Título: Morales denuncia golpe à Unasul
Autor: Gois, Chico de
Fonte: O Globo, 16/09/2008, O Mundo, p. 28

Morales denuncia golpe à Unasul

Bachelet propõe comissão internacional para negociar crise entre governo e oposição

Chico de Gois

Reunidos num encontro extraordinário da União das Nações Sul-americanas (Unasul) em Santiago, para tratar da crise na Bolívia, nove presidentes reafirmaram ontem seu apoio ao presidente boliviano Evo Morales e reconheceram a integridade do território do país. Foi um recado à oposição de que os países na região não irão apoiar a separação de partes da Bolívia, como querem alguns departamentos mais ricos. O ministro das Relações Exteriores do Chile, Alejandro Foxley, afirmou que a presidente temporária da Unasul, Michelle Bachelet, se propôs a ir a La Paz, com uma comissão que inclui o secretário-geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), José Miguel Insulza, para tentar mediar o conflito. A idéia é ter uma mesa permanente de diálogo entre governo e grupos de oposição. O presidente boliviano, por sua vez, agradeceu a realização da reunião de cúpula e denunciou que seu governo é alvo de um ¿golpe civil¿.

¿ O que está acontecendo na Bolívia hoje é uma tentativa de golpe civil orquestrada por alguns departamentos. A iniciativa dessa reunião ocorre para o bem da democracia não só na Bolívia, mas na América do Sul, na América Latina e no mundo ¿ disse Morales.

Bachelet convocou a reunião extraordinária no sábado, um dia depois de o presidente venezuelano Hugo Chávez ter se adiantado a ela. A intenção da presidente chilena era tentar uma solução negociada para a Bolívia. Chávez, nos últimos dias, vinha dando declarações com potencial explosivo, desestimulando qualquer diálogo entre as partes, e chegou ao Chile falando grosso.

¿ Na Bolívia está em marcha uma conspiração internacional. Uma conspiração dirigida pelo império americano. Tal qual ocorreu aqui no Chile. Se algum povo tem no fundo de sua memória histórica, no fundo de sua consciência, o que é uma operação imperialista para derrocar um governo democrático, para desestabilizar um país, é o povo chileno e também o povo venezuelano ¿ declarou, fazendo referência ao golpe que tirou Salvador Allende do poder em 1973.

Governo e oposição sinalizam acordo

Já o presidente Luiz Inácio Lula da Silva tem defendido que os 12 países da Unasul não podem se intrometer em questões internas da Bolívia, a menos que haja um pedido expresso de Evo Morales. O presidente brasileiro não estava disposto a participar da reunião, e chegou a dizer que ela poderia não dar em nada. Mas, resolveu aceitar o convite para ser um contraponto a Chávez.

Na semana passada, Chávez afirmou que estava disposto a enviar tropas venezuelanas para ajudar a Morales, mas as Forças Armadas bolivianas rechaçaram a idéia. O presidente venezuelano, para demonstrar seu apoio a Morales, expulsou o embaixador americano, como havia feito, um dia antes, seu colega da Bolívia. Dos 12 presidentes que integram a Unasul, três não compareceram: os de Peru, Suriname e Guiana.

Manifestantes favoráveis a Morales se posicionaram em frente ao Palácio La Moneda, em Santiago. Gritando ¿Evo no se vá¿, e com faixas nas quais se liam ¿fora da Bolívia ianques¿ e ¿avante, Evo¿, aplaudiram o presidente do Equador, Rafael Correa, o próprio Morales, Chávez e Lula.

Em La Paz, governo e oposição anunciaram que estavam próximos de um acordo para acabar com a violência. O anúncio foi feito após um encontro entre Morales, antes de embarcar para o Chile, e o governador de Tarija, Mario Cossío.

¿ Ficamos de conversar novamente quando o presidente voltar do Chile. Mas estamos avançando ¿ disse o governador.

A oposição, em sinal de boa vontade para as negociações, levantou quase todos seus bloqueios de fronteiras em estradas em Santa Cruz, Beni e Tarija. O número de incidentes também diminuiu. As afirmações de Morales sobre a tentativa de golpe civil, no entanto, foram respondidas pelo presidente do Senado, o opositor Oscar Ortiz. ¿O risco não está na tentativa de golpe, mas sim num autogolpe promovido por Morales¿, disse ele numa carta enviada à Unasul.

Na capital boliviana, simpatizantes do governo fizeram uma marcha que chegou perto da embaixada americana. O objetivo era fazer um ato de repúdio ao embaixador Philip Golberg, que já deixou a Bolívia. Os EUA autorizaram uma retirada parcial dos funcionários da embaixada durante os protestos.

No Rio, o ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, garantiu ontem, durante a Rio Oil & Gas, que o fornecimento de gás natural da Bolívia ao Brasil está totalmente normalizado. Segundo Lobão, o Brasil está recebendo cerca de 30 milhões de metros cúbicos por dia de gás natural.

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