Título: Clima: os Estados Unidos se movem
Autor: Goldemberg, José
Fonte: Correio Braziliense, 27/05/2009, Opinião, p. 17

O presidente Obama parece decidido a repetir o desempenho do presidente Roosevelt, que tirou os Estados Unidos da Grande Depressão em 1932, e tem tomado iniciativas inovadoras que vão desde acabar com a tortura a prisioneiros políticos até a redução de emissões poluidoras, incluindo os gases responsáveis pelo aquecimento global e mudança do clima. O governo Bush simplesmente ignorou esse problema, tentando até negar as evidências científicas que estão se acumulando sobre a realidade dessas mudanças.

Após oito anos de inação Obama adotou novas metas de eficiência para o consumo de combustíveis. As regras anunciadas pelo presidente norte-americano determinam que, até 2016, carros e caminhões leves vendidos nos Estados Unidos terão de fazer, em média, 15,5 quilômetros por litro. Ou seja, terão de ficar cerca de um terço mais econômicos, já que, atualmente, o parâmetro no país é de 10,5 quilômetros por litro, meta fixada há quase 20 anos atrás.

O Congresso americano havia aprovado em 2007 uma Lei que determinava melhora de 40% nos padrões de consumo de combustível de carros até 2020. Obama antecipou a meta quatro anos e adotou os mesmos padrões rígidos que a Califórnia tentava adotar, mas sofria a objeção do governo Bush e das montadoras.

Com isso, o consumo de petróleo dos Estados Unidos deverá cair, reduzindo as importações, e serão emitidos menos gases de efeito estufa. Em outras palavras, o gigante do norte começa a se mexer e as perspectivas de enfrentar o aquecimento global melhoram muito.

Provavelmente, a decisão de Obama será seguida pela aprovação de um projeto de lei que tramita no Congresso americano prevendo que as emissões de carbono dos Estados Unidos deverão cair cerca de 15% abaixo do nível de 2005, que não é muito diferente da meta já adotada pelos países da União Europeia.

Ao assumir a liderança ¿ com medidas concretas ¿ da redução das emissões de carbono, os Estados Unidos abrem caminho para um acordo global que envolva também os países em desenvolvimento, como China, Índia e Brasil, cuja participação é essencial. A contribuição desses países hoje é de 50% do total das emissões globais e cresce a cada ano.

A decisão americana de melhorar o desempenho dos automóveis terá repercussões mundiais (e no Brasil) pelas seguintes razões:

1. Forçará a indústria americana a se modernizar e abandonar modelos extravagantes de automóveis enormes que arruinaram a GM e as demais montadoras, abrindo caminho para a Toyota (do Japão) e a Fiat (da (Itália), que estão conquistando o mercado americano. A modernização se refletirá nos modelos usados no Brasil, onde os carros já são menores e eficientes e o progresso será mais rápido.

2. Acelerará o desenvolvimento de automóveis elétricos, que até agora não conseguiram se firmar. São esses automóveis que poderão resolver o problema da locomoção individual, à medida que a era do petróleo chega ao fim e a Toyota, com seus motores híbridos, já deu um passo nesse sentido, mas o ideal seriam carros inteiramente elétricos, cujas baterias seriam carregadas com energia solar.

3. Mudará a percepção de que automóveis gigantes de grande potência são um símbolo de poder e riqueza pregado incessantemente pelo marketing da indústria automobilística.

O Brasil é um dos únicos países do mundo que já havia detectado os problemas que assolariam a indústria automobilística e optou pelo uso do etanol da cana-de-açúcar, que substitui com vantagem a gasolina. Com o programa do álcool, se consome hoje metade da gasolina que se consumiria se o programa não existisse. Deixaram de ser emitidos nos últimos 30 anos cerca de 600 milhões de toneladas de CO2, uma vez que o etanol da cana de açúcar é um combustível renovável que praticamente não emite CO2.

Os Estados Unidos demoraram a se mover, mas estão se movendo e se adotarem uma mistura maior de etanol na gasolina ¿ como se faz no Brasil ¿, andará ainda mais rapidamente.