Título: O imprevisto acontece
Autor: Coimbra, Marcos
Fonte: Correio Braziliense, 24/05/2009, Política, p. 8

Os projetos de muitos partidos e das várias forças que orbitam o governo passaram a depender de fatores que ninguém controla

A precipitação com que o sistema político resolveu tratar as eleições de 2010 tinha um preço, que já começou a ser pago. O que parecia assentado e tranquilo logo, logo se revelou instável.

Nunca tínhamos tido um processo sucessório parecido, com quase tudo de uma eleição sendo conhecido tão antes da hora. A mais de um ano dela, os profissionais da política se sentiam capazes de apontar os candidatos, os favoritos e o que diriam aos eleitores. Só faltava dizer quem venceria.

Parecia que atravessaríamos os próximos meses apenas aguardando que os fatos confirmassem os prognósticos. Não é isso, contudo, que está acontecendo, nem bem chegamos ao fim do primeiro semestre do ano.

O meio político anda nervoso. Do lado do governo, com as notícias sobre a saúde de Dilma e suas repercussões. Do lado das oposições, com a indefinição que persiste entre as duas candidaturas do PSDB.

A pressa de Lula em indicar a ministra Dilma tinha suas razões e foi uma jogada política competente. Ele queria alguém completamente identificado consigo, cuja imagem não tivesse qualquer autonomia em relação a ele. Era uma opção com boa dose de vaidade, mas não apenas isso.

Ele não tinha mesmo, ao seu lado, uma candidatura pronta, de alguém que fosse, naturalmente, a candidata do PT. Ela teria que ser construída e ele se convenceu de que Dilma encarnaria bem aquilo de que necessitava. Olhando as pesquisas, vendo as reações das pessoas nas ruas, ouvindo seus interlocutores, escolheu quem poderia representar, maximamente, a continuidade.

Tomada a decisão, Lula passou a agir. Primeiro, acabou com as veleidades de quem se julgava no direito de opinar. Depois, subiu no palanque, para torná-la fato consumado. Em menos de seis meses, sua obra começou a dar frutos.

De tímidos 5% a 6% nas pesquisas de 2008, Dilma cresceu e alcança, nas mais recentes, 20% ou mais, de acordo com os cenários. Nas últimas semanas, seu crescimento se intensificou.

E agora? Todos desejamos que ela se recupere rapidamente e reaja bem ao tratamento. Mas os políticos estão inquietos. Os projetos de muitos partidos e das várias forças que orbitam o governo passaram a depender de fatores que ninguém controla.

O inesperado entrou em campo e o jogo ficou incerto. É inútil que Lula queira que seus correligionários e aliados façam de conta que o panorama não mudou. A falta de um ¿plano B¿ incomoda até os mais fiéis.

Enquanto isso, nas oposições, acontece o inverso, para tristeza de alguns. Ao contrário de ter se resolvido, a dúvida entre Serra e Aécio permanece. Parece que existem os que acham problema que o PSDB continue a ter seus planos A e B. Chegou-se, semana passada, até a inventar que Aécio havia desistido.

Desde o ano passado, duas teses conflitam no partido, a da ¿escolha já¿ e a da ¿vamos deixar para mais adiante¿. Os argumentos em favor da primeira não são desprezíveis, mas seus problemas são também relevantes. Basta olhar para o lado do governo para ver o que pode acontecer com quem define cedo, talvez demais, como pretende ir para uma eleição.

Na verdade, de pouco adianta tentar acelerar o processo político. As expectativas mais sólidas costumam desmanchar e o imprevisível acontece.

Se não fosse assim, a política seria uma ciência exata e não uma arte. Inclusive de saber a hora das coisas.