Título: A ofensiva da Petrobras
Autor: Paul, Gustavo
Fonte: O Globo, 20/08/2008, Economia, p. 21

ENERGIA EM XEQUE

Estatal quer garantir exploração de megacampos já descobertos como contrapartida à "Petro-sal"

A Petrobras não se importa com a criação de uma nova estatal para cuidar da área do pré-sal ao longo da costa brasileira, desde que a União lhe garanta o direito de exploração dos nove megacampos já descobertos, previstos em contrato, e das áreas a eles contíguas. Só estas reservas são estimadas entre 50 bilhões e 70 bilhões de barris, segundo avaliações do mercado - cinco vezes o montante já provado no país. Para isso, a empresa vai sugerir ao governo que as áreas do cluster (complexo) da Bacia de Santos - onde se localizam os campos de Tupi, Júpiter, Caramba, Carioca e outros - sejam unificadas.

Para viabilizar essa unificação de áreas (chamada tecnicamente de unitização), a Petrobras está sugerindo que seja feito um aumento de capital da petrolífera de cerca de US$100 bilhões. Essa operação teria várias implicações. Por um lado, garantiria parte do financiamento dos investimentos para a exploração das áreas. Estima-se que a exploração do cluster custaria um total de US$600 bilhões nos 30 anos de concessão. De outro, aumentaria a remuneração da União, que é controladora da empresa e dona das áreas contíguas ainda não licitadas. Isso aconteceria porque o aumento de capital elevaria a participação da União na Petrobras de 40% para cerca de 60% das ações.

- A Petrobras está preocupada em viabilizar o projeto do pré-sal, algo já tão grande que não existe paralelo no mundo. A empresa quer garantir a geração de recursos para essa exploração - afirma uma fonte ligada diretamente às negociações.

Sócios privados teriam menos poder

Além de preservar mais receita para a União, a medida teria um efeito político: reduziria a influência dos sócios privados na empresa. A proposta não ainda foi apresentada à comissão interministerial que analisa a nova política do petróleo, mas já chegou aos ouvidos de seus membros.

A nova estatal, apelidada de Petro-sal, seria criada para coordenar a produção do restante da área do pré-sal, que vai do litoral do Espírito Santo até Santa Catarina. Segundo estimativas ainda não confirmadas, a área toda teria potencial de reserva de até 300 bilhões de barris de petróleo.

A unitização dos poços é uma possibilidade prevista na legislação brasileira e se aplica a campos em que os reservatórios se intercomunicam. No caso, as concessionárias fazem um acordo de quanto vão deter de petróleo, para evitar que um campo "chupe" o petróleo do vizinho. Segundo analistas que tiveram acesso à proposta da Petrobras, esta representaria um jogo de ganha-ganha para o governo, a estatal e seus sócios.

O valor do aporte será calculado de acordo com as estimativas de reservas existentes, multiplicadas pelo valor de produção do barril do petróleo. A União integralizaria 40% do aporte de US$100 bilhões, correspondentes a sua participação no capital da empresa. Os outros 60%, por imposição da lei, seriam oferecidos a acionistas minoritários. A expectativa, porém, é que os minoritários só consigam comprar até US$20 bilhões em ações.

Maior capacidade de investimento

A União, então, ficaria com o restante, aportando, no total, US$80 bilhões e elevando a participação governamental na estatal para 60% do capital total. Esse aporte não significaria a injeção de recursos propriamente ditos. Segundo um dos estrategistas, seria a troca de ações por barris. O governo pagará esse valor com os dividendos que irá receber ao longo dos anos com o pré-sal. Com isso, a Petrobras deixaria de repassar recursos para o governo durante um certo tempo, o que aumentaria sua capacidade de investimento.

De acordo com observadores, a principal vantagem dessa proposta é dar à Petrobras tranqüilidade para tocar a exploração nas áreas das quais já é operadora. O temor da empresa é que a discussão sobre a nova estatal atrase a exploração das áreas. Caso do recém-anunciado campo de Iara. Por outro lado, se a nova estatal for criada imediatamente, avalia-se que haverá dificuldades em promover a unitização dos campos do pré-sal já descobertos. A empresa corre contra o tempo, pois tem até 2010 para declarar a comercialidade dos poços.

Por beneficiar diretamente a Petrobras, a proposta deverá sofrer bombardeios políticos, avalia um ex-diretor da empresa. Políticos que participaram de reunião do Conselho Político ontem disseram que Lula explicou que o governo está trabalhando num novo marco regulatório para o pré-sal, mas que não citou especificamente a criação de uma empresa para isso.

- O presidente disse que está estudando meios para fazer com que os royalties cheguem aos outros estados - disse o líder do PTB, Jovair Arantes (GO).

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