máquina está muito escancarado. Não é só o bandido, não. Não é só o miliciano, não. São as máquinas sendo usadas na campanha. Isso é crime de captação de sufrágio. Uso da máquina é isso - disse Chico, acrescentando que o adversário Eduardo Paes (PMDB) é um dos quatro "lulodependentes", ao lado de Jandira, Marcelo Crivella (PRB) e Alessandro Molon (PT). - A gente não precisa se rebaixar com "sou amigo do presidente". Isso é mediocridade política.

Cesar e Solange reúnem candidatos aliados

Um dia depois do flagrante de uso da máquina em favor de Eider e Solange em Campo Grande, o prefeito Cesar Maia e sua candidata a prefeita reuniram cerca de 150 candidatos a vereador da coligação (DEM-PTC-PMN). A reunião, que serviria para ajustar o discurso da campanha, virou palanque para candidatos criticarem privilégios de aliados. Um candidato chegou a bater boca com Solange. Eider deixou o local antes de a candidata a prefeita terminar de falar e não se manifestou.

Candidatos do PTC e do PMN reclamavam de estarem sem material para campanha. Renatinho da Vila Kennedy abordou Solange depois do encontro.

- Parece que vou ser um bucha para somar votos para o candidato líder. Se ela está dando uma estrutura boa para os vereadores do DEM como o Eider, com campanhas ricas, assim como o Renato Moura (presidente do PTC), temos direito a material para fazermos uma campanha honesta - reclamou.

Solange repreendeu o candidato e pediu respeito. Cesar prometeu reuni-los no Palácio da Cidade para discutirem o assunto, depois de dois outros candidatos do PMN também terem se queixado. Quanto à critica de que estaria acompanhando nas ruas apenas candidatos já conhecidos, ela disse que atenderá a todos.

Cesar diz que alertou servidores

Sobre o flagrante de uso da máquina pública, ela disse que a ânsia de vencer pode resultar em problemas como o verificado pelo TRE:

- A Justiça Eleitoral tem que fazer a parte dela. Os candidatos, no afã de vencerem, às vezes podem cometer uma ou outra irregularidade. Para isso existe a Justiça Eleitoral e os nossos advogados.

Cesar disse ter orientado os candidatos e até mesmo funcionários da prefeitura a terem cuidado para evitar problemas com a Justiça Eleitoral. O disse que a partir do dia 20 estará mais presente nas ruas, panfletando para Solange.

No discurso aos candidatos, o prefeito disse que a coligação pode chegar a eleger cerca de 20 vereadores, segundo pesquisas internas feitas por seu partido. Para ele, o DEM pode eleger entre 14 e 16 vereadores e os demais partidos, quatro ou cinco.