Título: O próximo herdeiro de uma crise
Autor: Pear, Robert
Fonte: O Globo, 22/09/2008, O Mundo, p. 25

Ted Widmer

Depois de uma semana nervosa em que as bases do sistema financeiro americano foram sacudidas, aqui vai uma pergunta simples: por que cargas d¿água alguém gostaria de ser presidente agora?

Até nos melhores momentos, trata-se de um cargo exaustivo. Mas os problemas de 2008 parecem excepcionalmente difíceis, e, apesar das conversas conciliadoras, o eleitorado ficará dividido não importa quem vença em novembro. Até os críticos mais ferozes de Bush teriam dificuldade de prever a tormenta de seu segundo mandato, do furacão Katrina às guerras de Iraque e Afeganistão, à crise hipotecária, à derrocada financeira e à recessão-que-não-ousa dizer-seu-nome. Alguém são gostaria de ter uma herança dessas?

Evidentemente, propor essa questão pressupõe que os candidatos ao mais alto cargo do governo são criaturas pensantes. A maioria de nós pensaria antes de gastar milhões de dólares para viajar milhares de quilômetros e comer refeições à base de frango com pessoas que desdenham das nossas roupas e nossos cortes de cabelo. Perder não tem graça, mas será que ganhar é ainda pior?

Então, o que significa herdar a Presidência num momento de crise? Historicamente, é um esforço para reverter as políticas do último ocupante do cargo. Isso vale até para épocas relativamente tranqüilas. Em 2001, por exemplo, a equipe de Bush criou um slogan com as letras ABC (¿Anything but Clinton¿, ¿Tudo menos Clinton¿).

Ironicamente, essa equipe de Bush que agora deixa seus cargos pode receber tratamento semelhante. Com 80% do eleitorado considerando o país no caminho errado, não é preciso ser um exímio estrategista para prever que uma mudança de rumos funcionaria tanto para Barack Obama como para John McCain. Como a campanha de McCain deixa claro, o sentimento anti-Bush tem grandes chances de ser o refrão dos próximos meses de 2009.

Mas até que ponto rejeitar as políticas do predecessor funciona? Eis a resposta de historiador: bastante bem. Uma conferida em outras transições presidenciais difíceis mostra que quase sempre um presidente que sucede a outro problemático teve sucesso. E geralmente conseguiu isso com um giro de 180 graus.

A História diz que o novo líder que desenhar um caminho diferente daquele de Bush encontrará uma platéia receptiva. O próximo presidente enfrentará reveses desafiadores: tentar resolver dois conflitos complexos, desmantelar a al-Qaeda, frear a marcha nuclear, conter a Rússia ressurgente, combater o aquecimento global e extrair prosperidade de uma economia surrada.

Porém, a melhor lição que a História pode ensinar é que o êxito é sempre temporário. O sucessor de Bush deve, claro, distanciar-se dele. Mas deve também resistir à tentação de deixar que o último governo dê a forma deste, mesmo que apenas pelo que não se fazer. O próximo presidente deve combinar a ¿experimentação ousada e persistente¿ de F. D. Roosevelt com a prudência de Eisenhower ao lidar com uma suja guerra asiática e o otimismo inebriante de Reagan. As nuvens carregadas de hoje podem sumir tão rapidamente quanto surgiram com a combinação certa de sorte, visão e capacidade de adaptação.

TED WIDMER foi autor dos discursos do então presidente Bill Clinton