Título: Com fracasso de Doha, mais barreiras
Autor: Oliveira, Eliane ; Paul, Gustavo
Fonte: O Globo, 17/08/2008, Economia, p. 38

Especialistas alertam para dificuldades em negociações e contestações na OMC

BRASÍLIA. O enfraquecimento da Organização Mundial do Comércio (OMC), com a falta de entendimento na Rodada de Doha, abrirá caminho para outras barreiras às exportações, avaliam especialistas em comércio exterior. Até mesmo nos questionamentos levados ao Órgão de Solução de Controvérsias da OMC haverá dificuldades. Os países que se sentirem prejudicados pela nova legislação européia, por exemplo, terão de esperar mais tempo para ter suas demandas avaliadas pelos comitês de arbitragem do organismo internacional.

- Os países tendem a respeitar instituições que estão com o moral alto. Esse é um dos riscos da falta de acordo na OMC. As regras multilaterais de comércio podem ser ignoradas - afirmou o diretor de negociações internacionais da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), Mário Marconini.

Ele alertou que o Brasil, que vem aumentando sua participação no comércio global, será cada vez mais visado pelos concorrentes. Por isso, os empresários brasileiros e o próprio governo precisam se adaptar à nova realidade: devem saber tanto contestar as novas barreiras quanto se adequar às novidades, caso do pré-registro das cerca de 30 mil substâncias químicas.

- Tem que ser profissional, especialmente com a introdução de temas novos, sobre os quais não há normas estabelecidas, como meio ambiente e trabalho - ressaltou Marconini.

O vice-presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB), José Augusto de Castro, costuma dizer que, sem acordo na Rodada de Doha, venceu o protecionismo. O meio ambiente, acrescentou Castro, tem sido uma das principais desculpas para adotá-lo.

- Meio ambiente é a senha para o protecionismo - afirmou o vice-presidente da AEB, que também concorda que a OMC perdeu credibilidade.

Para o governo brasileiro, ainda é cedo para se dizer que a oportunidade de um acordo acabou na Rodada de Doha. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva trabalha para que seja realizada uma nova reunião ministerial para tratar do assunto ainda no próximo mês, antes das eleições presidenciais nos Estados Unidos, que acontecerão no início de novembro.

Com esse objetivo, Lula vem conversando com chefes de Estado nos últimos dez dias. Já tratou pessoalmente do assunto com os presidentes George W. Bush (EUA) e Hu Jintao (China) e falou por telefone com os primeiros-ministros Manmohan Singh (Índia) e Gordon Brown (Reino Unido). O ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, discutiu o tema na semana passada com o diretor-geral da OMC, o francês Pascal Lamy. (Eliane Oliveira e Gustavo Paul)