Título: Urbanização de favelas do Rio na fila do BID
Autor: Paul, Gustavo; Oliveira, Eliane
Fonte: O Globo, 07/09/2008, Economia, p. 42

BRASÍLIA. O crescimento econômico brasileiro está gerando um fato inusitado para a relação do Brasil com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). Este ano, o volume de projetos aprovados pelo governo brasileiro já ultrapassa o montante que o país tem direito a receber do banco. Já foram aprovados US$3,035 bilhões em projetos e outros US$2,2 bilhões estão prontos para receber o sinal verde nos próximos meses. No entanto, o BID só tem US$2,5 bilhões para emprestar ao Brasil. Com isso, vários projetos podem ficar na fila, como a urbanização de favelas no Rio e a despoluição do Rio Tietê, em São Paulo.

A postergação de investimentos importantes preocupa o governo. Segundo o secretário de Assuntos Internacionais do Ministério do Planejamento, Alexandre Meira Rosa, é séria a limitação do financiamento para o Brasil.

- Estamos crescendo e precisamos de condições de investimentos e eles (o BID) não conseguem nos acompanhar. Nós preparamos bem os projetos e fazemos isso rápido. Mas, nesse ritmo, teremos de transferir programas para os próximos anos - afirmou.

Em marcha, uma mudança combinada com os vizinhos

O governo brasileiro está se articulando com Argentina, México e Colômbia, para mudar a política de desembolso do BID. A idéia é pressionar para o aumento do volume de recursos, sem precisar levar à expansão do aporte de capital no banco. Os países defendem que o BID seja mais arrojado e amplie o limite de financiamento. Uma das sugestões é usar o capital de garantia depositado pelos países que recentemente tornaram-se grau de investimento, como México, Brasil e Chile.

- Há muito dinheiro parado no BID, mas a instituição é muito conservadora e teme se alavancar mais. É preciso uma gestão mais agressiva - disse Meira Rosa.

O vice-presidente do BID Otaviano Canuto afirmou que o organismo deve aprovar este ano mais de US$10 bilhões em empréstimos aos países. Segundo ele, o montante é "adequado para o tamanho do BID", não apenas em termos de capital, mas também de tamanho de staff do banco.

Para atender à crescente demanda, Canuto disse que vários caminhos estão sendo seguidos: a ampliação do co-financiamento de projetos com outras agências de fomento, como o BNDES, a Corporação Andina de Fomento (CAF) e o JBIC, do Japão; a seleção de projetos claramente com impacto de desenvolvimento; e a adoção do critério de adicionalidade, ou seja, cobrindo a lacuna onde não existe oportunidade ou interesse de financiamento por parte do mercado.

A liberação dos recursos, explicou, são proporcionais, de país para país. O Brasil hoje tem 45% da carteira do banco. O BID, acrescentou, funciona como uma cooperativa e o uso do orçamento respeita a proporcionalidade de cada cliente. Os tomadores, disse Canuto, são tratados de acordo com suas necessidades.

- Buscamos atender projetos para áreas mais carentes - ressaltou.

O Banco Mundial (Bird) também está de olho nesse problema. A direção do banco já estuda uma mudança na composição dos empréstimos, aumentando a dotação para os países emergentes. Atualmente, qualquer país, do Timor Leste a China e Brasil, tem o teto de US$14,5 bilhões para empréstimo. O Brasil já está com um estoque de US$11 bilhões, aproximando-se desse limite.

Segundo o representante do Bird no país, John Briscoe, a idéia é flexibilizar esse teto para quem tem mais capacidade de alavancagem, podendo chegar a US$100 bilhões. É o caso de Brasil, China e Índia, por exemplo.

-As discussões são lentas, mas em até dois anos deve ser aprovada essa mudança. Será uma combinação feliz para todos - disse Briscoe.

São os países mais pobres, principalmente do Caribe e da América Central, os mais refratários ao movimento dos emergentes do continente. Eles temem que falte recursos para eles. Sobre a articulação entre Brasil e outros países sul-americanos para que o BID aumente sua oferta, Canuto observou que a solidez financeira é um elemento importante para que a instituição responda em situações emergenciais:

- Devemos aproveitar o momento de prosperidade dos clientes para construir e sustentar a solidez financeira do banco.

Banco diz que está ampliando atuação

Para a instituição, o aumento da demanda do país por crédito externo é natural, considerando o crescimento econômico dos últimos anos, o que alavanca os investimentos. O BID enfatizou que a família de projetos da instituição no Brasil continua avançando, com cooperações inovadoras, e programas como o Procidades, direcionado ao desenvolvimento urbano integrado.

"Pensando nisso, o BID está ampliando suas áreas de atuação e diversificando os tipos de mutuários atendidos, como entes subnacionais, setor privado e organizações da Sociedade Civil. O BID, em seus 50 anos de existência, pôde acumular grande expertise em execução de programas no setor público, e esse conhecimento tem sido amplamente aproveitado no Brasil em áreas como desenvolvimento urbano e fortalecimento do Estado, entre outros", diz o BID, em nota.