Título: Educação de trânsito sem verba
Autor: Amora, Dimmi
Fonte: O Globo, 22/09/2008, Rio, p. 8

Governos não gastam na prevenção de acidentes sequer o que planejam no orçamento

Dimmi Amora

Os gastos dos governos municipal, estadual e federal com educação de trânsito são pequenos e estão muito abaixo da arrecadação com multas de trânsito. A prefeitura do Rio e o governo do estado arrecadaram mais de R$76,5 milhões com multas de trânsito até agosto deste ano. Mas os gastos do governo estadual com educação de trânsito foram de R$2,5 milhões, que não vieram das multas, e a prefeitura aplicou apenas R$105 mil.

De acordo com os dados da prefeitura obtidos pelo Fórum Popular do Orçamento, em 2007 foram arrecadados R$55,6 milhões com multas de trânsito. Mas, naquele ano, havia apenas R$500 mil no orçamento para a Companhia de Engenharia de Tráfego (CET-Rio) usar para "Implantar projetos de educação e segurança para o trânsito". Do valor orçado, apenas R$225.500 foram usados. Ou seja: a prefeitura gastou menos de metade do que previa com educação no trânsito, e o valor não chega a 0,5% do arrecadado em multas.

Este ano, a arrecadação com multas até agosto alcançou R$52,4 milhões. Mas o gasto com educação de trânsito não está muito melhor. Segundo dados oficiais, dos R$500 mil previstos para educação do trânsito em 2008, apenas R$105 mil foram gastos até o meio de setembro, ou 0,2% das multas. A assessoria de imprensa da CET-Rio foi informada da reportagem, mas não respondeu ao GLOBO.

São 37.500 mortes por ano no país

O engenheiro Fernando Diniz, pai de uma vítima do trânsito e ativista das campanhas de prevenção, diz que em todas as instâncias há poucos recursos para campanhas educativas:

- Sempre cobramos isso em encontros, seminários, mas o dinheiro não aparece. O governo estima que há 37.500 mortes no trânsito por ano, 500 mil feridos, sendo que 40 mil com lesões permanentes. O custo disso é de pelo menos R$28 bilhões. Se parte fosse usada para campanhas de prevenção, certamente teríamos menos feridos e mortos - disse Fernando.

Já o Detran, responsável no governo estadual pelas campanhas educativas, cancelou os R$2,9 milhões previstos em seu orçamento para campanhas de educação no trânsito, segundo levantamento do deputado estadual Luiz Paulo (PSDB). Este ano, o órgão arrecadou R$24 milhões até julho com multas. Segundo a assessoria de imprensa do Detran, houve campanhas publicitárias em 2007 e 2008, que custaram R$2,5 milhões cada uma. De acordo com o órgão, foram usados recursos repassados pelo Federação Nacional das Seguradoras (Fenaseg) de parte do seguro obrigatório (DPVAT), que só podem ser usados em educação no trânsito. Por isto, o órgão não usou recursos próprios para as campanhas e cancelou os recursos previstos.

O órgão alegou ainda que, como usa mão-de-obra própria em publicidade e conseguiu que artistas e músicos trabalhassem sem cachê, a campanha deste ano pode chegar a um valor de cerca de R$8 milhões. As campanhas do Detran também não usam recursos da publicidade do estado, que, este ano, já consumiu R$48 milhões, segundo Luiz Paulo.

O Código de Trânsito Brasileiro determina que o dinheiro das multas seja gasto exclusivamente com segurança, policiamento, engenharia e educação no trânsito. Mas não determina percentuais para cada setor com o que é arrecadado por União, estados e municípios. No entanto, há duas fontes exclusivas de recursos para a educação no trânsito. Pelo código, 5% de todas as multas arrecadadas no país têm que ser repassadas a ao Fundo Nacional de Segurança e Educação do Trânsito, que é administrado pelo governo federal. De acordo com Fernando Pedrosa, consultor da área de legislação no trânsito, o governo federal contigencia os recursos nesta área para fazer superávit primário.

Dados do site do orçamento da Câmara dos Deputados mostram que, em 2007, apenas 41% dos R$8,8 milhões previstos no fundo para gastos com "educação para a cidadania" foram utilizados. No total, a arrecadação do fundo prevista era de R$424 milhões, sendo que quase 75% deste valor estavam na reserva de contingência. Já este ano, o valor previsto com "educação para a cidadania" é de apenas R$3 milhões, sendo que 9% disso foram usados. Além do recurso das multas, 5% do que é arrecadado com o seguro obrigatório (DPVAT) têm que ser usados para campanhas educativas. Em 2007, a arrecadação do DPVAT foi de R$3,7 bilhões, fazendo com que R$185 milhões tivessem que ser usados no setor.