Título: Mudança de curso
Autor: Passos, José Meirelles
Fonte: O Globo, 27/08/2008, O Mundo, p. 35

Plataforma de Obama deixa terrorismo em segundo plano e tenta fortalecer sonho americano

José Meirelles Passos

Ao aceitar amanhã, formalmente, a sua indicação como candidato à Presidência da República, Barack Obama fará um discurso alertando o povo americano de que os Estados Unidos estão "num momento determinante de sua História como nação". A mensagem central, segundo assessores, será a advertência de que o sonho americano está correndo o risco de terminar. E, por esse motivo, Obama vai afirmar que seu objetivo nas eleições de novembro será não apenas substituir o atual presidente e seu partido, e "oferecer políticas que desfaçam os danos que eles forjaram". A idéia é "jurar uma volta aos princípios morais centrais, como a administração eficiente, o serviço em benefício dos outros, a responsabilidade pessoal, e tanto um sacrifício compartilhado quanto uma chance justa para todos".

- Esse deverá ser o pano de fundo do discurso de aceitação da candidatura. Estamos dando ainda uns retoques no texto, cuja versão final será editada pelo próprio Obama. Mas a espinha dorsal está exposta de forma cristalina na plataforma de governo que acabamos de aprovar - disse um assessor ao GLOBO.

O texto, de 56 páginas, foi aprovado segunda-feira, primeiro dia da convenção democrata, numa reunião presidida por sua líder na Câmara, Nancy Pelosi. Será distribuído amanhã. Está repleto de promessas concretas como, por exemplo, a de investir de imediato US$50 bilhões para dar um impulso inicial à economia; tornar os EUA mais eficientes em energia até 2030; e obter 25% de eletricidade através de energia renovável até 2025.

No entanto, o peso mais significativo está nas linhas gerais do plano que, em certos trechos, soa como algo parecido ao que propôs o falecido presidente John F. Kennedy. Por exemplo: "Acreditamos que devemos mudar não apenas nossas posições, mas também nossa política. Não podemos esperar continuar fazendo as mesmas coisas com expectativa de resultados diferentes".

Aproximação com Brasil é citada na plataforma

O Brasil é mencionado três vezes na plataforma geral de governo de Obama. A primeira diz que ele vai adotar uma estratégia de segurança "que reconheça que temos interesses não apenas em Bagdá, mas em Kandahar e Karachi, em Pequim, Berlim e Brasília". Mais adiante Obama propõe: "Devemos trabalhar com parceiros mais próximos como México, Brasil e Colômbia". Obama diz que buscará "colaboração efetiva em questões globais urgentes" tanto com grandes potências quanto com "as novas e emergentes, como China, Índia, Rússia e Brasil". Ontem, no Kansas, Obama fez algo que consta em sua plataforma - ao defender um isolamento da Rússia pelo fato de seu governo ter decidido apoiar as duas regiões separatistas da Geórgia.

- Condeno a decisão de reconhecer Ossétia do Sul e Abcásia como Estados independentes - disse, mas acrescentando que assuntos como esse devem ser resolvidos através do Conselho de Segurança da ONU.

O plano de governo marca uma mudança radical em relação ao que o partido propôs quatro anos atrás, na candidatura de John Kerry. A diferença é gritante logo no título. O de Kerry propunha: "Fortes em casa, respeitados no mundo". O de Obama diz: "Renovando a promessa dos EUA". Enquanto o anterior tinha como prioridade a guerra ao terror, o novo coloca isso em segundo lugar. Há dois objetivos mais prementes: "Terminar a guerra no Iraque com responsabilidade", em 16 meses; e revitalizar o sonho americano, com atenção especial à economia.

Quanto ao terrorismo, Obama tem um enfoque diferente: "Vamos insistir em políticas que expandam nossa compreensão das circunstâncias e crenças que servem de base para o extremismo, de forma a encará-las de forma efetiva. Um debate crucial está ocorrendo dentro do Islã. A maioria dos muçulmanos acredita num futuro de paz, tolerância e democratização."

A plataforma homenageia Bill Clinton, elogiando sua política econômica, em contraste com as falhas do governo George W. Bush, e também Hillary, agradecendo-lhe por criar "18 milhões de rachaduras no teto de vidro mais alto" - referência aos votos obtidos por ela e que ajudaram a fortalecer o partido na disputa com o republicano. O texto esnoba o adversário, John McCain, que levanta suspeitas sobre o patriotismo de Obama: "Essa é a essência do que significa ser patriota: não apenas declarar nosso amor pela nação, mas mostrar isso através de nossas ações, prioridades e compromissos."