Título: Lula lamenta quebra de palpiteiros dos EUA
Autor: Lima, Maria; Doca, Geralda
Fonte: O Globo, 19/09/2008, Economia, p. 30

Irônico, presidente afirma que grandes bancos estrangeiros transformaram o sistema financeiro em um cassino

Maria Lima*, Geralda Doca e Patrícia Duarte

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva afirmou ontem que não permitirá que o Brasil seja vitima da "jogatina" de grandes bancos estrangeiros que, segundo ele, transformaram o sistema financeiro em um cassino. Com ironia, Lula comentou o fato de os grandes bancos americanos que hoje estão quebrando serem os mesmos que, durante os últimos anos, foram responsáveis por indicar o nível de risco para os investidores no Brasil. Ele chamou essas instituições de "palpiteiros".

- Eu vejo, com uma certa tristeza, bancos muito importantes que passaram a vida dando palpites sobre o Brasil, que passaram a vida dizendo o que a gente deveria ou não fazer, que passaram a vida medindo o risco deste país, que passaram a vida fazendo propaganda para investidores sobre se o Brasil era ou não confiável, como se eles fossem os superinteligentes, e nós os supercoitados. É com muita tristeza que esses palpiteiros estão quebrando, estão entrando em concordata - afirmou o presidente.

Lula afirma que Brasil está sólido, apesar da crise

Lula disse ainda que esses bancos determinaram, nos últimos anos, que o capital não pudesse circular livremente pelo mundo, gerando empregos e riqueza.

- As pessoas transformaram alguns setores do sistema financeiro em cassino, perderam na roleta, e nós não queremos permitir que o Brasil seja vítima da jogatina de algumas pessoas que davam palpite sobre tudo no Brasil e, de repente, quebraram. Isso significa que eles não tinham a certeza absoluta que eles pensavam que tinham, e mandavam a gente agir de uma forma que eles não agiram. Eu lamento que esses bancos tenham quebrado, mas posso dizer para vocês que o país está sólido - disse Lula.

O presidente acrescentou que uma das vantagens do Brasil é que a economia está lastreada por parcerias comerciais diversificadas e que apenas 15% são vinculadas aos Estados Unidos. E prometeu viajar o mundo vendendo o que puder para evitar um impacto maior da crise americana por aqui.

- Acabou-se o tempo de as pessoas ficarem esperando que os compradores venham aqui. Nós temos que colocar nossos produtos em cima da cabeça e ir atrás de novos mercados. Eu tenho o maior orgulho de ser o garoto-propaganda dos produtos brasileiros, quaisquer que sejam eles. Eu estou à disposição deles para viajar o continente africano vendendo máquinas, tratores, biodiesel, o que tiver para vender. Eu não terei nenhum problema em ser o mascate do Brasil, para colocar os seus produtos no mundo, para enfrentar a crise financeira americana - disse Lula.

A ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, também concorda que a crise americana é forte e terá um impacto global. Mas considera que a situação do Brasil lhe permitirá enfrentá-la sem maiores sobressaltos. Dilma disse que, no passado, em outras crises como a da Rússia, a economia brasileira entrou em estresse absoluto e as reservas brasileiras caíram para patamares de apenas US$14 bilhões.

- Não é possível dizer que a situação é um passeio, mas também não é nenhuma catástrofe como acontecia no passado - disse a ministra.

Já o ministro do Desenvolvimento, Miguel Jorge, reconheceu que o agravamento da crise americana poderá afetar as exportações brasileiras em 2009. Em sua avaliação, o principal fator está na queda dos preços das commodities minerais, como gasolina, ferro-ligas, petróleo, entre outras.

- Uma eventual recessão americana pode ter efeitos secundários que, no fim, podem atingir as exportações - afirmou Miguel Jorge, para quem não deve haver impactos significativos no comércio exterior brasileiro neste ano.

BB: linhas de crédito estrangeiras mais escassas

O ministro fez a declaração após participar do anúncio do chamado drawback verde-amarelo, que permitirá a suspensão de tributos como Imposto sobre Produto Industrializado (IPI), PIS e Cofins na compra de insumos para fabricação de produtos destinados à exportação. A medida entra em vigor a partir de 1º de outubro e faz parte da nova política industrial.

A estimativa do governo é que o número de empresas a serem beneficiadas pelo regime suba de 2.283 para cinco mil nos próximos meses. Segundo a secretária da Receita Federal, Lina Maria Vieira, não há impacto na arrecadação.

Maior financiador do comércio exterior brasileiro, o Banco do Brasil já começou a sentir o impacto da crise financeira mundial, mas acredita que ainda vai cumprir a meta de girar neste ano US$14 bilhões em contratos. O diretor de comércio exterior do BB, Nilo José Panazzolo, explicou que houve redução nos prazos dos financiamentos, de 360 dias para 180 dias, e nos recursos disponíveis para empréstimos. Ele reconheceu que o acesso a linhas internacionais está escasso e que o banco enfrenta mais dificuldades para contratar.

BANCOS REDUZEM PRAZO E SOBEM JUROS PARA CRÉDITO, na página 31

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