Título: Uma conta mais salgada
Autor: Duarte, Patrícia
Fonte: O Globo, 28/08/2008, Economia, p. 27
Inflação, juros e câmbio pesam e governo gasta 33% mais com encargos da dívida
Patrícia Duarte
Opagamento de juros feito por União, estados, municípios e estatais em julho - R$18,777 bilhões, 33,3% mais do que em igual período de 2007 - levou o país a fechar o mês com déficit nominal de R$6,668 bilhões, o maior do ano e o pior nível para meses de julho desde 2006, segundo dados do Banco Central (BC). Com isso, no acumulado de 2008, o resultado nominal (já quitados os encargos financeiros) está negativo em R$8,578 bilhões, ou 1,94% do Produto Interno Bruto (PIB) em 12 meses. A estimativa do BC para o ano é de 1,5%. O Ministério da Fazenda anunciou esta semana que pretende zerar essa conta em 2010.
Os números não foram piores porque o país registrou no mês passado o melhor superávit primário para julho, de R$12,109 bilhões, acumulando no ano R$98,225 bilhões. Com isso, a economia feita pelo setor público para pagamento de juros estava em 4,38% do PIB, um pouco acima da meta do governo para o ano, de 4,3%.
De acordo com o chefe do Departamento Econômico do BC, Altamir Lopes, o aumento do peso dos juros está relacionado à remuneração crescente dos títulos públicos indexados aos índices de preços, na carona da escalada da inflação. Também pesaram a apreciação cambial de 1,59%, que impede a valorização dos ativos em dólar, e o início do aumento da Taxa Selic.
- Além disso, julho teve dois dias úteis a mais do que junho, e isso acaba contribuindo - disse Lopes, para o qual, apesar do movimento, continua factível o cumprimento da meta de superávit no ano.
Analistas: meta de déficit zero é difícil
Apesar dos resultados primários robustos, especialistas continuam considerando difícil o objetivo informado pelo ministro da Fazenda, Guido Mantega, de obter déficit nominal zero em 2010 (empate entre todas as receitas e despesas, de qualquer natureza). A questão é o prazo exíguo, não a tendência.
O economista do Banco Real Cristiano Souza lembra, por exemplo, que o impacto da elevação dos juros básicos pelo BC sobre as finanças públicas ficará mais evidente em 2009. A Taxa Selic remunera boa parte dos títulos público. Hoje, ela está em 13% ao ano, após começar 2008 em 11,25%. A expectativa é que chegue a 15% até o início de 2009.
- Com o cenário de estabilidade da inflação em 2009, pode voltar a pressão para mais gastos públicos. Será um ano com crescimento econômico menor. Conseqüentemente, teremos arrecadação menor. Mas não é uma catástrofe, e vamos continuar vendo reduções (no resultado nominal) - afirmou Souza, para quem o déficit deste ano deve ficar em 1,4% do PIB e, em 2009, em 1,1%.
No resultado primário, segundo o BC, houve destaque para o superávit dos estados (R$2,855 bilhões, recorde para julho) e para o governo federal, com R$10,005 bilhões, também o melhor resultado para o período. Neste caso, as arrecadações cada vez maiores melhoraram o desempenho.
As empresas estatais contribuíram com superávit primário de R$1,488 bilhão em julho, o dobro da cifra apurada um ano antes. Para o economista-chefe do banco Fator, José Francisco Gonçalves, a situação das contas públicas do país é confortável, sobretudo a curto prazo, já que as eleições impedem gastos maiores até o fim do ano.
Segundo o BC, a relação entre dívida líquida e PIB fechou o mês passado em 40,6%, 0,2 ponto percentual acima do registrado em junho, devido, entre outros fatores, à menor correção inflacionária do PIB pelo IGP-DI. O indicador de preços de julho ficou em 1,12%, e o de junho, em 1,89%.