Título: STF mais ativo cria polêmica diante de demora do Legislativo para votar
Autor:
Fonte: O Globo, 24/08/2008, O País, p. 15

Súmula sobre uso de algemas seria exemplo de novo perfil de atuação da Corte

Jailton de Carvalho e Catarina Alencastro

BRASÍLIA. A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de editar súmulas sobre nepotismo e uso de algemas provocou reações no Congresso, no governo e entre estudiosos da Constituição. Para alguns parlamentares, juristas e altos funcionários do Executivo, o STF estaria, sob a forte liderança do presidente da Corte, Gilmar Mendes, invadindo território do Legislativo. Outro grupo, igualmente expressivo, entende que o STF mudou de perfil, tornou-se pró-ativo diante de relativa inércia de Câmara e Senado, mas não virou uma nova estrutura política.

O ex-presidente do Tribunal Superior Eleitoral Carlos Velloso comemora. Para ele, o STF se tornou mais dinâmico e aberto às mudanças sociais, na mesma linha da Suprema Corte dos Estados Unidos. Recorrer a princípios gerais para preencher lacunas da legislação e, a partir daí, assegurar direitos fundamentais é tendência mundial, diz ele:

- O Direito se relaciona com a História, e a História não pode parar. O que o Supremo fez foi cumprir a Constituição.

Gilmar, apontado como um dos responsáveis pela guinada da Corte, nega a intenção de entrar na seara política. Diz que a idéia não é criar novas leis, mas fazer ajustes na legislação; orientações diante da demora do Congresso para deliberar:

- Há certo exagero com essa idéia de que o Supremo está ou pretende substituir o legislador. Há casos em que, por razões políticas ou históricas, o legislador não consegue atuar em tempo socialmente adequado.

Para Lula, opinião pública aprova postura da Corte

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva concorda que o Congresso tem sido lento no processo decisório. Por isso, é fundamental que outras instituições resolvam problemas. Na avaliação de Lula, a posição mais atuante assumida pelo STF é bem-vinda e tem rendido à Corte bons frutos na opinião pública.

- Acho que o STF avançou o sinal - diz Dalmo Dallari, professor da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo.

Para Dallari, o STF exagerou ao editar duas súmulas sem que houvesse, antes, deliberado várias vezes sobre o assunto. Pelo artigo 103 A, da Constituição, o tribunal só pode recorrer a esse expediente "após reiteradas decisões sobre matéria". Ele diz que isso não ocorreu.

- Ao sumular tema que não teve decisões recorrentes, o STF acaba legislando e interferindo numa prerrogativa exclusiva do Legislativo - diz o senador Aloizio Mercadante (PT-SP).

Há algum tempo juristas reclamam da ingerência da Corte em questões como a demarcação da reserva indígena Raposa Serra do Sol e regras eleitorais. As reações se tornaram mais fortes após a edição da súmula sobre o uso de algemas, semanas depois da prisão do banqueiro Daniel Dantas, pela Polícia Federal.

COLABOROU: Carolina Brígido

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