Título: Transparência ou morte
Autor: Terra, Rodrigo
Fonte: O Globo, 06/09/2008, Opinião, p. 7

Uma das maiores conquistas das democracias modernas, a transparência permite o diálogo institucional entre o cidadão e os seus representantes, dotando-o do conhecimento da forma de condução dos negócios de Estado para que, assim, possa exigir o respeito às suas prerrogativas individuais e coletivas fundamentais: saber é poder.

Recentemente, o Conselho Nacional do Ministério Público, órgão ao qual a Reforma do Judiciário incumbiu o controle externo do Ministério Público nacional, determinou que o MPRJ passasse a dotar de transparência os seus procedimentos institucionais, anulando, inclusive, a sessão em que, a portas fechadas e sem registro oficial dos motivos, resultou na rejeição do nome desse membro do MPRJ para exercer a função de supervisor dos promotores recém-aprovados para ingresso na instituição.

Com a repetição do ato, a atual Administração foi obrigada a publicar os motivos da rejeição, para que qualquer um pudesse avaliar se os fatos atribuídos ao rejeitado fossem suficientemente graves para impedir a sua nomeação, verificando, assim, se o ato ultrapassou os limites da legalidade para se transformar em expressão do arbítrio incompatível com o estado democrático de direito. Em suma, sem o conhecimento, teria sido impossível a contestação dos motivos da rejeição.

Eles tiveram a ver com a matéria publicada pelo jornal O GLOBO há menos de dois anos, acerca da má qualidade do café Cordeiro, vendido neste estado, apesar de misturado a pó de vidro e areia, como comprovado por diversos autos de infração lavrados pela Secretaria de Estado de Saúde por ocasião da interdição de lotes do produto. Só que, como a bebida era também servida nas dependências do MPRJ, discutir a regularidade da licitação para a aquisição do café era nada mais que natural.

Só que, para a atual Administração do MPRJ, como agora revelou, a comunicação à coletividade de que o produto era impróprio para o consumo, questão de saúde pública, passou a corresponder a "expor negativamente a instituição", como se o próprio órgão fiscal não tivesse de ser o primeiro a ter interesse em suspender o consumo da bebida em suas dependências e corrigir a irregularidade da licitação respectiva. Para alguns, porém, classificar a divulgação do caso de "exposição negativa da instituição" transforma em favor a transparência da gestão que deve promover o bem comum.

Na prática, pelo menos, quem deixou de perder foi o contribuinte. Depois de se refestelar com a motivação capenga, o próprio procurador-geral de Justiça se apressou em convencer o CNMP de que já não havia razão para puni-lo pelas "irregularidades na licitação para a aquisição de café", pois, com a repercussão do caso, resolveu desenvolver "ações" quanto à contratação de produtos e serviços pelo MPRJ que "geraram, somente no exercício de 2007, uma economia aos cofres públicos de R$14.960.000".