Título: EUA retaliam Chávez
Autor: Figueiredo, Janaína
Fonte: O Globo, 13/09/2008, O Mundo, p. 39

Washington expulsa embaixador e impõe sanções a assessores de presidente por ligações com Farc

CARACAS e WASHINGTON

Os Estados Unidos expulsaram ontem o embaixador da Venezuela em Washington, em retaliação à decisão do presidente Hugo Chávez de mandar embora o principal representante diplomático americano em Caracas. Ao mesmo tempo, a Casa Branca impôs sanções a três autoridades venezuelanas - dois chefes de agências de espionagem e um ex-ministro -, acusando-os de terem laços com organizações terroristas e com o tráfico de drogas.

Somadas à ameaça de corte de exportação de petróleo venezuelano para os EUA, à diminuição do número de vôos entre os países e a uma possível aliança com a Rússia, a expulsão de embaixadores faz com que a relação entre os países atinja o pior momento da história, culminando um processo que vem se deteriorando desde que Chávez chegou ao poder. Tudo ocorre na semana em que um julgamento nos EUA indica a participação pessoal de Chávez num escândalo de financiamento da campanha da presidente argentina, Cristina Kirchner.

O Departamento de Estado americano declarou ontem o embaixador venezuelano em Washington, Bernardo Álvarez, persona non grata, o que significa sua expulsão do país. Foi uma resposta ao anúncio feito por Chávez no dia anterior de que o embaixador dos EUA em Caracas, Patrick Duddy, estava expulso. Segundo Chávez, a medida era uma retaliação por uma suposta participação dos EUA numa conspiração para derrubar o presidente boliviano, Evo Morales - que expulsou o embaixador dos EUA.

Os EUA creditaram as ações de Chávez e Morales "à fraqueza e ao desespero" dos dois presidentes.

- Isso reflete a fraqueza e o desespero desses líderes ao enfrentarem sérios desafios internos - disse o porta-voz do Departamento de Estado dos EUA, Sean McCormack. - São falsas as acusações contra nossos embaixadores pelos líderes da Bolívia e da Venezuela, e esses líderes sabem disso.

US$250 milhões para a guerrilha

Mas se a expulsão do embaixador venezuelano era esperada, uma segunda reação pegou muitos de surpresa. O Departamento do Tesouro dos EUA acusou alguns dos principais assessores de Chávez de envolvimento com terroristas e traficantes de drogas. Os acusados foram Hugo Carvajal Barrios, chefe da Diretoria Geral da Inteligência Militar (DGIM), Henry Rangel Silva, chefe do Serviço de Inteligência e Prevenção (Disip) e Ramón Rodríguez Chacín, que até o início desta semana era ministro do Interior. Todos são acusados de ter negócios com as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc).

- Os dados mostram que duas autoridades do governo venezuelano e um ex-ministro armaram, estimularam e financiaram as Farc, enquanto elas aterrorizavam e seqüestravam inocentes - disse Adam Szubin, diretor do Escritório de Controle de Bens no Exterior do Tesouro dos EUA (Ofac).

Todos os bens dos três acusados nos EUA serão retidos, e empresas americanas são proibidas de ter qualquer relação com eles. Autoridades da Ofac anunciaram ontem em Bogotá que empresários colombianos que tiveram contato com os acusados também enfrentarão problemas.

Os EUA acusam Carvajal de dar proteção a carregamentos de droga da Colômbia através da Venezuela, fornecendo armas e documentos venezuelanos para os traficantes. Rangel, por sua vez, teria auxiliado no narcotráfico das Farc e buscado convencer o governo Venezuela a "colaborar ainda mais" com os guerrilheiros.

Já Rodríguez Chacín, que se tornou conhecido por abraçar membros das Farc durante as libertações de reféns da guerrilha, é acusado de ser o "principal contato para a venda de armas para as Farc" no governo Chávez. Ele teria tido várias reuniões com a guerrilha. Teria também tentado "facilitar um empréstimo de US$250 milhões da Venezuela para as Farc em 2007", segundo os EUA. Inesperadamente, Chacín pediu demissão esta semana, alegando motivos pessoais.

Na Venezuela, a oposição, que comemora pesquisas que indicam que Chávez poderá perder as eleições em vários estados nas eleições regionais de novembro, acusa o presidente de estar inventando crises externas para desviar a atenção de escândalos como o da Mala.

Segundo os promotores, o destino dos US$790 mil que estavam na mala do empresário venezuelano Guido Antonini Wilson seria a campanha da presidente argentina, Cristina Kirchner. A mala foi retida por policiais argentinos às vésperas da chegada de Chávez a Buenos Aires, em agosto de 2007.

Antonini chegou ao aeroporto de Buenos Aires num avião fretado pelo Estado argentino, no qual também viajaram funcionários dos governos Kirchner e Chávez. Segundo informações divulgadas no julgamento de Miami, quem entregou a mala ao venezuelano foi Claudio Uberti, o único funcionário do governo argentino afastado.

A Justiça americana está julgando venezuelanos acusados de tentar encobrir a participação da Venezuela no escândalo. Um dos acusados é o empresário Franklin Durán, empresário vinculado a Chávez. Nos últimos anos, o presidente venezuelano foi acusado de financiar candidatos de Bolívia, Equador, Nicarágua, Paraguai e Peru.

COLABOROU: Janaína Figueiredo

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