Título: Candidata pode até exercer mandato da prisão
Autor: Brígido, Carolina ; Lamego, Cláudia
Fonte: O Globo, 30/08/2008, O País, p. 8

Campanha de Carminha não ficará proibida; especialistas pedem agilidade da Justiça e responsabilidade dos partidos

Carolina Brígido e Cláudia Lamego

BRASÍLIA e RIO. Mesmo presa por suspeita de ligação com as milícias, a candidata a vereadora Carminha Jerominho (PTdoB) poderá continuar fazendo campanha no horário gratuito de rádio e TV. E, se ganhar as eleições, poderá exercer o mandato de dentro da prisão. A situação é inusitada, mas está garantida em lei. No Brasil, uma pessoa só perde os direitos políticos - e, com isso, não pode mais votar ou ser votada - se for condenada por sentença transitada em julgado. Isso significa que, se a condenação for em primeira instância, o réu permanece com seus direitos políticos até que possa recorrer judicialmente da sentença.

No caso de Carminha, ela nem sequer foi condenada pela primeira instância. É tratada apenas como suspeita de ter cometido crime eleitoral. Ministros do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) não quiseram comentar a situação para não correrem o risco de antecipar a opinião em um caso que pode chegar ao tribunal. O advogado José Eduardo Alckmin, ex-ministro da Corte e especialista em legislação eleitoral, explicou que Carminha está amparada pela lei:

- Ela não está privada dos direitos políticos, porque é tratada apenas como suspeita. Enquanto não houver trânsito em julgado, ela pode continuar na campanha e depois, se ganhar as eleições, exercer o mandato. Inclusive se ainda estiver presa.

Alckmin acrescentou que, se os aliados de Carminha estiverem atuando em nome dela ao ameaçar eleitores com retaliações caso não votem na candidata, ela poderá ser condenada a ficar de fora da disputa:

- O que tem que verificar é se as pessoas que a apóiam estão maculando a liberdade do voto. Isso levaria à cassação do registro dela.

O advogado fez um apelo para que juízes do país dêem prioridade ao julgamento de candidatos que respondem a processos para que a situação já esteja resolvida na data da posse. E alertou para a possibilidade desses réus entrarem com recursos na Justiça apenas para protelar a condenação definitiva.

- Às vezes, há recursos protelatórios. Os tribunais têm que abrir o olho e dar prioridade para esse tipo de caso - disse.

Advogado propõe mudanças em lei

O advogado Alberto Rollo, especialista em direito eleitoral, defende que o Congresso Nacional faça mudanças na lei, para que pessoas que tenham sido condenadas por um colegiado (por exemplo, tribunais eleitorais e de justiça), fiquem inelegíveis. Sobre o caso da candidata no Rio, ele diz que "temos que agüentar a lei como ela é".

- Proponho um aperfeiçoamento da lei. Mas, infelizmente, no caso dela, nada há a ser feito. Alguma coisa você tem que pagar pela democracia. Se amanhã o Ministério Público fizer uma denúncia e ela ficar inelegível, isso é a Lei 5/70, dos tempos da ditadura.

Rollo, no entanto, disse que é preciso cobrar também do partido da candidata a responsabilidade pela filiação e, após as denúncias, pela permanência dela na legenda.

- Se o partido a expulsasse, ela não teria mais como concorrer - disse Rollo.

O cientista político Fábio Wanderley Reis, da UFMG, criticou a ausência do Estado nas comunidades carentes, o que permite a existência de currais eleitorais como o da milícia supostamente comandada pelos Jerominho no Rio.

- Isso é inaceitável, é algo que sugere falência do Estado. É desordem - disse o professor, cobrando também maior agilidade da Justiça.