Título: Manifestantes cobram mudanças em Itaipu e ameaçam vaiar Lula
Autor: Figueiredo, Janaína
Fonte: O Globo, 16/08/2008, O Mundo, p. 33

Presidente não cede mas enfatiza que pretende ajudar o país vizinho

Ricardo Galhardo

ASSUNÇÃO. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva conseguiu se esquivar ontem de uma conversa com seu recém-empossado colega Fernando Lugo sobre a revisão dos preços pagos ao Paraguai pela energia excedente de Itaipu, mas não escapou da cobrança popular. Ao chegar ao local da solenidade de posse, Lula foi alvo de um ensaio de vaias por parte de um grupo de militantes do Partido Liberal, que integra o governo Lugo. A cada vez que o nome de Lula era anunciado, os manifestantes reagiam aos gritos de "Itaipu, Itaipu".

Pouco antes de deixar o Paraguai, Lula disse que o Brasil tem a responsabilidade de ajudar no desenvolvimento econômico dos vizinhos, mas deixou claro que não tomará medidas que penalizem os consumidores brasileiros. - O Brasil tem responsabilidade com os países da América do Sul e do Mercosul e precisa compreender isso, até porque, na medida em que eles crescem, ajudarão a crescer todo o bloco e todo o continente. Com relação às tarifas, vamos ver qual é a demanda dele (Lugo). Qualquer aumento que incidir em aumento de tarifa para o povo brasileiro fica complicado - disse.

O presidente não esclareceu quais medidas pode tomar para ajudar o Paraguai. Uma das hipóteses cogitadas é o financiamento pelo BNDES de uma linha de transmissão de Itaipu para Assunção ao custo de US$150 milhões, que possibilitaria a instalação de um parque industrial na capital paraguaia. Para Lula, a eleição de Lugo depois de seis décadas do Partido Colorado no poder gerou grande expectativa nos paraguaios e o Brasil deve ajudar para que a esperança não se transforme em frustração. A revisão do tratado de Itaipu foi um dos pontos fortes da campanha de Lugo à Presidência.

Planalto quer tratar da situação de brasiguaios

Lula disse que espera uma visita de Lugo ao Brasil, para que o governo paraguaio encaminhe suas reivindicações e seja iniciado um processo de negociação.

- Preciso saber qual a demanda que o presidente Lugo vai fazer ao Brasil, e tudo o que for possível negociar nós vamos negociar. Lugo é uma esperança de renovação para o povo do Paraguai e só nos resta contribuir para que esta esperança não seja frustrante. Não tem sentido um país ser rico e os outros, pobres - disse Lula.

Na verdade, o assessor especial da Presidência Marco Aurélio Garcia tem se reunido com negociadores paraguaios desde abril, quando Lugo foi eleito. O presidente vizinho propõe a criação de uma comissão de alto nível para debater com base em critérios técnicos o preço justo da energia de Itaipu. O ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, afirmou que o Brasil não abrirá mão de seus interesses em relação à hidrelétrica binacional.

-- Temos que defender nossos interesses em relação a Itaipu. O que for razoável, vamos tentar atender. Não sei como pode aumentar, nem onde. Muitas possibilidades estão sendo estudadas - disse.

Por outro lado, Lula indicou que vai falar com Lugo sobre a situação dos brasileiros que possuem terras no Paraguai, os chamados brasiguaios, cujas propriedades são alvo de invasões de grupos sem-terra aliados ao presidente. Segundo Lula, a possibilidade de desapropriação de terras produtivas adquiridas legalmente é uma violência.

- Existe uma legislação que diz qual é a terra que pode ser desapropriada ou não. As pessoas que têm terras legalmente contratadas se forem invadidas é uma violência contra o princípio da legalidade existente em cada país - disse Lula.

A rápida passagem de Lula pela capital paraguaia deixou evidente a animosidade dos vizinhos em relação ao Brasil.