Título: Corrêa: PF vai se adequar à restrição a algemas
Autor: Carvalho, Jailton de
Fonte: O Globo, 19/08/2008, O País, p. 11

Diretor do órgão, no entanto, afirma que medida não existe em nenhum outro país; policiais estão organizando protesto

Jailton de Carvalho

BRASÍLIA. Embora tenha se queixado ontem de que a restrição ao uso de algemas em presos não existe em nenhum outro país, o diretor da Polícia Federal, Luiz Fernando Corrêa, afirmou que a PF vai estudar um conjunto de medidas para adequar o manual de operação da instituição à nova súmula do Supremo Tribunal Federal (STF).

Antes, segundo Corrêa, o Ministério da Justiça deverá suspender a compra de veículos sem gaiolas nos portas-malas. Com a restrição às algemas, a PF entende que não há mais segurança para transportar presos, com as mãos livres, no banco de trás do motorista. Ele afirmou que todas as polícias do mundo recorrem ao equipamento para cumprir ordens de prisão.

- Não há precedentes (a decisão do STF). Toda a polícia do mundo usa algemas - disse Corrêa, depois de se reunir com o ministro da Justiça, Tarso Genro.

Pela decisão do STF, a polícia só poderá algemar se houver risco real de fuga ou ameaça de violência por parte do preso. Nesses casos, a polícia será obrigada ainda a justificar por escrito porque recorreu às algemas. Para a PF, o policial terá que prever se o preso pretende ou não fugir, se pode cometer algum ato intempestivo como matar alguém ou tentar suicídio, como já ocorreu em operações. Irritado, Corrêa disse que esse tipo de previsão é impossível.

- O cidadão nasceu para ser livre. Quando tem um decreto judicial de sua prisão, desafio alguém que possa objetivamente determinar como essa pessoa vai proceder. É um instinto da pessoa que é imprevisível.

Habitualmente moderado, Corrêa decidiu elevar o tom das críticas porque dentro da PF e do Ministério Público Federal a decisão do STF foi considerada absurda. Para policiais e procuradores, o uso de algemas é um instrumento para se garantir a segurança do preso, dos policiais e das pessoas próximas. As reclamações se estendem também às policiais estaduais. Grupos já estão se mobilizando para fazer protestos, e até greves, contra a decisão do STF.

Para Corrêa, as restrições do STF mudam uma prática bem-sucedida dentro e fora do país:

- Nós não temos incidentes de pessoas pós-algemadas com lesões. Onde há pessoas conduzidas sem algemas é que, via de regra, temos problemas quanto à integridade, a efetivação da prisão e, às vezes, até de violência policial.

Os policiais entendem também que, a partir de agora, ficou extremamente fácil a qualquer investigado anular uma grande operação de combate à corrupção. Segundo ele, basta um preso reclamar de um suposto uso indevido da algema. Se o juiz concordar com as queixas, toda a investigação que resultou na prisão pode ser invalidada, mesmo que tenha demorado meses ou anos para ser concluída. O STF decidiu restringir o uso de algemas na esteira das críticas do presidente do tribunal, Gilmar Mendes, à prisão do banqueiro Daniel Dantas, na Operação Satiagraha, da PF.

O grupo de policiais destacado para fazer o estudo tem prazo de 15 dias para entregar as conclusões ao Ministério da Justiça. A partir daí, Tarso Genro deverá editar uma portaria em que se tentará adequar a súmula do STF à realidade da polícia.

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