Título: Será difícil perder. Só se houver um erro catastrófico
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Fonte: O Globo, 29/08/2008, O País, p. 8

Adriana Vasconcelos, Diana Fernandes e Silvia Fonseca

A que o senhor atribui esse pulo de 6% para 21% nas pesquisas? Isso já era esperado?

MÁRCIO LACERDA: Reflete a aceitação, pela população, das nossas teses, propostas e esboço de programa. Não posso dizer que era esperado. Mas, considerando que essa aliança tem a aceitação de mais de 80% da população, aproveitamos os primeiros programas para falar da minha trajetória e explicar por que eu represento essa confluência entre os dois partidos.

O senhor se considera um privilegiado por ter sido escolhido para encarnar um projeto dos dois principais líderes políticos do estado? E por que acha que foi escolhido?

LACERDA: Sempre fui uma pessoa modesta, comum, humilde. É o que os outros dizem. Se eu ganhar essa eleição, tenho certeza que farei excelente administração. Pelo que ouvi deles próprios, o meu perfil produzia boa possibilidade de ser bem aceito pelos partidos. As pesquisas mostram que o meu nível de rejeição é o mais baixo de todos os candidatos.

Não seria pelo fato de o senhor também ser mais desconhecido?

LACERDA: Você tem razão, mas tenho amigos em vários partidos. Eu era uma pessoa não conhecida pela maioria da população, mas o meio empresarial, políticos e jornalistas já me conheciam.

Uma crítica de seus adversários é que o senhor tem ligação com o setor empresarial e não com a história política da cidade.

LACERDA: Respeito essa opinião. Mas estou aqui desde 17 anos. Aqui casei, criei a minha família, fundei as minhas empresas e militei na política. Eu me filiei ao Partido Comunista, tive intensa atividade na política empresarial. E quem milita na política empresarial tem intensa movimentação política. Não fui militante de movimentos sociais de base, mas sempre tomei conhecimento do que estava acontecendo e apoiei amigos de centro-esquerda nas eleições.

Dizem que o senhor está sendo usado por Aécio e Pimentel, que têm planos políticos para 2010.

LACERDA: É muito fácil fazer alegações desse tipo. O que o governador e o prefeito estão fazendo é um projeto em benefício da cidade. Eles trabalharam juntos seis anos, com sucesso e aprovação da população. E chegaram à conclusão de que, se fossem para uma disputa política, não seria bom para a cidade. É difícil prever o que acontecerá em 2010.

O senhor acha possível conciliar projetos do PT e do PSDB?

LACERDA: Não existe mais diferença, se considerarmos o caso em Minas. Fazem alegações teóricas sobre diferenças programáticas, que o governador é neoliberal. São rótulos e clichês usados politicamente. Se analisarmos o processo de desenvolvimento no Norte de Minas, no Jequitinhonha, é como se fosse um orçamento participativo. Mas o governador não chama isso de orçamento participativo. Essa alegada diferença programática e ideológica não é tão grande assim. Naturalmente que não significa a união desses dois partidos, mas união em favor da cidade.

A deputada Jô Moraes (candidata do PCdoB) diz que o senhor não tem legitimidade para dar continuidade a um projeto que começou em 93 com o ex-prefeito petista Patrus Ananias, hoje ministro.

LACERDA: Por que o Pimentel hoje é o prefeito mais bem avaliado? Porque ele aplicou políticas públicas sem rótulos ideológicos. Ele deu continuidade ao que o Patrus e o Célio de Castro fizeram. Apenas se desviou de rótulos ideológicos e, sem esses preconceitos, se aproximou do governador em favor da cidade. Isso é embate político, não vai chegar no coração do povo.

O eleitor já compreendeu que o senhor vai unir esses projetos?

LACERDA: Tenho a confiança do governador e do prefeito. E dos partidos também. Há alguns dissidentes no PT, que não quiseram (me apoiar). A cidade construiu um modelo de parceria com todos os segmentos, e nosso compromisso é dar continuidade a isso.

O senhor vai tentar conquistar dissidentes do PT, como o ministro Patrus?

LACERDA: A nossa postura é manter as portas abertas. Gostaríamos que o ministro Patrus mudasse de idéia. Ele é uma liderança importante e fez belo trabalho na prefeitura.

Alguém já usou ou citou nessa campanha a denúncia de envolvimento do senhor com o mensalão?

LACERDA: Se alguém falar nisso novamente eu vou processar. Eu não fui indiciado pela Polícia Federal. Pelo contrário, fui claramente inocentado. Colocaram meu nome numa lista, mas eu provei documentalmente que não recebi dinheiro. Minha vida e minhas contas foram vasculhadas. A Receita Federal me pediu uma pilha de documentos e explicações de depósitos até de R$130 na minha conta, e nada. Isso porque o dinheiro não passou pela minha mão. Eu simplesmente, por orientação da campanha do PT, coloquei o Einhart (Einhart Jacome da Paz, marqueteiro da campanha de Ciro Gomes) em contato com Marcos Valério. O Einhart me ligou dizendo que não estava recebendo, liguei para o Delúbio, e este me disse para ele (Einhart) procurar o Marcos Valério, de quem eu nunca tinha ouvido falar. Apenas coloquei os dois em contato.

O senhor aparece como o candidato com o maior patrimônio declarado. Isso pesa na eleição?

LACERDA: Antigamente, dinheiro era sinal de pecado. Felizmente, a cultura hoje no país está mudando. Se a pessoa vem de baixo, construiu o patrimônio de maneira honesta, trabalhou muito, teve seus funcionários felizes como os meus, essa pessoa tem de ser elogiada.

Fala-se muito em Belo Horizonte no "Projeto Minas", de Aécio presidente da República...

LACERDA: Minas está readquirindo um papel importante na política nacional. Encomendamos uma pesquisa que indica que BH é considerada hoje tão importante politicamente quanto São Paulo, porque algo de novo está acontecendo aqui. Minas sempre teve esse papel de construir convergências. Se isso vier a desembocar num mineiro como candidato à Presidência, vai ser muito difícil encontrar um mineiro que não o apóie. Eu me incluo entre eles.

E uma possível candidatura de Pimentel ao governo do estado também teria seu apoio.

LACERDA: O Pimentel certamente estaria qualificado para ser governador, mas não cabe a mim dizer isso.

É verdade que o senhor já financiou campanhas da hoje adversária Jô Moraes?

LACERDA: Eu não guardo lembranças disso, porque sempre foram ajudas desinteressadas. O PCdoB eu ajudei, inclusive em 2002. O Sérgio Miranda (hoje candidato do PDT em BH) é muito amigo de um conhecido meu, e ajudei.

Como estão as doações para sua campanha? O senhor já investiu nela?

LACERDA: Fiz alguma contribuição, e estou preparado para fazer mais se necessário. Mas a arrecadação não decolou no ritmo que gostaríamos. Os empresários, de uma maneira geral, estão muito identificados com o projeto do governador e do prefeito. Há incompatibilidades contra ideologias. Você tem pessoas nessa dissidência do PT que defendem revolução agrária e operária. Empresário não gosta disso.

Jô diz que tem dificuldades para obter doações de empresários...

LACERDA: Ela é candidata de um partido comunista, e isso tem um preço.

O senhor virou símbolo da união de duas forças políticas fortes e antagônicas, mas nega a questão política e ideológica disso.

LACERDA: Não estou negando, mas o voto e o clichê ideológico são muito perigosos, porque reducionistas. Estamos falando de resultados, que tem inclusão social, mas sem rótulos, sem preconceito.

É uma visão muito diferente da que o senhor tinha há 40 anos, quando militava no Partidão?

LACERDA: Quando houve o golpe militar, muitos se rebelaram, e eu me incorporei à resistência. Mas nunca fui um marxista de carteirinha. Era um jovem que não gostava de injustiça, nem da ditadura. Nunca fui dogmático nesse sentido.

Se o senhor não for eleito, tendo o apoio do presidente (Lula é mostrado na TV em uma foto), do governador e do prefeito entre os mais populares do país, sua derrota terá um peso maior...

LACERDA: Será difícil perder; só se cometermos um erro catastrófico. Mas só as urnas, no dia 5, para responder. As perspectivas são boas, a gente trabalha para ganhar. Todos nós corremos riscos na vida, já corri muitos, mas a campanha está bem estruturada e a população apóia. Isso deverá se refletir no voto. Estou de coração leve.

"Será difícil perder. Só se houver um erro catastrófico"

Candidato de Aécio e Pimentel lidera as pesquisas eleitorais em Belo Horizonte, embora poucos eleitores saibam o seu nome

Ele parece meio desconfortável na campanha eleitoral, apesar (ou por isso mesmo) de ser o candidato das duas maiores autoridades políticas de Belo Horizonte, o prefeito Fernando Pimentel (PT), e de Minas, o governador Aécio Neves (PSDB). Não é para menos: Márcio Lacerda é um empresário que não tem mais empresas, o candidato que declarou o maior patrimônio em todas as capitais, está filiado há pouco mais de um ano a um partido (PSB) e disputa sua primeira eleição. Mesmo assim, já lidera nas pesquisas. Nove entre dez motoristas de táxi de Belo Horizonte, por exemplo, dizem achar que quem ganhará a eleição lá é "o candidato do Aécio e do Pimentel", mas na hora de dizer o nome dele... A imagem do empresário que chegou a ser citado no escândalo do mensalão como assessor do hoje deputado Ciro Gomes - e foi absolvido - é quebrada, na TV, com a lembrança de que, ao vender suas empresas, doou parte aos empregados. Isso é destacado na biografia de Lacerda, assim como a união de Aécio e Pimentel em torno dele. Diz que seu objetivo é dar continuidade a projetos de desenvolvimento da capital, "sem ideologia". E afirma: "Será difícil perder. Só se cometermos um erro catastrófico".