Título: Não tem nem para remédio
Autor: Magalhães, Luiz Ernesto
Fonte: O Globo, 05/09/2008, O País, p. 3

O programa Remédio em Casa está paralisado, mas é citado pela candidata a prefeita Solange Amaral (DEM) no horário eleitoral como um bom exemplo de projeto na área de saúde da administração do prefeito Cesar Maia. A Secretaria municipal de Saúde admitiu ontem que a remessa das caixas com medicamentos para tratamento de diabetes e hipertensão está suspensa desde o início de agosto. A previsão é que o serviço, que atende 400 mil pessoas, seja retomado em outubro, com a conclusão de uma licitação.

O caso é um exemplo de como os candidatos usam o horário eleitoral para prometer o céu e mostrar realizações que não são bem assim. A disputa deve se acirrar ainda mais a partir de hoje, a exatamente um mês para as eleições.

Segundo a prefeitura, a suspensão ocorreu porque a antiga prestadora do serviço falhava na entrega das encomendas. Por isso, o contrato foi suspenso e aberta uma nova licitação. Os pacientes estão sendo orientados a buscar os remédios nos postos onde se cadastraram no programa. O problema, porém, se arrasta há bem mais tempo do que o que foi informado.

Na Zona Oeste, funcionários de postos de saúde, sem saber que falavam com um repórter do GLOBO, disseram ontem que em algumas unidades as falhas já duram cerca de um ano. São os casos dos postos Flávio do Couto Vieira (Anchieta) e Hamilton Land (Cidade de Deus). No Posto de Saúde da Família Carlos Cruz Lima (Colégio), a unidade decidiu suspender o cadastro de novos pacientes.

Moradora recebe, mas família não

A entrega irregular afeta boa parte dos moradores da Vila Porto Velho, em Cordovil, inscrita no programa. É lá que mora a aposentada Wanda Silva, de 66 anos, que sofre de hipertensão e apareceu no horário eleitoral do DEM, falando bem do projeto e exibindo a caixa cheia de remédios, logo após a apresentação de imagens que mostram a chegada de um carteiro a um local não identificado com a remessa. Ontem, Wanda voltou a elogiar a iniciativa da prefeitura e defende que o programa tenha continuidade. Mas reclama que as falhas de entrega a levem a ter despesas extras com o tratamento médico. Ou apelar para a solidariedade: é hábito entre os vizinhos pedirem comprimidos emprestados. As cartelas são devolvidas quando finalmente a encomenda chega.

- Fiquei sem o remédio durante dois meses logo depois de uma greve dos Correios. Recebi minha remessa, mas meu irmão e minha cunhada ainda não receberam. A gente até tenta pegar no posto, mas nem sempre tem todos os remédios - disse.

A assessoria de Solange alegou que o objetivo do programa, o primeiro em que a candidata tratou da saúde - tema que vem sendo explorado intensamente pelos adversários - foi destacar a importância do projeto.

A cem metros da casa de Wanda, vivem três pessoas de uma mesma família inscritas no programa. Vítima de um derrame há nove anos que a faz se locomover em cadeira de rodas, a aposentada Maria Aparecida Borges, de 66 anos, disse que há um ano não recebe os remédios para hipertensão. Já sua mãe, Araci da Silva de 83, está há dois meses sem receber os seus.

- A gente vai ao posto de saúde e ninguém sabe quando a entrega será normalizada. Acho que é por ser ano de eleição - disse Maria.

Marido de Wanda, o funcionário público aposentado Luiz Carlos Pinhais da Silva disse ter esperança que a entrega dos remédios seja normalizada um dia. E que um candidato a vereador que, no sábado pagou a colocação de um portão na entrada da comunidade, cumpra a promessa de asfaltar as ruas se for eleito.

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