Título: Costa critica exigências da Anatel para supertele
Autor: Tavares, Mônica
Fonte: O Globo, 17/08/2008, Economia, p. 51

Separação entre banda larga e telefonia fixa nas empresas pode ser vetada por Lula se agência mantiver pleito

Mônica Tavares

BRASÍLIA. A Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) errou ao determinar no texto do novo Plano Geral de Outorgas (PGO) - que estabelece as diretrizes setoriais - que as operadoras separem em duas empresas distintas a telefonia fixa e a banda larga (serviços multimídia), disse ao GLOBO o ministro das Comunicações, Hélio Costa. Para ele, o órgão regulador deveria ter se manifestado apenas sobre as questões pedidas pelo Executivo e não ter decidido sobre um tema controvertido e que, em princípio, entra em choque com o espírito das mudanças solicitadas: a admissão da convergência tecnológica como motor do setor.

A separação de ativos rachou a Anatel quando o texto que foi à consulta pública estava sendo elaborado. Para evitar o atraso na apreciação, dois dos quatro diretores (a quinta vaga está aberta) abriram mão de sua posição e aprovaram a proposta com a separação de ativos. As empresas se opuseram fortemente à divisão. Anteviram, além de ineficiência tecnológica, aumento de custos (administrativos e tributários) e ameaçaram repassá-los ao consumidor final.

Medidas reduzem competitividade

Com as declarações, Costa indica que, mesmo que a Anatel venha a manter a exigência, o ministério poderá recomendar ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva que a ignore no decreto que vai estabelecer as novas regras - entre elas a liberdade de atuação territorial, que permitirá a compra da Brasil Telecom (BrT) pela Oi, criando a supertele nacional. Cabe à Presidência da República a formatação e aprovação da legislação. A função da Anatel é a instrução técnica.

- Eu acho que eles (os diretores da Anatel) ultrapassaram, deram mais informações do que o necessário e acabaram, de certo modo, criando um conflito - avaliou Costa, para quem questões como essa deveriam ser tratadas em separado.

O ministro enxerga outros entraves. Por exemplo, citou, a supertele nacional que surgirá com a mudança da lei tem como um de seus objetivos atuar no mercado internacional - especialmente na América Latina. Mas alterações como a proposta pela Anatel no texto retiram competitividade da companhia frente aos players globais:

- (A supertele fica) Sem condições de enfrentar um combate internacional.

Diante da controvérsia e da complexidade do assunto, a própria Anatel já havia decidido contratar uma consultoria para estudar o tema da separação de ativos, o Centro de Gestão de Estudos Estratégicos (CGEE), autarquia especial do governo federal.

O ministro afirmou ainda que o governo não tem prazo estabelecido para a aprovação do PGO. Mas alertou: se sentir que, por "algum instrumento regimental, a questão está sendo adiada, vamos nos pronunciar":

- Não é o caso deste momento ainda. Está dentro do prazo, acabou a consulta pública - afirmou ele, esperando que até o fim do ano o presidente Lula possa editar o decreto com o novo PGO.

Proposta é começar o ano com a fusão concluída

O governo também não está trabalhando com os prazos empresariais de Oi e BrT, que dependem da aprovação da lei para concretizar o negócio:

- Existe a vontade de fazer as coisas o mais rapidamente possível e, certamente, encaminhar os procedimentos para que a gente comece o ano com isso resolvido.

Costa demonstrou preocupação também com outra importante mudança no setor que está sendo desenhada no Congresso Nacional, o projeto de lei (PL) 29. Este vai alterar e unificar as regras da TV por assinatura do Brasil, permitindo a entrada das operadoras de telefonia na área, hoje dominada pelas empresas de TV a cabo. O ministro teme que a possibilidade de uma empresa utilizar todas as tecnologias de TV por assinatura - cabo, DTH (satélite) e MMDS (microondas) - e ter uma rede ADSL (de banda larga) favoreça o surgimento de uma companhia monopolista.

Outro ponto do PL 29 que levanta dúvidas é a utilização dos recursos do Fundo de Fiscalização das Telecomunicações (Fistel). Para o ministro, o texto permite a destinação de R$600 milhões ao ano ao financiamento da cultura:

- Não sou contra o financiamento da cultura brasileira, mas ela já tem vários instrumentos com os quais trabalhar. Talvez não necessitasse do Fistel, porque isso diminui a receita que deveria estar sendo usada na fiscalização do setor.

O ministro disse ainda que está acompanhando de perto a implantação da portabilidade numérica na telefonia fixa, uma das medidas mais aguardadas em termos de aumento da competição, com reflexos esperados na qualidade do atendimento e nos preços. O serviço vai permitir que o usuário troque de endereço, de empresa de telefonia fixa e de telefonia móvel e mantenha o número do telefone residencial, empresarial e celular.

Governo manterá início da portabilidade numérica

Hélio Costa tem conversado com o presidente da Anatel, embaixador Ronaldo Sardenberg, e informou que está descartado qualquer adiamento do prazo para o início do serviço, que começa em 1º de setembro:

- Não vemos dificuldade para poder implementar.

Costa lembrou que o calendário foi estabelecido há dois anos, e esse prazo foi suficiente para que as operadoras se preparassem para executar a mudança. Os testes conjuntos da portabilidade começaram em 15 de julho. O ministro descartou a possibilidade de um caladão, como o ocorrido em 1999:

- Não vejo mesmo. E me parece, da conversa que tive com ele, que Sardenberg também não.

O sistema de portabilidade estará funcionando completamente em março de 2009, e sua implantação obedecerá a um cronograma. Os primeiros estados a contarem com o serviço são São Paulo (DDDs 14 e 17), Espírito Santo (27), Minas Gerais (37), Paraná (43), Goiás (62), Mato Grosso do Sul (67) e Piauí (86). No Estado do Rio, a implantação dos três DDDs (21, 22 e 24) será feita ao mesmo tempo, na primeira quinzena de fevereiro de 2009.