Título: Algemas: Tarso diz que PF cumprirá rigorosamente
Autor: Gois, Chico de ; Talento, Biaggio
Fonte: O Globo, 15/08/2008, O País, p. 13

Ministro da Justiça afirma, porém, temer subjetividade e que medida "aumenta o arbítrio do agente policial"

Chico de Gois e Biaggio Talento*

BRASÍLIA e SALVADOR. Uma semana depois de o Supremo Tribunal Federal (STF) decidir restringir o uso de algemas, o ministro da Justiça, Tarso Genro, disse ontem que a Polícia Federal vai cumprir a súmula do STF, aprovada anteontem, que prevê punição para quem não respeitar as regras. Tarso informou que segunda-feira vai se reunir com a equipe técnica e jurídica do Ministério e da Polícia Federal para ver como a medida será cumprida.

- Temos de conectar essa discussão com aquilo que está escrito, para daí tirarmos as normativas que a PF vai adotar para cumprir a súmula. Quanto a isso não há a menor dúvida. Nós vamos cumpri-la rigorosamente - declarou.

Para Tarso, a decisão do STF aumentou o arbítrio do agente:

- Se a súmula determinasse, hipoteticamente, que é proibido algemar, o agente já saberia como se comportar. Ou (se dissesse) algeme-se todos, também saberia como se comportar. Como a súmula outorga ao agente o exame das condições técnicas para o uso das algemas ou não, o arbítrio do agente aumentou. Vamos ter de trabalhar de maneira rigorosa, muito técnica, sem qualquer tipo de avaliação preconceituosa em relação a quem está sendo algemado.

À tarde, em Salvador, Tarso se disse preocupado com as conseqüências da decisão do STF sobre o uso de algemas nas operações das polícias civis dos estados.

- O que pode ocorrer? Não se sabe. Isso aí pode gerar uma reação mais violenta nas pessoas (suspeitas) que leve a Polícia Civil a ter mais violência para se proteger - comentou, achando que a adaptação à norma será mais fácil na Polícia Federal, "uma polícia de elite, mais capacitada e treinada".

Para Tarso, a subjetividade da norma "aumenta o arbítrio do agente, ele fica mais senhor da custódia". O ministro disse achar que ficaria mais claro se houvesse uma decisão, por exemplo, indicando que "não se pode algemar ninguém ou só determinadas pessoas".

Terça-feira, em operação da PF em Mato Grosso, agentes algemaram 32 suspeitos de envolvimento com corrupção. A medida irritou o Supremo que, no dia seguinte, baixou a súmula, restringindo o uso das algemas. O ministro procurou minimizar a polêmica sobre o assunto. Tarso disse não ver clima de confronto entre as instituições.

- Nada disso é crise - disse ele, atribuindo as divergências "a um processo de adaptação democrática do país e reorganização das nossas instituições".

Ele negou que as novas regras possam favorecer os criminosos do colarinho branco.

- A PF não tem critério hierárquico para fazer prisões, até porque são determinadas pelo Judiciário, e não é relevante a extração social da pessoa, sua origem funcional, a profissão que exerce. Ela trata a todos de maneira absolutamente igual.

Presos em operação da PF recorrem citando a súmula

Em Cuiabá, advogados de 14 dos 16 servidores do Incra presos e algemados na terça-feira em Cuiabá, durante a operação da PF, protocolaram ontem na Justiça Federal um pedido de habeas corpus requerendo o trancamento do inquérito e a liberdade dos acusados. A tese central da defesa é a publicação da súmula vinculante do STF sobre o uso de algemas em suspeitos. No pedido de habeas corpus, a defesa alega que os servidores foram constrangidos ao serem expostos com algemas.

O procurador regional da República Alexandre Camanho, coordenador do Núcleo Criminal da Procuradoria Regional da República em Brasília, lembra que não há país desenvolvido que tenha abolido o uso de algemas. Para ele, o veto às algemas resulta na desautorização da polícia e dos procuradores.

- Fala-se da espetacularização das prisões, mas ninguém fala da espetacularização das falcatruas. Daqui a pouco estarão dizendo: "Olha que absurdo, a polícia está prendendo um criminoso". É preciso parar de tratar criminoso como príncipe. Policia não é escolta nem motorista e não dá carona a presos - disse, em entrevista à Rádio do Moreno, do Globo Online.