Título: Um partido de quadros
Autor: Feuerwerker, Alon
Fonte: Correio Braziliense, 26/05/2009, Política, p. 04

O futuro governo dependerá dos parlamentares do PMDB, mas se a oposição ganhar haverá necessariamente troca de guarda entre os caciques peemedebistas

O advérbio ¿visivelmente¿ é um risco no jornalismo. ¿Visivelmente emocionado¿, por exemplo, é expressão complicada de usar. Você nunca tem certeza de que o sujeito está mesmo emocionado. Ainda mais na política, onde se finge muito. Melhor portanto descrever a situação que levou a concluir pela emoção do personagem da notícia. E o receptor da informação que se vire.

Isso foi um nariz de cera, apenas para não passar vergonha com o que vou escrever aqui sobre o PMDB. Descumprindo a regra, arrisco dizer que o partido está visivelmente ansioso diante das variáveis colocadas pelo andar da carruagem. Como agir na sucessão? Apoiar o PT ou o PSDB? Ou ficar fora? E na CPI da Petrobras, alinhar-se ao governismo radical ou fazer jogo duplo e dar um gás à oposição? E nos estados, contar com o apoio do PT em 2010 ou procurar uma beirada em outros ninhos? E o terceiro mandato, vale a pena entrar na barca continuísta?

A ansiedade do PMDB tem explicação. Mesmo para um partido de profissionais, como é o caso, fica difícil administrar os sentimentos quando há tanta coisa em jogo. É como o sujeito que chegou na última pergunta do Show do Milhão. Vai mesmo arriscar tudo num só lance? E se errar? Não seria melhor ficar com o que já conseguiu e ir feliz para casa? Ainda que na política ¿ir para casa¿ com o que se tem não seja possível. Para tristeza do PMDB.

O partido está ansioso porque tudo tem dado tão certo que se melhorar piora. Nesta reta final de governo Lula, a legenda está na situação que tradicionalmente almeja: cheia de poder e sem nenhuma responsabilidade. Está solidamente instalada em importantes artérias da execução orçamentária, mas não pode ser responsabilizada por qualquer das grandes diretrizes da administração. Juros? O PMDB não tem culpa nenhuma. Percalços na política externa? Nada a ver com o PMDB. E por aí vai.

No governo Luiz Inácio Lula da Silva, o PMDB chegou ao ápice na atividade em que se especializou desde o governo Sarney: ser um partido governamental, mas só nos bônus. O que lhe garante, ao mesmo tempo, ampla liberdade de ação e também os meios materiais para reproduzir sua força nos níveis municipal e estadual. Onde aliás o PMDB constrói uma potência incontrastável, eleição após eleição.

Em teoria o PMDB não deveria estar nervoso. Afinal, reza o senso comum que qualquer governo a partir de 2011 precisará do PMDB. É verdade, mas o diagnóstico precisa ser matizado. A futura gestão dependerá sim dos parlamentares do PMDB. Entretanto, se a oposição ganhar haverá necessariamente troca de guarda. Do mesmo jeito que Lula fez as ¿viúvas de FHC¿ comerem o pão que o diabo amassou entre 2003 e 2006, é improvável que um eventual governo tucano prestigie os comandantes da tropa de choque de Lula. Ou pelo menos quem ficar até o fim nela. E certamente haverá candidatos no PMDB para ocupar o lugar dos caídos. O PMDB, como se sabe, é um partido de quadros.

Para a tropa de choque, portanto, é hora de não errar. Tem que saber o tempo certinho de pular do barco ou de decidir ficar firme nele. Por isso o PMDB comparece dia sim outro também ao noticiário exigindo definições. Nos estados, onde quer o apoio do PT aos candidatos peemedebistas. E em Brasília, onde murmura por um ¿plano B¿ do campo de Lula, quando não dá curso às conversas sobre mais um mandato consecutivo para o próprio. Haja ansiedade.