Título: No Rio, saúde vira receita para ir ao 2º turno
Autor: Duarte, Alessandra ; Borges, Waleska
Fonte: O Globo, 15/08/2008, O País, p. 8

Encostados nas pesquisas, Jandira e Eduardo Paes investem tudo em propostas para o setor e nas críticas a Cesar

Alessandra Duarte e Waleska Borges

Disputando hoje o segundo lugar na briga pela prefeitura do Rio, os candidatos Jandira Feghali (PCdoB) e Eduardo Paes (PMDB) apostam que a saúde decidirá quem vai para o segundo turno. Jandira tem se apresentado como médica e intensificado suas visitas a unidades de saúde, enquanto Paes diz, em seus folhetos, que esse é o tema número um de sua lista de compromissos.

Segundo a última pesquisa Datafolha, divulgada em julho, os dois estão tecnicamente empatados em segundo lugar, com 16% e 13%, respectivamente (a margem de erro é de três pontos). O primeiro é Marcelo Crivella (PRB), com 24% na época. Assessores de Jandira e Paes dizem que, em pesquisas qualitativas, a saúde foi citada como um dos problemas que mais angustiam o eleitor carioca. A disputa entre eles é não só para conseguir uma vaga no segundo turno, mas as duas, se possível, tentando passar Crivella.

Dengue reforçou no eleitor os problemas na área

Para especialistas, a epidemia de dengue no Rio fez com que os problemas na saúde estejam vivos na memória. Na últimas eleições, o próprio prefeito Cesar Maia admitiu que ficou a dever no setor.

No último dia 8, Paes fez questão de se apresentar ao lado do ministro da Saúde, José Gomes Temporão. Jandira, por sua vez, já visitou 16 unidades da saúde desde o início da campanha de rua, em julho. Num minicomício para cerca de 40 pessoas - em protesto contra o fechamento da Maternidade Leila Diniz, em Jacarepaguá -, ela disse que vai lançar seu programa de saúde amanhã, em Bangu. Depois de Paes aparecer ao lado de Temporão, foi a vez de Jandira dizer que vai entregar em mãos, ao ministro da Saúde, seu programa para o setor.

Segundo a coordenação da campanha de Jandira, a equipe fez uma pesquisa qualitativa sobre os interesses dos eleitores: a saúde foi citada como uma das principais demandas, ao lado da sensação de insegurança e de desordem urbana. Jandira já disse que a marca da sua gestão será "o fim da fila de espera e do jogo de empurra na saúde", com ampliação do programa Saúde da Família e um plano de cargos e salários para profissionais do setor:

- Qualquer candidato que fale de saúde vai ser uma roupagem artificial. Essa é minha história, minha vida. É difícil qualquer outro candidato falar de saúde com credibilidade como eu. É muito difícil que alguém arranque a bandeira da saúde da minha mão.

Essa bandeira, porém, já está também na campanha de Paes. Em suas visitas a unidades de saúde - 15, até a última quarta-feira -, ele frisa que o tema será prioridade. Paes anunciou a criação de 40 Unidades de Pronto-Atendimento 24 horas, modelo usado pelo governo estadual. Também propôs a construção de cinco Centros de Referência da Saúde da Mulher e a criação de clínicas da família com clínico geral, pediatra, ginecologista e dentista.

- A saúde é a maior angústia da população e o principal problema da cidade. Ela será prioridade 01. Vamos gastar pelo menos 20% das receitas próprias do município com a área de saúde, o que corresponde a um aumento de pelo menos 35% do que é gasto hoje. Será o secretário que vai ter mais recursos para trabalhar.

De acordo com Marcello Faulhaber, coordenador do plano de governo de Paes, a saúde como prioridade foi definida pelo candidato em conversas dele com eleitores. Segundo Faulhaber, pesquisas quantitativas e qualificativas determinaram as ações propostas por Paes.

- As pesquisas confirmaram as reclamações da população. A saúde é um tema emblemático, principalmente na Zona Oeste, onde existe um vazio sanitário absoluto - disse.

Presidente de Sindicato dos Médicos fala em calamidade

O presidente do Sindicato dos Médicos do Rio, Jorge Darze, disse que a precária rede de atenção básica, a baixa cobertura do Programa de Saúde da Família (PSF) - que abrange só 8% da população -, além das emergências sucateadas dos hospitais, são os principais problemas:

- A rede de saúde pública vive um estado de calamidade. As emergências dos hospitais precisam de novos equipamentos e de reformas estruturais. Também há falta de recursos humanos. Estimo que, para suprir a carência de médicos na rede básica, nas emergências e no PSF seriam necessários cerca de 6 mil profissionais.

Segundo Darze, o sindicato tem promovido reuniões com os candidatos, convidados a assinar uma carta-compromisso com propostas para a saúde. Já participaram Fernando Gabeira (PV), Eduardo Serra (PCB) e Chico Alencar (PSOL).

Para o professor do Instituto de Medicina Social da Uerj Ruben Mattos, a epidemia de dengue trouxe para o dia-a-dia dos eleitores cariocas a sensação de caos na saúde:

- Isso já era consenso entre os profissionais da área de saúde coletiva nas últimas eleições, e a dengue agora deixou essa sensação clara para os eleitores. Trouxe a saúde para o cotidiano das pessoas. Os candidatos estão vendo que vai somar votos quem falar de serviços da atenção básica de saúde.

O professor de sociologia do Iuperj Luiz Werneck Vianna disse que a saúde será um dos temas que definirão o rumo das eleições:

- A grande questão das eleições é quem vai para o segundo turno contra o Crivella, e a saúde será usada como um dos pontos a decidir quem vai chegar com ele.

Para o professor de ciência política da PUC Ricardo Ismael, Jandira, ao se apresentar como médica, adota um "discurso mais universalista", que sensibiliza a população. Já Paes se mostra como alguém que, por ser do PMDB, pode articular com a Secretaria estadual de Saúde e com o ministro Temporão.