Título: Supremo dá apoio total a Gilmar
Autor: Brígido, Carolina
Fonte: O Globo, 01/09/2008, O País, p. 03

BRASÍLIA. A notícia de que o presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Gilmar Mendes, foi alvo de escutas clandestinas foi capaz de unir num só time os onze ministros da Corte. Durante o fim de semana, Gilmar falou ao telefone com quase todos e ouviu declarações de apoio integral. Hoje, Gilmar tem uma audiência marcada para as 9h com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva no Palácio do Planalto para cobrar providências no sentido de coibir os grampos ilegais. Ele vai acompanhado dos ministros Cezar Peluso, vice-presidente do STF, e Carlos Ayres Britto, que também preside o Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Gilmar chegou a cancelar viagem oficial à Coréia do Sul para tentar resolver a crise. Nos últimos dois dias, conseguiu convencer todos os colegas a participar de uma reunião interna, hoje à tarde. Serão debatidos os resultados da conversa com Lula. Se considerarem necessário, os ministros poderão redigir uma nota de desagravo da instituição.

O teor do grampo, confirmado por Gilmar, foi publicado na última edição da revista "Veja". O diálogo era com o senador Demóstenes Torres (DEM-GO), que diz ao ministro considerar absurda a hipótese do impeachment do presidente do STF, cogitada por setores da oposição após o habeas corpus que libertou o banqueiro Daniel Dantas.

A divulgação dos grampos acabou fortalecendo Gilmar - pelo menos entre os ministros do STF. Em julho, ele ficou na berlinda ao libertar boa parte dos presos pela Polícia Federal na Operação Satiagraha. Além de Dantas, foram beneficiados o ex-prefeito de São Paulo Celso Pitta e o investidor Naji Nahas. O presidente do STF teria sido alvo de grampos neste período.

Ayres Britto, por exemplo, que não costumava dar declarações sobre "estado policialesco", como Gilmar, disse ao presidente do STF que considerava o fato grave e aceitou o convite para acompanhá-lo ao Planalto:

- Agora, essa preocupação se tornou mais séria, porque percebi que aquela clandestinidade de escutas telefônicas sinaliza total descontrole por parte dos próprios escalões superiores de órgãos como a PF e a Abin.

O ministro Marco Aurélio Mello, que costuma demonstrar indignação com notícias de escutas clandestinas, vê com bons olhos a divulgação do teor da conversa de Gilmar. Para ele, é uma oportunidade para as autoridades tomarem alguma atitude:

- No Brasil, às vezes as coisas têm que chegar a um extremo para se buscar correção de rumos. Tudo é muito lastimável e confirma que estamos vivenciando uma época de perda de parâmetros, abandono de princípios. O que não podemos é ficar apáticos.

"Que ele (Lula) atue com punhos de aço e luvas de pelica"

Marco Aurélio lembrou que, como Gilmar tem direito a foro especial, apenas o STF teria a prerrogativa de ordenar escutas em seus telefones. Portanto, não haveria dúvida de que o grampo divulgado é ilegal.

Ayres Britto lembrou que a Abin não tem poderes para fazer investigação criminal:

- A minha preocupação é tanto maior quando se sabe que a Abin não é polícia judiciária e, portanto, não pode fazer investigação criminal. Nem por ordem judicial ela poderia interceptar comunicações telefônicas.

Marco Aurélio reafirmou o apoio do STF na cruzada contra os grampos ilegais. E defendeu que Lula atue energicamente para coibir os grampos:

- O responsável maior pela administração do Executivo é o presidente da República. Que ele atue com punhos de aço e luvas de pelica.