Título: Lei brasileira é exemplo de modernidade
Autor: Sampaio, Nadja; Casemiro, Luciana
Fonte: O Globo, 10/09/2008, Economia, p. 30

Código chega à maioridade como uma legislação avançada e ainda servindo de inspiração a vários países

Nadja Sampaio e Luciana Casemiro

A lei 8.078, mais conhecida como o Código de Defesa do Consumidor (CDC), que foi promulgada no dia 11 de setembro de 1990, chega à maioridade como uma das leis mais modernas do mundo. Ela serviu de exemplo para várias outras leis e, em alguns pontos, é mais avançada do que a legislação da União Européia e do Canadá. No I Seminário Internacional de Direito do Consumidor, promovido pelo Instituto dos Advogados do Brasil (IAB), que está sendo realizado esta semana, especialistas afirmaram que, além das diferenças nas legislações, a própria prática de cumprimento se encontra em níveis diferentes pelos países.

No âmbito do Mercosul, o Brasil, segundo os especialistas, tem a legislação mais moderna e completa, inclusive no que diz respeito às sanções por descumprimento (há previsão inclusive de enquadramento criminal). O país foi o primeiro a adotar uma legislação específica na defesa dos direitos do consumidor na região e foi a inspiração para as leis adotadas em Argentina, Paraguai, Peru, Colômbia e República Dominicana.

Bruno Miragem, vice-presidente do Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor (Brasilcon), afirma que a lei brasileira tem, como principal qualidade, o fato de estar construída sobre direitos gerais, o que torna o Código sempre atual:

- Nossa lei foi copiada também por Cabo Verde e Angola. E ainda é mais avançada do que as da União Européia no que tange a serviços, pois as leis européias estão mais voltadas a produtos.

Tratado tentará diminuir desigualdades nos países

Há cerca de uma década se discute uma legislação comum para a defesa dos consumidores do Mercosul. Em 2000, os presidentes de Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai chegaram a assinar uma carta de intenções, mas que não foi para a frente. No entanto, esse projeto começa a tomar um caminho diferente. Para tentar combater um tratamento desigual de consumidores da região, a professora Cláudia Lima Marques está desenvolvendo, junto com o Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor (DPDC), do Ministério da Justiça, o Tratado Internacional de Proteção dos Consumidores das América (Cidip VII):

- As perspectivas são muito boas, pois propomos a aplicação da lei mais favorável ao consumidor, seja ela a do país do fornecedor ou a do país de domicílio dos consumidores. Se o comércio hoje é internacional, o direito do consumidor também terá que ser. Contamos com o apoio de outros nove países latino-americanos nessa empreitada.

O espanhol Guilherme Orozco Pardo, da Universidade de Granada, também defende a aplicação da lei mais favorável ao consumidor:

- Os estados deveriam impor o princípio da reciprocidade. Não deve haver respostas locais a problemas globais.

A idéia, no início, diz Gabriel Stiglitz, representante da Argentina, era criar diretivas como na Europa:

- A Argentina avançou nos últimos anos nas ferramentas judiciais, como as ações coletivas, mas está a léguas do Brasil. Paraguai e Uruguai estão mais atrás ainda. Em nenhum desses países há estruturas como os Procons, o Ministério Público. O Brasil é um exemplo.

Para Geraint Howells, escritor e professor de direito da Universidade de Lancaster, no Reino Unido, em tempos de economia globalizada será difícil manter o padrão de cada país:

- As leis precisam ser simples, apenas manter o contrato vivo.

Dimitri Yanin, presidente da Confederação de Sociedades de Consumo da Rússia, explica que a entidade reúne 42 membros regionais:

- Nosso ideal é colocar a legislação Russa no mesmo patamar da lei americana, mas até os anos 80 lutávamos para conseguir comprar algo, pois as filas eram enormes. Hoje, as leis russas já sofreram mudanças, e conseguimos melhorar a proteção ao consumidor. Nossas leis foram copiadas por vários países da ex-União Soviética.

Entre as leis russas uma é de dar inveja aos brasileiros: lá, eles podem trocar um automóvel, computador ou barco, por causa de qualquer defeito, em até 15 dias de uso, sem ter de levar o produto à autorizada para conserto, como acontece no Brasil.

A brasileira Patrícia Galindo, que fez mestrado em Quebec sobre as leis de direitos do consumidor, explica que o estado canadense começou a pensar no tema em 1906, mas somente em 1965 foi declarado que o consumidor é a parte mais fraca:

- Apesar de pioneira, a lei do Quebec acabou ficando engessada, pois traz muitas especificidades. Ainda hoje discute-se se é melhor ter uma lei intervencionista ou não. Lá, também não são previstas as ações coletivas nem há Ministério Público.