Título: Jornais defendem uma nova Lei de Imprensa
Autor: Aggege, Soraya; Rodrigues, Lino
Fonte: O Globo, 19/08/2008, Economia, p. 24

Associação propõe uma regulação mínima com mecanismos de direito de resposta e de fixação de indenizações

Soraya Aggege e Lino Rodrigues

SÃO PAULO. A Associação Nacional de Jornais (ANJ) vai liderar um movimento pela substituição da Lei de Imprensa, de 1967, por uma nova regulação mínima, chamada pela instituição de lei de liberdade de imprensa. No lugar da antiga legislação, considerada um "entulho autoritário", a entidade quer duas regras básicas: mecanismos para direito de resposta e para a fixação de indenizações nos casos de dano moral. A proposta recebeu aval dos presentes à abertura do 7º Congresso Nacional dos Jornais, que reuniu 733 participantes em São Paulo.

- Consideramos que essa lei do regime militar será totalmente extinta ainda neste ano. Em seu lugar, queremos uma regulação para o século XXI - disse Nelson Sirotsky, do Grupo RBS, que encerrou ontem seu mandato de presidente da ANJ.

A aposta em que a lei será extinta deve-se ao fato de que o Supremo Tribunal Federal (STF) suspendeu, por meio de liminar, dezenas de artigos da Lei de Imprensa, em razão de uma argüição de inconstitucionalidade da atual legislação apresentada pelo deputado federal Miro Teixeira (PDT-RJ).

Indenizações inviabilizam jornais pequenos

A nova presidente da ANJ, Judith Brito, do grupo Folha, adiantou que a entidade vai liderar a defesa da proposta no país e afirmou que a necessidade do marco regulatório já foi aprovada internamente:

- A defesa da liberdade de imprensa é uma das maiores razões da existência da nossa associação. Entendemos que, para se assegurar a liberdade de expressão prevista na Constituição, são necessárias regras legais mínimas.

Segundo Sirotsky, jornais e jornalistas têm sido alvo de decisões muito heterogêneas de juízes, inclusive para censura prévia. A maior parte dos processos, porém, atende a uma "indústria de indenizações" para supostas reparações morais sem parâmetros financeiros adequados. Jornais pequenos, por exemplo, são condenados a pagar somas que os inviabilizam. Para evitar isso, uma das idéias é criar critérios para as indenizações, como pagamento de valor semelhante ao custo comercial do espaço jornalístico que serviu como fonte da reclamação de dano moral.

Ontem, o primeiro Prêmio ANJ de Liberdade de Imprensa foi entregue ao ministro Carlos Ayres Britto, pelo voto pioneiro contra a aplicação da Lei de Imprensa. A entrega foi feita pela jornalista Elvira Lobato, da "Folha de S.Paulo", que tem sido alvo de processos com base na antiga legislação. Ayres Britto disse que não poderia dar sua opinião sobre a possível extinção da atual lei.

- Agora será o julgamento do mérito, e essa questão será o núcleo do julgamento. Por isso, não posso antecipar meu voto - disse o ministro, que fez um discurso emocionado ao receber o prêmio. - A imprensa livre é um dos mais vistosos traços de uma civilização avançada.

Miro Teixeira: "querem silenciar a imprensa"

Numa das mesas de debates no congresso ontem, o tema foi justamente a liberdade de expressão. Além de representantes da ANJ, participaram Miro Teixeira e o jurista Manoel Alceu Affonso Ferreira, que discordaram quanto à necessidade de uma nova lei de imprensa.

- Sou favorável a uma lei especial de imprensa. Mas sei que, mesmo com uma nova lei, essa indústria das indenizações não cessará, porque a Constituição faz tutelas. O que jornais e jornalistas precisam fazer é adotar medidas preventivas. Hoje, as indenizações são arbitrárias e envolvem números cabalísticos, sem critérios justos - disse Affonso Ferreira.

Já o deputado argumenta que a Constituição de 1988 não prevê uma lei específica, mas assegura a liberdade de imprensa em seu próprio âmbito. Frisou ainda que a crítica aos agentes públicos, que são a maioria dos autores de processos com base na velha lei, também estão assegurados na Constituição.

- Quem se candidata ou se oferece a um cargo público tem que saber que faz parte do jogo estar exposto à fiscalização da imprensa. Nós, deputados, já temos o foro especial. Agora, o mínimo é permitir a fiscalização total da imprensa - disse Miro, acrescentando que a pior censura no Brasil não é formal. - O Brasil é o país do grampo e da informação sigilosa. Querem silenciar a imprensa. E isso é muito mais grave que a ditadura militar, porque você nem sabe para quem deve reclamar.

Ricardo Gandour, da ANJ e diretor do grupo Estado, disse que a melhor solução para controlar os possíveis abusos e erros da imprensa pode ser a exposição dos próprios erros:

- Os problemas do jornalismo devem-se resolver com mais jornalismo e liberdade. Não há necessidade de controle, de uma lei para a imprensa.

O ministro da Comunicação Social, Franklin Martins, representou o presidente Lula, que não pôde ir ao evento:

- O governo garantiu a liberdade de imprensa. Mas isso não foi benesse do príncipe. O fato é que o Brasil não admite mais (cerceamento da imprensa). Não só milhões de brasileiros aumentaram sua renda, como passaram a exercer mais sua liberdade de opinião - disse Franklin, argumentando que, se houver excessos da imprensa, a democracia tratará deles.