Título: Rio tem que ser bibertado das milícias e do tráfico
Autor:
Fonte: O Globo, 11/09/2008, O País, p. 11

Uma das razões pelas quais sou candidato é que me considero em condições de achar uma saída para esse bloqueio¿

O senhor acha que o Rio tem jeito ou já passamos dos limites? É possível mudar a cidade em apenas quatro anos?

GABEIRA: Tenho que ser honesto. Não tem jeito a partir de uma pessoa só. Tem que ter o envolvimento da cidade, e não tem jeito em quatro anos. É preciso um processo mais longo. Cito como um dos elementos que caracterizam a decadência do Rio o fato de haver quase 200 comunidades ocupadas militarmente por forças que não são do governo. Não conheço outra grande cidade no mundo que tenha esse problema. Uma das saídas para o Rio é o que eu chamo de libertação da cidade das milícias e do tráfico. Isso ameaça muito o futuro da cidade, porque uma grande parte da população não tem os direitos assegurados. Dependem de chefetes, sejam da milícia, sejam do tráfico. A prefeitura não tem condições de dar uma resposta isoladamente, mas, se os governos estadual e federal e a prefeitura se unirem, podemos estabelecer um projeto de libertação.

A libertação do Rio passaria pelo uso do Exército?

GABEIRA: Não necessariamente. Passaria pela tática de entrar, permanecer e prestar serviço. Pode ter a prefeitura, a polícia e a Força Nacional combinadas, e outras que serão agregadas para participar. A perspectiva não é uma ocupação militar, mas um grande movimento político. Quando se entra num local desses e uma bala perdida mata alguém, a operação fracassou. A população é refém desses grupos. Libertar uma área e matar um refém, na verdade, é um fracasso.

O senhor teme, se eleito, negociar na Câmara com representantes da milícia e do tráfico?

GABEIRA: Uma das razões pelas quais sou candidato é que me considero em condições de achar uma saída para esse bloqueio. De modo geral, detestamos os políticos, não queremos ouvir falar deles, e não queremos nem relação com esse tipo de gente. Não vai haver uma reforma política a partir de Brasília, porque os personagens interessados em manter o status quo teriam que votá-la. Então é necessário começar da metrópole de alguma maneira. Em primeiro lugar, é preciso um orçamento que seja voltado para as necessidades e para os problemas dos bairros de forma equilibrada. Tem de haver uma atenção aos vereadores que, de modo geral, não existe hoje. O Cesar Maia não os recebe. Em quase todos os lugares onde o prefeito dá certo, ele recebe os vereadores num dia determinado.

O senhor era a favor da descriminalização da maconha. Houve alteração da sua posição?

GABEIRA: A minha posição tem um ano e meio e foi expressa num artigo na ¿Folha de S.Paulo¿. O governador Sérgio Cabral tinha feito a defesa da legalização, e eu disse que aquele momento, para o governador, não era de falar em legalização, mas em reformar a polícia para viabilizar qualquer política. Se você não tem uma boa polícia, não pode reprimir, porque ela vai se associar. E se você não tem uma boa polícia, você não pode permitir, porque não vai ter condições de tratar os efeitos colaterais. Essa posição eu expressei há um ano, foi tema de debate nos blogs de São Paulo, mas passou despercebida no Rio. Então agora, quando a apresentei de novo, ela foi interpretada como oportunismo de um candidato. Mas, no momento em que a expressei, eu não era candidato.

Aquilo é uma coisa, mas parece que o senhor disse agora que havia se arrependido de ter defendido a legalização no passado...

GABEIRA: Não, os jornais daqui não mencionaram o meu debate em São Paulo. Os jornais daqui acharam um historiador para dizer que todos os políticos se pasteurizam diante das eleições, porque interessa mostrar que todos os políticos são a mesma coisa, que, diante dos eleitores, abrem mão de seus princípios. Minha posição foi pensada, uma posição de consciência.

Será que o seu eleitor tradicional não está imaginando que existe uma crise de identidade?

GABEIRA: Não sei. Já estou no mundo institucional desde 1994. Não é a questão de institucionalizar. A questão principal é que se vai mudando de posições, adquirindo outras e, às vezes, as pessoas se apressam no julgamento. Sou admirador do GLOBO, leitor fiel, mas desde que me tornei candidato O GLOBO não foi tão simpático.

No que o senhor baseia essa informação?

GABEIRA:Na análise do trabalho que vocês fazem. Não acho razoável e nem elegante discutir aqui o trabalho que O GLOBO faz. Os outros jornais também fazem isso. Acho interessante e razoável que você seja jogado no mar. Não me sentiria bem se estivesse protegido e acolchoado pela imprensa o tempo todo. A questão central é que só posso e devo me pronunciar depois da eleição. Aí, vou lá no ¿Observatório da imprensa¿, sempre faço uma análise da cobertura. Aí sou comentarista da imprensa. A última coisa no mundo de que tenho medo é de não ser bem tratado pela imprensa. Há outros medos maiores. Acho que, quando me tornei candidato, tive de me associar a partidos. Se não, não teria o tempo de TV e nem a possibilidade de competir.

O senhor se surpreendeu com a informação de que Crivella e Jandira tiveram um encontro para discutir política de não-agressão?

GABEIRA: Política de não-agressão é razoável discutir. Considero a crise no Rio muito séria. Qualquer coisa que vá na direção do respeito mútuo, acho positivo. Uma vez que estamos em crise, quanto mais próximos estivermos, melhor. Agora, os compromissos sobre votos em segundo turno... É uma ilusão achar que, no segundo turno, você realmente comanda os eleitores. Você pode estar com alguém, mas seus eleitores estarão?

Mas este movimento é para resolver o primeiro turno...

GABEIRA: Não acredito. Todos se sentem com chance a partir de certo patamar. É muito deselegante pedir a uma pessoa que renuncie.

O seu vice é do PSDB, e o senhor afirmou que o Rio precisa de um choque de capitalismo lembrando uma frase histórica de Mario Covas. O que está acontecendo? O senhor está virando tucano?

GABEIRA: Quando falei que era preciso um choque de capitalismo, estava me referindo à introdução de algumas técnicas e táticas da iniciativa privada na gestão pública, como definição de metas verificáveis no tempo, transparência, havia vários elementos. Quando falei desse choque de capitalismo, falei no sentido de melhorar a gestão pública. Para os que têm restrições ao capitalismo, melhorar a gestão significa o mesmo que levar o lucro às empresas, mas não é isso. Quando tem uma melhoria na gestão pública, você libera excedentes para reinvestir a favor das pessoas, não para o lucro, necessariamente. Quanto ao choque de capitalismo no Rio, abstraindo os tucanos e tudo mais, me pergunto: alguém tem alguma outra idéia para o Rio crescer? Eu não tenho.