Título: Saem os juros, entra o pré-sal
Autor: Duarte, Patrícia; Paul, Gustavo
Fonte: O Globo, 04/09/2008, Economia, p. 23

O governo estuda livrar a Petrobras da obrigação de contribuir para a formação dos superávits primário (economia do governo antes do pagamento de juros da dívida) e nominal. A equipe econômica entende que é o melhor a ser feito, ainda mais com as perspectivas bilionárias das reservas dos megacampos, que demandarão bilhões de dólares de investimentos. A discussão faz parte das mudanças no cálculo das contas públicas, anunciadas recentemente pelo Ministério da Fazenda. Mais do que adequar as contas às normas internacionais, as mudanças visam a aumentar a capacidade de investimentos da Petrobras na exploração do petróleo da camada do pré-sal.

Sem essa amarra, a estatal poderia aumentar sua capacidade de investimentos em pelo menos mais de R$10 bilhões ao ano, numa conta simples. Esse montante é quase um terço superior ao previsto nos planos de investimentos da Petrobras, que somam US$112,4 bilhões entre 2008 e 2012 - ou US$22,48 bilhões ao ano, em média. Em outubro, a empresa deverá anunciar um novo plano, já contemplando o pré-sal.

Em 2007, segundo o Banco Central (BC), as estatais federais contribuíram com R$11,9 bilhões para o superávit primário do governo, que foi de R$101,606 bilhões. Dessa parcela, aproximadamente 90% - ou R$10,7 bilhões - vieram do caixa da petrolífera. A Petrobras, portanto, respondeu por cerca de 10,5% do superávit do governo. Em 2008, a contribuição da empresa deve chegar a R$12 bilhões.

Um importante integrante da equipe econômica afirmou ao GLOBO que a descoberta do petróleo no pré-sal serve como estímulo para aumentar a liberdade de a Petrobras investir. Isso significa que a nova metodologia - cujo ponto forte é passar a considerar o superávit nominal (receitas menos despesas, incluindo o pagamento de juros), não mais o primário - vai além do argumento oficial de se adequar às normas internacionais.

- É importante para a empresa neste momento de novas descobertas - disse a fonte.

Investimento pode ser problema para as contas

A empresa tem a mesma opinião. A proposta de aumento de capital da estatal, feita à comissão interministerial que estuda as novas regras do petróleo, defende a mudança na contabilidade. A estatal deixaria de contribuir com o superávit primário para ser incorporada às contas públicas como patrimônio da União. O aumento de capital, com injeção de recursos no caixa da estatal, reduz o endividamento da empresa.

- Ficará difícil, com a necessidade de crescimento dos investimentos, acumular caixa para atender ao governo no futuro - diz uma fonte com trânsito na diretoria da Petrobras.

A incorporação da empresa ao patrimônio da União também reduz a proporção da dívida líquida do governo, melhorando o desempenho das contas nacionais. Além disso, a contabilidade atual é considerada "ingrata e distorcida", pois coloca o caixa da estatal como se este estivesse à disposição do governo. Submetidos atualmente à lógica do orçamento federal, os investimentos da Petrobras são considerados despesas de recursos públicos. Levando-se em conta o grande volume de recursos para o pré-sal, isso poderia se transformar em um problema para as contas públicas.

Hoje, com União, estados e municípios, as estatais federais, estaduais e municipais entram no cálculo dos resultados primários e nominais do país. Em 2007, o superávit primário representou 3,97% do PIB.

Ainda não se sabe o exato tamanho das reservas do pré-sal, mas especialistas estimam de 50 bilhões a 70 bilhões de barris, o que representa cinco vezes as reservas atuais.

- Se a Petrobras sair do superávit, será uma boa notícia. Ela dependeria menos do governo para investir - afirmou o analista Luiz Otávio Broad, da corretora Ágora.

Para explorar tanto petróleo, em profundidade jamais alcançada, calcula-se que serão necessários investimentos de mais de US$500 bilhões no período de concessão.

Alguns especialistas não acreditam que a retirada da Petrobras na formação dos superávits irá ajudá-la a investir mais. Para o analista de petróleo da corretora Unibanco, Vladimir Pinto, a estatal já tem espaço suficiente para ampliar seus investimentos e seu endividamento:

- Dá para imaginar a Petrobras com planos de investimentos de até US$200 bilhões em cinco anos.