Título: De muitas ações, restou apenas o marketing
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Fonte: O Globo, 03/09/2008, Economia, p. 23

EXPLORANDO O PETRÓLEO: Biodiesel da mamona foi outro projeto que não vingou. ANP condena uso sem aditivos

Auto-suficiência, parcerias com setor privado, presídios e até o Fome Zero deram resultado aquém do esperado

BRASÍLIA. A mobilização no Espírito Santo para anunciar o início da produção na camada do pré-sal no campo de Jubarte - mais raso e ralo que as demais reservas anunciadas pela Petrobras na Bacia de Santos - não foi a primeira ação em que o governo aposta no marketing para superdimensionar feitos e propostas cujos resultados reais são bem aquém do prometido. Nos últimos anos, não faltaram episódios semelhantes. Um dos mais evidentes foi a campanha de anúncio da auto-suficiência na produção do petróleo, em abril de 2006.

Cuidadosamente criada para a comunicação acontecer no dia 21 de abril - feriado de Tiradentes, um dos mártires da Independência, e véspera do descobrimento do Brasil --, a campanha custou oficialmente R$36 milhões e foi desenvolvida por, além de F/Nazca e Quê, a Duda Propaganda, do publicitário Duda Mendonça. Na solenidade, Lula sujou as mãos com óleo, exatamente como fez Getúlio Vargas. No mercado, no entanto, as estimativas são de que o investimento tenha chegado a R$100 milhões na campanha.

Dois anos depois, o Brasil aumentou sua produção, mas continua importando petróleo. Entre janeiro e agosto deste ano, o déficit na balança do petróleo aumentou de US$2,38 bilhões, no mesmo período de 2007, para US$5,44 bilhões. As refinarias brasileiras, construídas na década de 70, foram feitas para processar petróleo leve e a maior parte do petróleo nacional é pesado, o que torna a importação obrigatória.

Presídios federais estão vazios por falta de agentes

Outros projetos do governo também mereceram destaque em seu lançamento, mas se perderam no caminho. É o caso das Parcerias Público-Privadas (PPP), sancionadas no dia 30 de dezembro de 2004 e alardeadas ao longo daquele ano como a solução para a infra-estrutura. Na época, o governo escolheu 20 projetos de rodovias, ferrovias, portos e irrigação, num total de R$13,067 bilhões, que seriam financiados por empresas, bancos federais e fundos de pensão. Nenhum saiu do papel até hoje.

Também naufragou em seu marketing o biodiesel feito de mamona. Em fevereiro de 2006, o presidente Lula, em discurso ufanista, afirmou que apostou um pouco de sua vida no programa, que o Brasil é uma alternativa ao mundo na área energética. A mamona, a partir da agricultura familiar, era apontada como o motor desta estratégia. Porém, em agosto último, a Agência Nacional do Petróleo (ANP) atestara que o óleo, muito viscoso e com risco de entupir os bicos injetores dos motores, precisará de aditivos para ser viável.

Um dos carros-chefe da primeira campanha eleitoral de Lula, o Primeiro Emprego, anunciado em 30 de junho de 2003, ao som da banda mirim do Olodum, nunca alcançou suas metas, a ponto de ser rebatizado como Programa Nacional de Inclusão de Jovens (Projovem) em 2007. Gastou mais de R$10 milhões em publicidade e gestão, tendo produzido em quatro anos e meio pouco mais de nove mil vagas para jovens.

Desde 2003, segundo o Sistema Integrado de Administração Financeira (Siafi), foram gastos R$4,7 milhões em publicidade do programa - quase um terço da verba total do Ministério do Trabalho para este fim - e outros R$5,4 milhões com a gestão do Primeiro Emprego.

Prometidos desde 2003, os cinco presídios federais também não vingaram. A construção de unidades em Mossoró (Rio Grande do Norte) e Porto Velho (Rondônia) - para remanejar chefes de organizações criminosas do país - já consumiu R$50 milhões. As prisões estão prontas, mas sem a contratação - ainda não autorizada - de agentes penitenciários, não podem ser inauguradas.

Fome Zero teve até Gisele Bündchen, Kaká e Bono

Outro projeto emblemático foi o Fome Zero, em janeiro de 2003. A cerimônia contou com 500 pessoas, entre as quais 17 governadores. Na época, o presidente Lula anunciou que iria abrir duas contas bancárias para receber doações e também criaria um site para arrecadar donativos. A campanha contou com celebridades como a modelo Gisele Bündchen, o jogador de futebol Kaká e os astros Lenny Kravitz e Bono. Com o tempo, o governo deu prioridade ao Bolsa Família.