Título: Menos jovens na escola
Autor: Weber, Demétrio; Lins, Letícia
Fonte: O Globo, 19/09/2008, Economia, p. 33

Na faixa etária entre 18 e 24 anos, caiu 4,5% a taxa de escolarização

Demétrio Weber e Letícia Lins*

BRASÍLIA e GAMELEIRA (PE). Após praticamente universalizar o acesso ao ensino fundamental, o Brasil tropeça na escolarização da sua juventude. A mais recente Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad 2007) do IBGE revela que o número total de estudantes brasileiros - da pré-escola ao ensino superior - caiu 0,5% no ano passado, em relação a 2006. A queda foi puxada justamente pelos jovens: -1,6%, na faixa de 15 a 17 anos e -4,5% na de 18 a 24. Em sentido oposto, cresceu de 67,6% para 70,1% a parcela de crianças de 4 e 5 anos que freqüentavam a escola, enquanto permaneceu em 97,6% o atendimento à população de 7 a 14 anos. Esse índice atingia 99% em Santa Catarina e 91,3% no Acre, o mais baixo. No Rio, era de 98,1%.

O Brasil tinha 56,3 milhões de estudantes com idade a partir de 4 anos em 2007, estimou a Pnad. Portanto, cerca de 200 mil a menos do que no ano anterior, quando havia 56,5 milhões. O Centro-Oeste foi a região com retração mais acentuada: de 2,2%.

O especialista em avaliação educacional Ruben Klein diz que a redução na faixa dos 18 aos 24 anos não é necessariamente má notícia. Segundo ele, ela reflete a diminuição de estudantes atrasados no ensino médio e mesmo no fundamental. Tanto que, em termos regionais, Norte, Nordeste e Centro-Oeste apresentavam taxas de escolarização (32%) maiores nessa faixa etária do que o Sul e o Sudeste (29%).

O motivo é que haveria menos atraso escolar no Sul e no Sudeste. Klein diz que o Rio, com 36,9% de jovens de 18 a 24 anos na escola, seria uma exceção, devido à soma de atraso no ensino básico e alto número de universitários.

Consultor da Fundação Cesgranrio e ex-consultor do MEC, ele observa que o grande nó está na faixa dos 15 aos 17 anos, cujo acesso à escola estagnou nesta década, após crescer nos anos 1990. De 2006 para 2007, a proporção de estudantes nesse grupo oscilou negativamente, de 82,2% para 82,1%.

- É grave. A população de estudantes de 15 a 17 anos deveria estar aumentando. São quase 18% fora da escola. É um grupo não atingido pelo sistema educacional: provavelmente repete de ano e acaba expulso da escola, aumentando a evasão.

Em Gameleira (PE), o ex-cortador de cana Manoel José da Silva, desempregado desde 2006, tem sete filhos com idades de 8 a 17 anos. Três deles, com idades entre 14 e 17 anos, estão fora da escola.

- Os meninos não quiseram mais ir à escola - diz Silva.

O ensino médio voltou a encolher (0,6%) no ano passado, após perder 0,9% dos alunos em 2006. No sentido inverso, o ensino superior cresceu 4,3%, embora num ritmo bem menor do que em 2006, quando já havia aumentado 13,2%, na comparação com 2005. Klein enfatiza que o problema da estagnação do nível médio tem origem no ensino fundamental. O raciocínio é simples: o aumento da repetência e da evasão nas séries do fundamental fechou parcialmente a torneira de concluintes. Com isso, diminuiu a leva de alunos que ingressavam no médio.

O ministro da Educação, Fernando Haddad, já admitiu que o ensino médio está em crise. Ontem, porém, não fez referência ao problema. Anunciou que uma das idéias em estudo para uso do dinheiro do petróleo do pré-sal é tornar obrigatório o ensino dos 4 aos 17 anos, o que demandaria a matrícula de mais 4,5 milhões de alunos. Hoje, a Constituição só exige freqüência escolar dos 7 aos 14 anos - até 2010, ela valerá também para as crianças de 6 anos.

Haddad afirmou que a queda populacional explica a redução na escolarização. Mas a Pnad não mostra isso. Na educação infantil, houve um acréscimo de 2,1% no número de alunos de 4 e 5 anos, ainda que a população tenha diminuído 1,6% nessa faixa etária.

- O que está crescendo é a população de alunos de 4 a 5 anos na educação infantil. Aí, sim, há um atendimento efetivo da rede pública - diz a técnica do IBGE Adriana Beringuy.

Haddad foi surpreendido ontem por críticas ao ensino público, num evento em que anunciou medidas para incentivar a inclusão de portadores de necessidades especiais. Elas partiram de Antonio David de Almeida, de 19 anos, que sofre de paralisia cerebral e estuda numa escola estadual em Fortaleza:

- A gente fala de inclusão como se a educação para as outras crianças estivesse às mil maravilhas. A gente sabe que não está (...). Na minha escola, quase toda semana saio cedo porque a professora adoeceu. Duvido que isso aconteça em escolar particular. No mínimo tem uma substituta.

(*) Enviada especial