Título: Um Brasil que se vê mais negro e mais pardo
Autor: Ribeiro, Fabiana
Fonte: O Globo, 19/09/2008, Economia, p. 35

Pela primeira vez, população de brancos não é mais a maioria no país, que adota sistema de auto-declaração

Fabiana Ribeiro

Um Brasil com mais negros. Segundo a Pnad, os brancos não são, pela primeira vez, a maioria no país. Juntos os cidadãos negros, pardos, amarelos e indígenas somaram 96,019 milhões de brasileiros em 2007 - 50,6% da população naquele ano, com avanço de 0,5 ponto percentual entre aqueles que se declaram pretos em relação a 2006. Já os brancos eram 93,762 milhões - ou 49,4% do total, com redução de 0,3 ponto percentual. Para especialistas, os movimentos sociais aliados a efeito demográfico explicam a mudança de percepção sobre a diversidade racial dos brasileiros.

- O Brasil, finalmente, reconhece sua origem na senzala e não apenas na Europa. Fica consagrado o que já se sabe: o país é marcado por uma pluralidade racial - afirmou Marcelo Paixão, coordenador do Laboratório de Análises Econômicas, Históricas, Sociais e Estatísticas das Relações Raciais da UFRJ, ressaltando que, desde 1995, há um aumento nos que se auto-declaram pretos e pardos, que são, respectivamente, 7,4% e 42,3% da população brasileira.

Mudança de percepção põe em debate questões raciais

À exceção do Norte, onde houve queda de 0,7 ponto percentual na população preta, todas as regiões do país aumentaram a participação dos pretos na sociedade, ao mesmo tempo em que se reduziu população branca. Para analistas, a percepção racial no Norte do país pode ter sido influenciada pela parcela indígena da população.

Para Mário Theodoro, diretor de Cooperação e Desenvolvimento do Ipea, há um efeito demográfico nas estatísticas da Pnad. Segundo ele, a taxa de crescimento vegetativo (diferença entre natalidade e mortalidade) dos negros é maior do que a dos brancos no Brasil:

- É uma tendência demográfica, que se fortalece com os movimentos sociais. E o importante é que coloca a questão racial em debate.

Mudança não implica queda do racismo

Apesar da nova percepção das cores do brasileiro pelos próprios brasileiros, o racismo não deve, necessariamente, dar uma trégua à população não-branca, opinam especialistas.

- O racismo não diminuiu, não. Na verdade, os novos números acirram as diferenças e mostram que o povo brasileiro é bem colorido. Para combater o racismo no Brasil, que é velado e com técnicas, digamos, bastante sofisticadas, é preciso ações diretas - considerou Theodoro, frisando que o Brasil começa a estruturar uma incipiente classe média negra.

Famílias como a de Ana Maria Borges Nogueira engrossam as estatísticas de negros no Brasil, sem negar a existência do preconceito no país.

- Eu me declaro negra: tenho orgulho da cor. Está crescendo o número de pessoas que se declaram negras, mas elas assumem a cor também pelas oportunidades, como é o caso das cotas em universidades. Antigamente, era mais difícil a pessoa se dizer negra. O preconceito predomina.