Título: Arapongas: aparelho só faz escuta ambiental
Autor: Franco, Bernardo Mello
Fonte: O Globo, 04/09/2008, O País, p. 5

BRASÍLIA. Em depoimentos na CPI do Grampo, dois altos funcionários da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) disseram ontem que o equipamento eletrônico comprado pela agência pode fazer escutas ambientais se o alvo estiver a, no máximo, cem metros de distância do aparelho. Eles negaram, porém, que seja possível fazer escutas telefônicas.

O diretor do Centro de Pesquisa e Desenvolvimento para a Segurança das Comunicações da Abin, Otávio Carlos Cunha da Silva, disse que o aparelho só pode ser usado para captar conversas transmitidas por microfones ou outros equipamentos de escuta ambiental. É diferente, portanto, da maleta que a Polícia Federal utiliza para grampear conversas de celulares:

- O conteúdo da comunicação é impossível de ser inteligível. Esse equipamento não seria capaz de fazer interceptação de celular. Só escuta ambiental. O máximo que vai conseguir é saber que, no ambiente, há vários celulares transmitindo ondas.

Afastado da Abin na segunda-feira, o ex-diretor-adjunto José Milton Campana admitiu que o órgão comprou o equipamento de varredura telefônica.

- Pelo que eu ouvi preliminarmente, me parece que, na distância de cem metros, com terreno limpo, poderia acontecer alguma coisa em termos de escutas - disse ele.

Otávio Silva disse que as maletas usadas para grampear celulares são do modelo 007 e passam despercebidas por ambientes públicos. Já o aparelho comprado pela Abin, o Oscor 5000, pesa 13 quilos e, segundo ele, não pode ser transportado com tanta facilidade.

Otávio esclareceu que, na escuta ambiental, o rastreador detecta a presença de um microfone no ambiente e consegue ouvir o que ele está gravando, mas no máximo cem metros de distância. Ou seja, não seria possível captar, por um microfone ambiente, uma conversa feita pelo celular. No caso do presidente do STF, Gilmar Mendes, a informação é que ele estava no Planalto quando sua conversa com um senador foi gravada. E a ligação foi transferida para o celular de Gilmar pela secretária dele, que estava no STF.

Antes mesmo de vir a público a denúncia de que a Abin teria feito escuta ilegal nos telefones do presidente do STF, a CPI dos Grampos tentou obter do órgão a confirmação se seus agentes faziam tais operações. Ouvido em fevereiro deste ano, Otávio Silva preferiu lavar as mãos.

- A Abin faz interceptação? - indagou o relator Nelson Pellegrino.

- Eu trouxe aqui um ofício, até porque, como técnico, a gente tem que tomar muito cuidado para não falar alguma coisa que não é adequada - respondeu o diretor.

E começou a ler o ofício em que o ex-diretor da Abin Paulo Lacerda atestava: como não tem competência legal para fazer grampo, a Abin não mandou nenhum pedido à Justiça para autorizar tal procedimento.

- Eu, como pesquisador e na minha área, não teria a menor condição, em função da compartimentação que existe dentro de um órgão de inteligência, de dizer se a Abin faz a interceptação, porque, na minha área, o meu trabalho é segurança e não ataque. Então, acredito, firmemente, que as palavras do diretor traduzem a verdade - limitou-se a dizer Otávio Silva.