Título: Na contramão do mundo
Autor: Frisch, Felipe
Fonte: O Globo, 09/09/2008, Economia, p. 23

O mercado de ações brasileiro ficou na contramão do resto do mundo no primeiro pregão após o anúncio da intervenção do governo americano nas gigantes hipotecárias Fannie Mae e Freddie Mac. Enquanto as bolsas européias e dos Estados Unidos tiveram altas superiores a 2%, a Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa) encerrou em queda de 2,35%, aos 50.717 pontos, menor pontuação desde 15 de maio de 2007. Os mais otimistas bem que tentaram: pela manhã, o Ibovespa chegou a subir 3,40%, acompanhando o bom humor externo. Mas, às 13h, o índice já estava negativo e assim ficou o resto do dia. O dólar acompanhou o mau humor e fechou em alta de 0,87%, a R$1,735, na maior cotação desde 1º de abril.

Em Wall Street, o índice Dow Jones subiu 2,59% e o S&P 500, 2,05%. O Nasdaq subiu um modesto 0,62%. As ações de Fannie Mae e Freddie Mac despencaram 89,63% e 82,75%, respectivamente, e hoje não valem um dólar. Em Londres, apesar de uma falha eletrônica que paralisou as negociações, a alta foi de 3,92%. As bolsas de Paris e Frankfurt subiram 3,42% e 2,22%, respectivamente. Na Ásia, as altas também prevaleceram. A exceção foi Xangai, que caiu 2,68%. O Nikkei, de Tóquio, subiu 3,38%, e a Bolsa de Cingapura, 4,77%.

Diante de tanto otimismo no exterior, ficou difícil explicar a queda no Brasil. Segundo o economista-chefe da corretora Ágora, Álvaro Bandeira, a alta da Bovespa foi revertida, mais uma vez, pela queda das commodities (matérias-primas, como petróleo, aço e minério de ferro).

O barril do petróleo tipo leve americano fechou em alta de 0,1%, para US$106,34, devido à proximidade do furacão Ike do Golfo do México. Já o tipo Brent recuou 0,62%, para US$103,44, apesar das especulações de que a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) poderá determinar uma redução na produção do cartel esta semana, em reunião em Viena.

As ações preferenciais (PN, sem direito a voto) da Petrobras despencaram 5,02%, para R$30,26, a menor cotação desde 4 de outubro de 2007. Já as da Vale perderam 3,46% do valor e fecharam o dia valendo R$34,85, menor cotação desde 24 de maio de 2007. Juntas, as ações das duas empresas têm peso de 34% no Ibovespa, principal indicador da Bolsa. No ano, o índice acumula queda de 20,61%. A matérias-primas metálicas chegaram a se recuperar durante o dia, mas não o suficiente para mudar o humor dos investidores.

Para Patricia Branco, sócia-gestora da Global Equity, o problema é que o pacote anunciado pelo governo americano só fortalece o setor financeiro, não a economia toda. Assim, a tendência dos preços das matérias-primas é cair.

- A possibilidade de recessão continua. Como o Brasil tem muitas ações de empresas que negociam commodities no índice, sofre mais - disse Patricia. - Até a hora do almoço, a leitura era de que o pacote seria uma coisa boa de modo geral, mas, depois, o mercado preferiu ler que não vai ser suficiente.

Guido Mantega diz que dólar deve subir mais

Ontem, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, admitiu que o Brasil vive um problema de déficit nas transações correntes (registro das transações de bens e serviços com outros países, como balança comercial, gasto de brasileiros em viagens ao exterior e o de estrangeiros no Brasil e lucros remetidos por empresas a suas matrizes no exterior). Segundo ele, entretanto, o problema será resolvido naturalmente com a valorização do dólar em relação ao real:

- O dólar flutua e agora está flutuando para cima. Já esteve a R$1,56 e hoje está a R$1,73. Acho que ele vai continuar nessa trajetória.

Mantega disse que a valorização do dólar deverá dar mais dinamismo aos exportadores brasileiros, que passarão a ser mais competitivos no mercado externo. Isso, observou, contribui para o equilíbrio nas transações correntes.

(*) Com agências internacionais e Henrique Gomes Batista

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