Título: A economia como garantia de paz, uma grande ilusão
Autor: Oswald, Vivian
Fonte: O Globo, 16/08/2008, O Mundo, p. 31

Paul Krugman

Até agora, as conseqüências econômicas da guerra no Cáucaso foram marginais, apesar de a Geórgia ser um importante corredor para carregamentos de petróleo. Mas enquanto eu lia as últimas más notícias, me encontrei pensando se essa guerra é um sinal de que a segunda era da globalização possa compartilhar algo do destino da primeira.

Nossos avós viveram num mundo basicamente auto-suficiente, com economias autocentradas ¿ mas nossos tatataravós viveram, como a gente, num mundo de comércio e investimento internacional de larga escala, um mundo destruído pelo nacionalismo. Em 1919, o economista britânico John Maynard Keynes escreveu que um morador de Londres poderia, bebendo chá na cama, pedir por telefone produtos do mundo inteiro. E que considerava isso uma situação normal, certa e permanente.

Mas aí vieram três décadas de guerra, revolução, instabilidade política, recessão e mais guerra. No fim da Segunda Guerra, o mundo estava fragmentado economica e politicamente. E levou um par de gerações para as coisas voltarem para o lugar.

Então pode ir tudo por água abaixo de novo? Sim, pode.

Veja a atual crise de alimentos. Por anos nos disseram que auto-suficiência era um conceito fora de moda. Mas quando os preços subiram, os ¿projetos e políticas¿ de ¿exclusão e restrição¿ de Keynes voltaram: muitos governos correram para proteger o mercado interno ao barrar ou limitar exportações, deixando em agonia países importadores de alimentos.

E agora vem ¿militarismo e imperialismo¿. Por si só, a guerra na Geórgia não representa um grande problema economicamente. Mas marca o fim da Pax Americana ¿ a era em que os Estados Unidos mais ou menos manteve o monopólio no uso da força militar. E isso levanta questões sérias sobre o futuro da globalização.

E se a Rússia quer e for capaz de usar a força para impor controle sobre sua auto-declarada esfera de influência, outros não vão fazer o mesmo?

Alguns analistas nos dizem para não nos preocuparmos: a integração econômica do mundo nos protege de guerras, pois economias comercialmente bem-sucedidas não arriscariam sua prosperidade com aventuras militares.

Guerras entre países da Europa Ocidental realmente parece algo inconcebível no momento, nem tanto por causa dos laços econômicos, mas pelos valores democráticos compartilhados. Boa parte do mundo, no entanto, incluindo nações com papéis indispensáveis na economia mundial, não compartilham dos mesmos valores.

Muitos de nós continuam acreditando que, contanto que os negócios continuem, isso não importa. Mas isso não é uma suposição segura. A crença de que a racionalidade econômica sempre prevalece sobre a guerra é uma grande ilusão. E o alto grau de interdependência mundial é mais frágil do que imaginamos.

Paul Krugman escreveu este artigo para o New York Times