Título: Crise americana já se alastra para outros setores
Autor: Alves, Cristina
Fonte: O Globo, 14/09/2008, Economia, p. 34

Fundos agressivos perdem investimentos. Indústria automobilística pede US$50 bilhões.

NOVA YORK. A crise da economia americana vai durar pelo menos até o segundo semestre de 2009 e atingir mais setores. A avaliação é de John Lonsky, um dos principais analistas de mercado da agência de avaliação de risco Moody's. Para ele, o ajuste no setor financeiro vai continuar e será doloroso: falências bancárias, demissões em massa, preços de energia e combustíveis em alta, pacotes de ajuda a outros setores já atingidos pela crise, como a indústria automobilística.

¿ A economia americana já está em recessão. A alta taxa de desemprego, que chegou a 6,1%, o déficit comercial de 5,7% e o déficit orçamentário recorde de US$483,4 bilhões não deixam dúvidas de que a economia está em recessão e que a recuperação será lenta. Até o fim do ano, vamos ter falências de bancos, contenção de crédito, redução do consumo. As vendas no atacado e no varejo vão diminuir. A indústria automobilística fará demissões em massa. E, até dezembro, o Federal Reserve (Fed, o banco central americano) deve anunciar mais um corte da taxa de juros ¿ acredita Lonsky.

Na opinião do analista, o Fed ajudará apenas os bancos cujos balanços têm potencial de contágio de outras grandes instituições, agravando a crise:

¿ O Federal Reserve e o Tesouro americano têm um critério bastante claro: a intervenção não é feita para salvar acionistas, mas para evitar o agravamento da crise. A idéia é prevenir maiores danos à economia.

Ford: pacote para ajudar os `colarinhos azuis¿

A crise financeira no Lehman Brothers, quarto maior banco de investimentos americano, multiplicou as especulações em Wall Street sobre outras instituições em risco e outros setores atingidos. No acumulado de 2008, também a indústria de hedge funds (fundos de investimentos de risco) começa a apresentar balanços negativos. Segundo o Hedge Fund Research, a média de perdas em 2008 está em 4%, ainda que alguns raros tenham conseguido lucro. Para Adam Zoia, executivo da Glocap Investments, 2008 será o pior ano dos hedge funds:

¿ Este ano tem sido um banho de sangue para os hedge funds. A queda é dramática, e as perdas são profundas. É o pior ano desde 2001.

O Hedge Fund Research também registrou queda de mais de 70% dos investimentos em hedge funds em 2008, sobre o mesmo período em 2007. E há uma lista de cem fundos com previsão de perdas entre 50% e 80% até o fim do ano.

¿ Estamos caindo na realidade e descobrindo que a maioria dos administradores de hedge funds não pode fazer milagre ¿ avalia Robert Discolo, estrategista da A.I.G. Investments.

Além do setor financeiro, a indústria automotiva já se movimenta para pedir um pacote de ajuda ao governo. John Bozella, porta-voz da Chrysler, diz que o setor precisa de pelo menos US$50 bilhões em empréstimos com juros subsidiados para se recompor da queda vertiginosa das vendas de automóveis. A Ford já anunciou o corte de mais 4.200 postos de trabalho em suas fábricas.

¿ Este não é um pacote para ajudar Wall Street, e sim para ajudar Main Street. Ou seja, não é para ajudar os colarinhos brancos, mas os colarinhos azuis, o pessoal que trabalha de macacão. A indústria automotiva está no centro da economia americana ¿ declarou Mark Fields, presidente da divisão da Ford Motor para as Américas.

`Commodities¿ não subirão agora, diz analista

Pesquisa da Business Roundtable, associação dos principais executivos das 160 maiores corporações americanas, revelou que 32% prevêem demissões nos próximos meses. Outro temor é de queda do consumo no último trimestre de 2008.

¿ Este é um dado importante para investidores brasileiros: o processo de ajuste da economia americana será longo. Assim como o fluxo de investimentos externos no Brasil tende a diminuir, o preço das commodities vai se recuperar, mas não de imediato ¿ alerta Lonsky, acrescentando que a expectativa em Wall Street é que o mercado imobiliário americano dê os primeiros sinais de recuperação apenas em janeiro.

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