Título: Cultura em ritmo de campanha
Autor: Vasconcellos, Fábio; Conde, Miguel
Fonte: O Globo, 14/09/2008, O País, p. 16

O que os candidatos a prefeito do Rio andam lendo, ouvindo e vendo na reta final do primeiro turno.

Eles invadiram o horário nobre da televisão para apresentar propostas, criticar adversários e mostrar ao eleitorado quem são. Mas, para além de maquiagem, do cabelo bem aparado e do figurino segundo os manuais de marqueteiros, os candidatos a prefeito do Rio têm gostos e preferências culturais que ajudam a definir ou compreender melhor suas personalidades. Do último livro de cabeceira ao CD mais ouvido nesses dias de campanha, passando pelo cinema, oito candidatos revelam idiossincrasias e preferências.

Solange Amaral (DEM), por exemplo, é fã da emotiva Elis Regina e anda às voltas com a história de Dom Pedro II. O gosto por personagens históricos pode ser mais uma herança do seu guru político, Cesar Maia. Mas Solange dá indicações de ser mais descolada. Na última vez que esteve numa sala escura foi para ver Batman, no melhor estilo ¿cinema-pipoca¿.

Baterista-nas-horas-vagas, Jandira Feghali (PCdoB) conjuga o drama da vida de Edit Piaf, recentemente retratada no cinema, com o som-balanço de Mart¿nália. Na literatura, está com João do Rio e não abre. É a terceira vez que lê ¿A alma encantadora das ruas¿. As escolhas da ex-deputada revelam uma pessoa com disposição para juntar o tradicional e o moderno sem problema. Como cantou Piaf: ¿Nooon, je ne regrette rien!/Nãão, eu não me arrependo de nada!¿.

Sem arrependimento está também Eduardo Paes (PMDB) no seu estilo romântico-pop. ¿Estou numa fase Fábio Jr¿. A escolha não deixa de mostrar uma saudável despreocupação com patrulhas do bom gosto. E o cinema? ¿Há muito tempo não vejo um filme¿. E as leituras, deputado? ¿Estou lendo aquele livro que conta a história da Europa depois da Segunda Guerra. Como é mesmo o nome?¿ Esquecimentos à parte, as leituras indicam que ele tem pensado longe. Antes do livro sobre o pós-guerra, leu ¿Tempos muito estranhos¿, de Doris Kearns.

Entre os candidatos, há aqueles interessados na chamada ¿grande política¿. Fernando Gabeira (PV) lê ¿Esse grande cadáver de costas¿, do festejado filósofo francês Bernard-Henry Lévy. O livro trata da esquerda mundial e seus dilemas nesses tempos modernos. Estaria Gabeira em crise com esquerda? O político que vestiu tanga na Praia de Ipanema nos anos 70 agora pensa sobre o tema da transgressão. Conclui a leitura de ¿Cultura das transgressões no Brasil¿, de José Murilo de Carvalho. Para o candidato, a obra ajuda a pensar o problema da ordem urbana. Realmente ele tem insistido no tema da segurança nos seus programas na TV (e, no cinema, adorou ¿Onde os fracos não têm vez¿).

Já o candidato que muitas telespectadoras chamam de ¿aquele bonitão que aparece do lado do Lula¿, leia-se Alessandro Molon (PT), estuda ¿Direita e esquerda¿, de Norberto Bobbio, leitura inquietante nesses tempos em que novamente a esquerda carioca rachou na disputa municipal. ¿É sempre bom voltar aos clássicos¿, justifica Molon. Problemas ideológicos de lado, o petista demonstra ser um romântico. O CD de Marisa Monte que ele citou na pesquisa foi um presente de Dia dos Namorados comprado para sua mulher. Cinema? Molon jura que foi ao cinema em junho, mas não lembra o nome do filme.

Paulo Ramos (PDT) lê pela segunda vez ¿O povo brasileiro¿, de Darcy Ribeiro, respeitado antropólogo e idealizador dos Cieps.¿Nesse momento de tensão, procuro respostas em Darcy sobre a nossa miscigenação¿, filosofa Ramos.

Não chegam a ser surpresa as escolhas de Marcelo Crivella (PRB). No que ouve, lê e assiste, a religião está presente. Seu livro preferido é a Bíblia. Outra leitura diária é seu plano de governo. ¿Jumper¿, um filme sobre pessoas com poder de se teleportar, até parece dar uma variada no cardápio cultural de Crivella, mas o senador diz que não: ¿Esse tema faz parte da literatura religiosa¿.

O candidato e deputado federal Chico Alencar (PSOL) terminou de ler ¿Rio de todos os Brasis¿, de Carlos Lessa, e agora se debruça sobre ¿Trilhas para o Rio¿, de André Urani. ¿Calma, não sou tão chato assim¿, brinca, alegando estar influenciado pela campanha. Na área musical, tem ouvido o CD ¿Milton Nascimento & Jobim Trio¿. O cantor mineiro, padrinho de um dos filhos de Alencar, mal sabe, mas no fundo disputa atenção com o jingle do compadre carioca.

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